Diante das longas filas nos postos de gasolina, das prateleiras vazias nos supermercados e das advertências dos comerciantes de que um fim de ano sombrio se aproxima, devido a uma grande falta de mão de obra, Johnson defendeu que tudo isso é uma dor de curto prazo, transitória e que vale a pena.
"A resposta às tensões atuais, que são basicamente uma consequência da reativação econômica, não é puxar a mesma velha alavanca da imigração descontrolada", afirmou Boris, no discurso de encerramento do congresso de seu partido reunido em Manchester, no desindustrializado nordeste da Inglaterra, que tradicionalmente vota na esquerda.
O Reino Unido deve abandonar um "antigo sistema quebrado" baseado em "baixos salários, baixo crescimento, baixa qualificação e baixa produtividade, tudo isso possível e facilitado por uma imigração descontrolada", insistiu, provocando grandes aplausos.
Em vez disso, defendeu investir para acabar com as enormes desigualdades entre a rica cidade de Londres e o restante do país, priorizando infraestruturas, moradia, educação e desenvolvimento empresarial que permitam pagar melhores salários aos trabalhadores britânicos bem treinados em todo território.
"Nossa missão como conservadores é promover as oportunidades", lançou, defendendo uma reforma que "nenhum governo teve a coragem de enfrentar" até agora.
"Sim, levará tempo e às vezes será difícil, mas essa foi a mudança pela qual as pessoas votaram em 2016", insistiu.
A data remete ao referendo que optou pelo Brexit, com 52% dos votos, e que, após anos de caos político, levou o Reino Unido a abandonar a União Europeia, definitivamente, em 1º janeiro deste ano.
- Muito humor e poucas medidas -
Embalado em seu tradicional senso de humor debochado, o discurso do primeiro-ministro apresentou mais carisma do que medidas concretas, resumindo-se a bônus de até 3.000 libras (US$ 4.000) para recrutar professores e a promessas imprecisas de gigantescos investimentos públicos.
"Foi um discurso divertido" e "precisamos de uma injeção dessa energia", disse à AFP Jacqueline Hampson, especialista em marketing de 50 anos, que assistiu ao seu primeiro congresso após se juntar ao partido no ano passado.
"Sem dúvida, temos que manter nossas finanças sob controle e conservar a confiança dos mercados financeiros", considerou Charles Boote, de 82 anos, sobre os prováveis aumentos dos impostos.
Já para os representantes dos trabalhadores próximos ao opositor Partido Trabalhista, atacado e ridicularizado por Johnson em seu discurso, sua mensagem representou apenas "as palavras de um bobo da corte político".
Lançou "slogans em detrimento de detalhes concretos, em um momento em que os custos estão aumentando, a inflação é uma verdadeira preocupação, os subsídios foram reduzidos para milhões de pessoas, há uma escassez generalizada de alimentos e combustível e uma crise climática muito real", analisou o secretário-geral do poderoso sindicato de transportes TSSA, Manuel Cortés.
- E a mudança climática? -
A poucas semanas de sediar a cúpula climática COP26 na cidade escocesa de Glasgow, Johnson abordou a mudança climática tangencialmente.
"A determinação do mundo será posta à prova. Podemos manter viva a ambição de Paris de impedir que o planeta se aqueça em mais de 1,5ºC? O governo não pode agir sozinho, e os contribuintes não podem fazer isso sozinhos", afirmou.
Ele pediu a participação do setor privado, mencionando, como exemplo, os campos de turbinas eólicas offshore na costa britânica.
Com sua desenvoltura habitual, no dia anterior o primeiro-ministro pedalou uma bicicleta elétrica, subiu em um trator elétrico e brincou com um quebra-cabeças para montar uma casa neutra em carbono nos estandes dos expositores presentes na conferência.
Em seu conjunto, porém, no congresso, ao contrário do Brexit, a mudança climática foi relegada ao segundo plano - um "sinal prejudicial", na opinião de Rebecca Newsom, responsável por Políticas no Greenpeace do Reino Unido.
Johnson inclusive atacou, nesta quarta-feira, aqueles que protestam no entorno de Londres, há semanas, contra a falta de ação do governo a favor do clima, e que recorrem à desobediência civil.
"Essas pessoas que se agarram às estradas, eu não as chamo de manifestantes legítimos, mas sim de um incômodo que bloqueia as ambulâncias e impede as pessoas de viverem seu dia a dia", criticou, elogiando que sua ministra do Interior promova "novos poderes para colocá-los na prisão, onde devem estar".
MANCHESTER