Sob uma frágil cobertura de lençóis e lonas de plástico, ela mora com o marido e três filhos em total miséria no gramado de um estádio de futebol chamado Gabions, na cidade de Les Cayes.
Já traumatizada pela destruição de sua casa pelo terremoto de magnitude 7,2 que abalou este pobre país caribenho dias atrás, ela também não se sente protegida.
"Tudo pode acontecer conosco", enfatiza Guerrier, de 48 anos. "Principalmente à noite, qualquer um entra no acampamento".
Mais do que tudo, ela teme ser vítima de violência sexual, terrivelmente frequente após o terremoto de 2010 que devastou o Haiti e forçou centenas de milhares de pessoas a se refugiarem em acampamentos.
Nos 150 dias após o terremoto, pelo menos 250 mulheres foram estupradas, segundo um relatório da Anistia Internacional (AI) publicado em janeiro de 2014.
No campo Gabions, onde convivem 200 refugiados, manter a privacidade é impossível.
Vesta Guerrier nunca pode se despir completamente para tomar banho e sempre espera o sol se pôr antes de se higienizar.
Mas "pode ser que uma luz venha até mim e aí eu não sei se quem me ilumina é alguém que mora aqui conosco ou se é alguém de fora", diz ela.
Embora os quatro sanitários instalados estejam inutilizáveis por falta de manutenção, Vesta Guerrier diz que sofre "até mesmo quando sentimos vontade de urinar, porque todos nos olham de todos os lados".
"Só as meninas podem entender o que eu digo: mulheres e crianças que estão no acampamento sofrem muito", suspira.
- "Medo por nossos filhos" -
Depois de ouvir partes de sua entrevista, dois jovens que se declaram membros de um comitê organizador do acampamento declaram rapidamente que Vesta Guerrier não compreende a situação.
Mas, longe dos ouvidos desses líderes autoproclamados, outras vítimas do acampamento de Gabions também relatam seus medos.
"Temos medo, temos muito medo pelos nossos filhos. Precisamos de barracas para que possam voltar a viver connosco como uma família", diz Francise Dorismond, grávida de três meses.
A alguns metros do campo de futebol, outro acampamento foi improvisado em resposta a esses riscos de violência. O pastor Milfort Roosevelt disse que "os mais vulneráveis" foram transferidos para lá.
"Protegemos as meninas. À noite montamos um esquadrão de vigilância que circula a madrugada toda e garante que nenhum rapaz cometa atos de violência contra a mulher", explica o religioso de 31 anos.
Nas ruínas de uma antiga boate destruída pelo furacão Matthew em 2016, dezenas de pessoas tentam organizar suas rotinas entre lençóis esticados sobre cordas amarradas às paredes.
No meio desse pequeno labirinto de tecidos, uma jovem mãe tenta, com um pequeno cobertor, deixar o local o mais confortável possível para seu bebê de 22 dias.
"Na noite do terremoto eu ia dormir no campo de futebol ao lado, mas me disseram que com meu bebê não seria correto, então me receberam aqui", explica Jasmine Noel.
"Algumas pessoas sempre tentam aproveitar esses momentos para fazer uma coisa errada", lamenta a jovem mãe enquanto amamenta seu bebê recém-nascido. Desde o terremoto, ela diz que tem a impressão de não "viver de verdade".
"Nossos corpos estão aqui, sim, mas nossas almas não", desabafa Jasmine Noel enquanto aguarda o retorno de sua mãe, uma vendedora ambulante, na esperança de que tenha conseguido ganhar o suficiente para a refeição do dia.
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