Os parlamentares conseguiram reunir os 78 votos necessários para que a acusação que busca o impeachment do presidente do Chile avance ao Senado. Outros 67 deputados votaram contra a iniciativa e três optaram pela abstenção.
Com aprovação do julgamento, o presidente fica impedido de deixar o país, mas pode continuar exercendo suas funções até que a acusação seja enviada ao Senado, que atuará como júri para definir o futuro de Piñera, primeiro presidente submetido a este processo nos 31 anos de democracia no Chile.
Segundo analistas, a iniciativa não contaria com os 29 necessários no Senado para o impeachment, uma vez que a oposição soma apenas 24 cadeiras na câmara alta.
O governo reagiu expressando esperança de que "o Senado rejeite a acusação interposta " contra Piñera, e afirmando que a mesma é "injusta e não tem fundamento algum, nem nos fatos, nem no direito".
A acusação constitucional, como é conhecido no Chile esse recurso que visa à destituição do presidente, foi apresentada na primeira semana de outubro pelo arco oposicionista de esquerda, incluindo o deputado socialista Jaime Naranjo.
"Estamos vivendo um momento histórico e foi possível com a unidade da oposição", afirmou Naranjo, que fez um discurso de 15 horas para ler as 1.300 páginas de argumentos da acusação.
A tática de adiamento buscou dar tempo para a chegada de outro deputado, Giorgio Jackson, que estava em quarentena até a meia-noite por ter mantido contato com o candidato à presidência de esquerda Gabriel Boric, que testou positivo para covid-19.
"O que vimos foi um show", declarou Juan José Ossa, ministro secretário-geral da Presidência. "Sentimos muita tristeza por esta ferida feita ao país".
O Senado pode tratar da acusação contra Piñera entre segunda e terça-feira, indicou Ximena Rincón, presidente da casa.
- ' Um golpe que pode deixar feridas' -
Após uma exposição de cinco horas no plenário, o advogado de Piñera, Jorge Gálvez, afirmou: "Eu peço, ilustres deputados e deputadas, que rejeitem esta injusta e improcedente acusação constitucional". "Essa acusação pode ser um golpe, que pode deixar feridas para os próximos governos", alertou o advogado.
O debate começou às 10H25 de ontem, com o deputado socialista Jaime Naranjo pedindo que "termine a impunidade" dos que detêm o poder no Chile, abalado pela crise social de 2019.
Ao destacar uma suposta negociação incompatível no caso da mineradora Dominga, Naranjo declarou: "Atuando como presidente se beneficiou (a ele) e sua família de forma direta, com as informações que tinha no exercício de seu cargo".
"E continuou negociando e fez subir o preço da Dominga", acrescentou sobre a operação, que aconteceu em 2010, quando Piñera estava em seu primeiro mandato como presidente.
- Dominga sem proteção ambiental -
A investigação dos veículos de comunicação locais CIPER e LaBot, incluídos nos Pandora Papers, revelou que os filhos do presidente venderam a Dominga em 2010 ao empresário Carlos Alberto Delano - amigo íntimo de Piñera - por 152 milhões de dólares. A transação, que aconteceu em grande parte nas Ilhas Virgens, foi concretizada durante o primeiro governo de Piñera (2010-2014).
A operação deveria ser realizada em três parcelas e continha uma cláusula polêmica que condicionava o último pagamento ao "não estabelecimento de uma área de proteção ambiental sobre a zona de operações da mineradora, como desejavam grupos ambientalistas".
Gálvez negou que Piñera "tenha intercedido na decisão de venda do projeto" e também descartou que tenha favorecido a Dominga ao não concretizar nenhuma ação de proteção ambiental.
Piñera, um rico empresário de 71 anos, que foi o primeiro presidente de direita (2010-2014) após 20 anos de governos de esquerda desde o retorno à democracia, enfrenta a acusação com uma rejeição a sua gestão de 79% dos chilenos, segundo as pesquisas mais recentes.
SANTIAGO