Após os atritos ocorridos no início da instauração no domingo, devido aos protestos e aos apelos de constituintes para suspendê-la enquanto as forças especiais da polícia continuavam reprimindo manifestações nas ruas, a cerimônia continuou seu curso normal e conseguiu terminar a primeira tarefa posta sobre a mesa: eleger um presidente e vice-presidente.
A acadêmica mapuche Elisa Loncón, integrante de uma das 17 cadeiras reservadas aos povos indígenas, foi eleita presidente da Assembleia Constituinte, enquanto o advogado constitucionalista Jaime Bassa (da Frente Ampla) foi eleito vice-presidente.
Uma mesa diretora que, para alguns, passou a fazer demandas que extrapolam seus poderes, como convocar uma primeira sessão para discutir o pedido de anistia para os chamados "prisioneiros da revolta social" e defender a refundação do país. Para outros, isso tudo garante o diálogo.
"É uma dupla que dá muito peso à convenção, garante uma atitude de diálogo e uma postura muito pró-ativa", disse à AFP María Cristina Escudero, acadêmica do Instituto de Relações Públicas da Universidade do Chile.
"Ela (Loncón) é uma pessoa que vem de fora do mundo político e isso lhe dá uma certa independência e autonomia", analisou Marcelo Mella, um acadêmico da Universidade de Santiago.
Mas para Carlos Peña, reitor da Universidade Diego Portales, os pedidos que Loncón lançou no seu primeiro dia "parecem excessivos para o discurso de posse de quem foi eleito para conduzir um longo processo de deliberações com imparcialidade, cujos resultados não devem ser antecipados", segundo escreveu em coluna do jornal El Mercurio.
- Anistia -
Depois de selada a eleição da diretoria, a primeira sessão de trabalho desta segunda-feira visa analisar um pedido de anistia aos chamados "prisioneiros da revolta", em sua maioria jovens que cumprem mais de um ano em prisão preventiva no âmbito das manifestações que eclodiram a partir de 18 de outubro de 2019, em uma agitação social que foi canalizada através do processo constituinte.
A anistia, segundo Loncón, atingiria também os indígenas mapuche presos no contexto do conflito que permanece latente no sul do país pela recuperação de terras que consideram suas por direitos ancestrais, hoje em mãos privadas.
A libertação dos "presos da revolta" - dos quais não há número certo - é um tema que vários constituintes, especialmente da chamada "Lista do Povo" - composta por quem foi às ruas manifestar - colocaram na mesa por semanas.
"Para o Chile, para a democracia, os jovens devem fazer o que lhe cabe fazer; então, deve haver uma discussão entre toda a Assembleia para ver que solução podemos dar a esta situação", disse Loncón nesta segunda-feira.
Mas para a direita, minoria com 37 membros da Assembleia, "é lamentável que a primeira questão a ser discutida seja um tema que não cabe ao grupo. Não temos nenhum outro poder além de redigir uma proposta de Constituição", disse à imprensa Marcela Cubillos, ex-ministra do gabinete de Sebastián Piñera.
- Refundação -
A primeira sessão era para começar a discutir a regulamentação de funcionamento da Assembleia, que terá nove meses, prorrogáveis apenas uma vez por mais três meses, para redigir uma Carta Magna que substitua a herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).
A ideia do conselho de administração é poder aprovar rapidamente as normas provisórias que permitem o início do funcionamento e finalizar o regulamento no prazo de dois a três meses, conforme explica o vice-presidente Bassa.
As expectativas estão centradas no fato de que ao final da obra seja alcançado um texto que responda às demandas por maior igualdade social que os chilenos expressaram nas ruas.
"Temos de refundar o país, porque o país que construímos até agora não incluiu todos os cidadãos (...), se não o fundarmos agora e reconstruímos como um país onde há grande diversidade, não teremos seguramente, em curto prazo, outra oportunidade de fazê-lo ", afirmou o constituinte independente Benito Baranda à AFP.
SANTIAGO