"Garantirei a transferência de poderes ao dirigente que for nomeado pelo presidente da República", declarou Mechichi, em suas primeiras palavras após sua destituição e outras medidas excepcionais anunciadas na noite de domingo.
Depois de um domingo de manifestações em várias cidades contra a gestão da pandemia de coronavírus do governo de Mechichi, o presidente Kais Saied destituiu o primeiro-ministro e anunciou a suspensão da atividade do Parlamento por 30 dias.
Também anunciou que assumirá o poder executivo "com a ajuda do governo", atribuindo a si mesmo o poder de nomear ministros.
Nesta segunda-feira, após um dia de confrontos, a Presidência da República anunciou em nota a demissão de Ibrahim Bartaji, ministro da Defesa, e de Hasna Ben Slimane, que era porta-voz do governo, ministro da Administração Pública e ministro interino da Justiça.
O partido governante, Ennahadha - de orientação islamita e que apoiava Mechichi -, criticou duramente a medida de Saied, que denunciou como "um golpe de Estado contra a revolução e contra a Constituição".
Em contraste, a União Geral dos Trabalhadores da Tunísia (UGTT), uma central sindical influente, apoiou implicitamente as decisões.
A União indicou que elas estavam "em conformidade" com a Constituição, embora tenha pedido a continuação do processo democrático, mais de uma década depois do levante que terminou com a ditadura de Zine el Abidine Ben Ali.
"Está na hora" de os responsáveis pela "degradação" situação do país "assumirem as suas responsabilidades", afirmou o sindicato.
- Preocupação internacional -
O chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, falou por telefone nesta segunda-feira com Saied. Ele "incentivou o presidente Saied a se apegar aos princípios da democracia e dos direitos humanos, que são a base do governo na Tunísia", informou o Departamento de Estado em um comunicado.
Por sua vez, a Turquia, aliada do Ennahdha, pediu a restauração da "legitimidade democrática" e a Alemanha exigiu a "retomada da ordem constitucional o mais rápido possível".
A França pediu "um retorno, o mais rápido possível, ao funcionamento normal das instituições" e exigiu que se evite qualquer tipo de resposta violenta.
Os temores de um declínio das liberdades se acentuaram após o fechamento, na segunda-feira, pela polícia dos escritórios da rede catariana Al Jazeera na capital. Uma decisão tomada sem ordem judicial e criticada pela Anistia Internacional e os Repórteres Sem Fronteiras.
A presidência também anunciou a prorrogação do toque de recolher noturno, inicialmente estabelecido para combater a covid-19, que agora terá início a partir das 19h e se estenderá até as 6h.
Além disso, foram proibidas reuniões na rua com mais de três pessoas e os funcionários receberam dois dias de folga.
Centenas de apoiadores de Saied e do Ennahdha se atacaram mutuamente nesta segunda-feira com pedras e garrafas em frente ao Parlamento, na cidade de Tunes, observaram repórteres da AFP.
Rached Ghannouchi, chefe do Ennahdha e presidente do Parlamento, que ficou 12 horas estacionado em um carro em frente à ele, não conseguiu entrar no edifício porque os militares enviados para vigiar a câmara o impediram.
Essas medidas buscam "mudar a natureza do regime político na Tunísia e transformá-lo de um regime democrático para um regime presidencial, individual e autoritário", considerou Ghannouchi em uma declaração publicada na página oficial do Ennahdha.
- Conflito político -
Saied declarou que a Constituição não permite dissolver o Parlamento, mas que permite suspender sua atividade, segundo o artigo 80, no caso de "perigo iminente".
Esse artigo é aplicado por 30 dias, ao longo dos quais a Corte Constitucional deve decidir se prolonga ou não sua vigência. No entanto, essa instituição ainda não pôde ser lançada devido à agitada vida política da Tunísia desde a aprovação da Constituição em 2014.
Rached Ghannouchi e o presidente Saied estão imersos em um conflito político há seis meses, que paralisou o governo e prejudicou os poderes públicos, em meio à onda de casos de covid-19 que abala a Tunísia desde o início de julho.
Com quase 18.000 mortos por coronavírus, o país de 12 milhões de habitantes apresenta uma das piores taxas de mortalidade do mundo.
TUNES