Quando Tony Kofi tinha 16 anos de idade, ele sofreu um acidente no trabalho. Enquanto caía de uma grande altura, ele teve uma visão de si próprio tocando um instrumento musical, mesmo sem nunca ter aprendido.
A experiência o colocou em um novo caminho na vida — e o levou a tornar-se um saxofonista amplamente reconhecido.
Era primavera em 1981 e Tony Kofi, com 16 anos de idade, trabalhava como aprendiz de carpinteiro, ajudando a trocar o antigo telhado de uma casa.
Ele estava tão disposto a impressionar que havia pedido ao seu supervisor para continuar trabalhando enquanto o patrão almoçava. O supervisor o aconselhou a ter cuidado.
Ele estava serrando uma tábua de madeira. "Eu não serrei corretamente e ela se partiu", relembra Tony.
"A tábua ficou presa na minha manga e me derrubou."
Tony começou a cair.
O seu primeiro pensamento foi que ele não iria conseguir sobreviver. Por isso, ele conta que ficou totalmente relaxado, deixou-se cair e fechou os olhos.
"Eu não sei se foi a adrenalina ou outra coisa — porque eu li sobre isso, quando você cai de uma grande altura, tudo fica mais lento", ele conta. "Comecei a ver flashes de imagens. Era inacreditável."
Nas suas visões, Tony viu diferentes partes do mundo e rostos de pessoas que ele não conhecia.
"Vi crianças que nunca havia visto antes — que se tornariam meus filhos, imagino. E algo que realmente ficou na minha mente foi que eu estava de pé, tocando um instrumento. Simplesmente pensei: 'esta é a sensação mais estranha que tive na vida'. Foi tudo o que vi e desmaiei em seguida."
Na década de 1960, as vozes roucas e acetinadas dos artistas de jazz vagueavam pela casa de infância de Tony, em Nottingham, na Inglaterra. A mãe de Tony, Ama, estava tocando seus discos.
Ela e seu marido Jack eram de Kumasi, no sul de Gana, e Ama havia assistido pessoalmente a uma apresentação do trompetista e cantor de jazz norte-americano Louis Armstrong durante a sua visita ao país em 1956. Aquilo fez com que ela se apaixonasse pelo jazz.
Jack havia passado algum tempo na Inglaterra com pouco mais de 20 anos de idade, em busca de uma carreira no pugilismo, e mudou-se de vez para Nottingham em 1959, para formar um lar para sua família. Quando Ama e seus dois filhos juntaram-se a ele um ano depois, ela trouxe consigo uma série de discos e a casa ficou repleta de batidas sincopadas de jazz.
Ama e Jack tiveram ao todo sete filhos, todos meninos, e Tony foi o quinto. Nascido em 1964, suas memórias de infância são, como na famosa canção de Armstrong What a Wonderful World, de "céu azul e nuvens brancas".
"Pouco me lembro do inverno quando era criança", conta ele, "porque estava me divertindo muito para pensar naqueles dias frios e escuros."
Ele descreve a sua infância como "muito tradicional", com comida e música de Gana. Os seus pais insistiam que a família falasse em casa seu dialeto ganense, o axânti: "inglês era falado na rua".
Mas, quando foi para a escola primária, Tony era meio "valentão".
Ele conta: "Nasci canhoto e, em Gana, se você tem um filho canhoto, tradicionalmente eles querem fazê-lo se tornar destro. É uma tradição antiga e os meus pais insistiram que eu virasse destro."
"E a escola foi informada [da situação]. Eles tinham que garantir que eu não escrevesse com a mão esquerda e acho que isso me tornou um pouco problemático, porque eu estava agindo contra a minha essência", relembra Tony.
Durante esses anos iniciais na escola, Tony não se interessava por nada que não fosse esporte, futebol e jogar com seus amigos. Na escola secundária, ele expressou uma paixão pela música, mas disseram a ele que não poderia estudar.
"Eles davam pequenos testes e escolhiam quem fosse mais concentrado e embasado", conta Tony, "e eu não fui um dos escolhidos."
"Fiquei arrasado com aquilo e eles me colocaram em carpintaria, até que aceitei e foi o que fiz em toda a minha escola secundária", relembra ele.
Tony estava se tornando habilidoso no seu trabalho e saiu da escola em 1980 para começar a trabalhar como aprendiz de carpinteiro, frequentando a faculdade uma vez por semana e aprendendo o trabalho nos quatro dias restantes. Foi em um desses trabalhos que ele sofreu aquela queda terrível.
Depois do acidente, Tony acordou no hospital com seus pais e dois dos seus irmãos ao lado da cama, desesperados de preocupação e perguntando como ele estava se sentindo.
"Eu respondi: 'minha cabeça dói muito' e eles disseram: 'você nos deu um susto, você esteve inconsciente por dias'", relembra ele.
Desorientado, machucado e com um forte trauma na cabeça, Tony ficou sabendo que havia batido a cabeça no solo com tanta força durante a queda que poderia ter morrido com o impacto.
Ele se lembra do supervisor do seu trabalho vindo visitá-lo no hospital: "Ele me disse: 'você caiu de cabeça no chão com força, como se fosse um saco de batatas'."
Depois que Tony melhorou o suficiente para sair do hospital, três ou quatro semanas mais tarde, ele permaneceu em casa enquanto convalescia. Tony havia recebido algum dinheiro de indenização pela queda e pela perda de receita e seu emprego permaneceu aberto para que ele retornasse assim que estivesse pronto.
Mas as imagens que Tony havia visto enquanto caía não desapareceram. Elas continuaram a "piscar" sempre que ele fechava seus olhos.
"Elas realmente me assombravam, pois era quase como se alguma coisa estivesse sendo mostrada para mim", afirma Tony.
Ele não contou para ninguém, mas a queda havia alterado seu comportamento perante a vida para sempre.
Tony, que nunca havia estudado música, começou a pensar em gastar o dinheiro da indenização comprando um instrumento.
Mas qual era o instrumento que ele havia visto nas suas visões? Ele pesquisou em livros de música e, em uma das páginas, havia a descrição de um instrumento de sopro brilhante, feito de latão, com formato cônico.
Lá estava ele: o saxofone.
"Não estou dizendo que era musicalmente ignorante naquela época, mas eu nunca havia visto um saxofone", afirma Tony. "Provavelmente eu havia ouvido no rádio, mas sem prestar nenhuma atenção."
No início de 1982, Tony pagou 50 libras pelo seu primeiro saxofone — era muito dinheiro nos anos 1980, equivalente a cerca de 200 libras (R$ 1.500) hoje em dia. Ele voltou para casa carregando seu pequeno tesouro musical.
Sua mãe lançou para ele um olhar estranho. Ela não sabia que Tony havia tido uma visão.
"Eu disse: 'É um saxofone e vou aprender a tocar'", conta Tony. "Vou sair do emprego."
Tony lembra que sua mãe colocou a mão na cabeça e pediu ao seu marido Jack que falasse com seu filho.
Ele se lembra dela dizendo para Jack: "Ele está jogando fora um emprego perfeito. Deve estar assustado com o que aconteceu na queda."
Seu pai realmente tentou falar com Tony, mas ele estava inflexível.
"Eu disse que não podia voltar atrás. Eles não compreendiam o motivo, mas eu disse a eles: 'Se eu voltar atrás, será como se tivesse morrido naquela queda'", relembra ele.
Tony conta que não tinha dinheiro para as aulas e os seus pais não podiam gastar seu "dinheiro suado" com aulas de música, mas sua mãe ofereceu algo muito mais valioso — ouro em forma de vinil.
"Ela me deu as pilhas de discos", diz Tony. "Ela disse: 'veja, estas são músicas muito boas, use esses discos e aprenda com eles'. Foi exatamente o que fiz. Eu gravei os discos em fita cassete, coloquei os fones de ouvido e passei a ouvir constantemente e tentar aprender a tocar junto com eles."
Tony começou então a aprender a tocar o saxofone, mas suas primeiras tentativas não produziram aquele som suave e abafado que tornou o instrumento famoso.
"Parecia uma criança com cinco anos de idade tentando tocar violino", relembra Tony. O som era angustiante e "doloroso para os ouvidos".
Os seus irmãos se tornaram seu "termômetro musical". A porta do seu quarto poderia se abrir de repente e um sapato disparar na direção de Tony, atingindo-o na cabeça ou nas costas.
Mas ele continuou praticando, primeiro por duas horas, depois cinco e, por fim, por oito a dez horas por dia.
À medida que o tempo passava, os sapatos passaram a voar com menos frequência e seus irmãos começaram a vir sentar-se e ouvir Tony tocar.
Tony lembra que, um dia, quando a sua mãe trazia uma bandeja de comida para o seu quarto, ela disse "estou reconhecendo o que você está tocando... adoro essa música".
Era uma faixa intitulada Take the "A" Train, de um disco do pianista e compositor de jazz Duke Ellington. A música fala de um trem de metrô de Nova York, nos Estados Unidos, acelerando pelos trilhos até o distrito de Sugar Hill, no Harlem.
Tony sentiu que sua vida também estava nos trilhos. "Foi uma ótima época para ser eu mesmo", afirma ele.
Embora Tony tocasse saxofone de ouvido, ele não sabia ler música e queria aprender mais sobre teoria musical. Entre 1986 e 1987, ele foi a uma faculdade em Nottingham, conhecida pelo seu ensino de música e artes cênicas, mas disseram a ele que não poderia estudar porque não havia realizado exames ou graduações musicais.
"Foi quase como aquela rejeição novamente", ele conta, "mas desta vez eu não iria aceitar, porque eu havia encontrado algo que realmente amava e queria fazer — aquela rejeição só me deixou mais forte."
Enquanto ele folheava uma revista norte-americana chamada Downbeat, lendo sobre a vida de músicos de jazz, ele viu alguns anúncios de faculdades de música nos Estados Unidos.
"Eu simplesmente escolhi uma e pensei: 'Quer saber? Vou escrever para eles e tentar me candidatar.' E foi exatamente o que eu fiz", conta Tony.
Ele enviou sua inscrição pelo correio para a Faculdade de Música Berklee em Boston, Massachusetts (Estados Unidos), centro de excelência musical. Os alunos de Berklee já ganharam 311 prêmios Grammy.
"Primeiro eles me ouviram e, um dia, eles me aceitaram", afirma Tony. E, em 1988, com 24 anos de idade, Tony, assustado e entusiasmado, saiu para estudar música nos Estados Unidos.
Tony recebeu uma bolsa de estudos de Berklee porque, segundo ele, era considerado "muito bom" para alguém que havia sido autodidata. A história também havia chegado aos jornais de Nottingham e Tony recebeu ajuda com esforços de captação de recursos — e dos seus pais.
"Naquela época, eles estavam muito orgulhosos e impressionados com a minha persistência e o meu progresso", conta ele.
"Quando eles descobriram que eu havia sido aceito pela Faculdade de Música Berklee, todos ficaram dizendo 'uau, isso não é brincadeira, isso é muito sério'. E então contei aos meus pais sobre as visões", relembra Tony.
Tony conta que eles aceitaram que este era o caminho certo para seu filho.
Ele teve uma época "fantástica" em Berklee. A faculdade atraía músicos de todo o mundo que queriam aprender a arte do jazz. Alguns eram autodidatas, como Tony, e outros receberam treinamento clássico.
"Eles aceitaram minha chegada como se fosse a coisa mais normal do mundo", diz ele. "Mas, na Inglaterra, o país onde nasci, parece que você precisa passar por um sistema para ser aceito."
Quando Tony voltou para a Inglaterra, ele trabalhou no seu primeiro álbum, All is Known, que ganhou o Prêmio de Jazz do Parlamento e o BBC Jazz Award em 2005.
"Eu lembro que a primeira faixa que gravamos chamava-se Boo Boo's Birthday, do [pianista e compositor de jazz norte-americano] Thelonious Monk", conta Tony, "e me lembro de ter a partitura na minha frente. Fiz uma primeira gravação, nós a ouvimos e pensei comigo: 'sabe, parece que estou lendo a cartilha."
"Eu pensei: 'OK, preciso voltar a me sentir confortável, como no princípio'. Rasguei então a partitura, joguei no cesto de lixo e toquei cinco trechos de pura magia. Foi assim que fiz todo o álbum, sem partitura, apenas tocando."
Além de ser músico, compositor e líder de banda, Tony também trabalha como professor na Academia de Jazz Julian Joseph e na Academia World Heart Beat Music. Em setembro de 2020, ele começou a lecionar no Conservatório Trinity Laban de Música e Dança e, este ano, recebeu o grau de professor honorário da Universidade de Nottingham.
Ele adora trabalhar com músicos jovens e idosos, inspirando-os a viver seus sonhos e nunca perder a esperança.
Mas, e quanto às outras imagens que ele viu enquanto caía do telhado — os diferentes locais do mundo e os rostos das crianças?
Elas também ganharam vida, segundo Tony.
"Tenho três filhos maravilhosos e sou também avô", conta ele. "Tudo aquilo aconteceu e viajei por todo o mundo. Trabalhei com alguns dos maiores músicos do planeta."
Esses músicos incluíram artistas como Macy Gray, Harry Connick Jr. e a Julian Joseph All Star Big Band.
Nas suas aulas, Tony muitas vezes incentiva seus alunos a tocar de ouvido, sem partitura. A sensação é totalmente liberadora, segundo ele.
"É como andar de bicicleta sem rodinhas", afirma Tony. "Você usa as rodinhas para manter o equilíbrio. Quando você retira as rodinhas, a criança anda de bicicleta com muita liberdade — é isso o que parece."
Tony Kofi com certeza está seguindo o conselho de Louis Armstrong: "Nunca toque uma música da mesma forma duas vezes".
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