Jornal Estado de Minas

PARIS

Há dois anos, campanhas de desinformação atacam vacinas anticovid-19

As campanhas de vacinação em massa contra a covid-19 alimentam um fluxo incessante de desinformação na Internet e nas redes sociais, boatos que exageram, ou inventam, efeitos colaterais dos imunizantes até transformarem o remédio em algo pior que a doença.



- Distorção dos dados sobre efeitos colaterais -

Desde o início das campanhas de vacinação, a farmacovigilância (ramo científico encarregado de detectar os efeitos colaterais dos medicamentos) tem servido de ferramenta para alarmar a opinião pública.

Na maioria dos países, quando uma pessoa ou profissionais de saúde detectam efeitos desconhecidos após uma vacinação, podem informá-los às autoridades, e estes registros costumam ser públicos.

Corresponde às autoridades sanitárias determinar se são efeitos colaterais.

Nestes registros, também são incluídos os óbitos. Uma pessoa vacinada ter morrido não significa, contudo, em absoluto, que tenha sido por causa do fármaco.

Os efeitos indesejáveis das vacinas anticovid-19, como miocardites, pericardites, ou tromboses, têm sido muito raros com base em bilhões de doses aplicadas no mundo todo.



E, apesar disso, as redes sociais têm divulgado uma grande quantidade de mensagens sobre os "milhares de mortos" supostamente causados pelas vacinas. Em geral, capturas de tela com dados destes registros públicos acompanham as mensagens, na tentativa de fazê-las parecer confiáveis.

Segue-se, com frequência, o mesmo método: falsificar os dados de farmacovigilância para assustar o leitor, como fez recentemente a deputada francesa Martine Wonner. Ela citou dados do sistema americano VAERS, que reflete indícios de efeitos suspeitos de estarem vinculados com as vacinas.

Estes dados não revelam, porém, qualquer vínculo de causa e efeito: podem "conter informações incompletas, inexatas, fortuitas, ou inverificáveis", adverte o próprio VAERS em sua página online.

No começo de novembro, em países como Taiwan e Austrália, foi detectado um grande fluxo de informação nas redes sobre mais falecimentos causados pelas vacinas do que pelo coronavírus.



- Especulações sem fundamento científico -

A teoria, segundo a qual as vacinas fragilizam ou mesmo destroem o sistema imunológico, é um clássico antivacina, reciclado agora com a pandemia.

No começo de janeiro, algumas publicações afirmaram, sem apresentar qualquer argumento científico como embasamento, que "pessoas totalmente vacinadas desenvolvem aids". Esta hipótese tem sido refutada à exaustão pela comunidade científica: as vacinas servem, ao contrário, para reforçar o sistema imunológico.

Outro rumor recorrente nas redes sociais é que a vacinação causa esterilidade. A AFP dedicou vários artigos de checagem a respeito deste tópico, desmentindo esta teoria.

Outro falso perigo: o fármaco causaria mal de Alzheimer. Esta também é outra especulação sem fundamento, escrita por um militante antivacinas.

Quando se começou a falar do método de RNA mensageiro, circulou a teoria de que este tipo de vacina modificaria o genoma humano. O fato: o RNA mensageiro da vacina não chega ao núcleo da célula, onde se encontra o nosso DNA, desmontando esta tese, também sem fundamento.



- Muitos vacinados entre os infectados? -

As estatísticas sobre vacinados, infectados e hospitalizados são distorcidas com frequência, ou retiradas de contexto, para afirmar que as vacinas são inúteis.

Muitas pessoas alegam, por exemplo, com base em números oficiais, que há, na França, mais infectados vacinados que não vacinados em números absolutos.

Isto não demonstra, contudo, que as vacinas são inúteis.

Independentemente das estatísticas, é necessário levar em consideração que, na França, mais de 75% da população está imunizada, um índice ainda maior entre certas faixas etárias.

Ao mesmo tempo, como se sabe desde o lançamento das vacinas, elas não previnem totalmente a infecção, nem a transmissão do vírus.

É, portanto, matematicamente inevitável que a proporção de vacinados seja muito elevada entre os infectados.

Em um exemplo teórico, se 100% de uma população está vacinada, 100% dos infectados, ou mesmo hospitalizados (ainda que sejam poucos), também estarão vacinados.



Isto não representa uma informação boa, ou ruim, sobre a vacina. Trata-se de um cálculo bem conhecido pelos estatísticos, conhecido como "paradoxo de Simpson". Desta maneira, é necessário raciocinar em termos de grupos populacionais iguais, e não em números absolutos.

Assim, observa-se que os casos positivos, as hospitalizações e as mortes são "claramente mais importantes para as pessoas não vacinadas do que para as vacinadas em uma população comparável", explica a unidade de estatística do Ministério francês da Saúde.

A chegada da variante ômicron, muito contagiosa, também alimentou as interpretações equivocadas das estatísticas.

O fato de que, entre as pessoas que testam positivo para covid-19, as vacinadas são majoritariamente infectadas com a variante ômicron, levou alguns a concluírem que as vacinas aumentam o risco de contágio.

Na realidade, se a ômicron predomina entre os vacinados, é porque as vacinas são menos eficazes contra a ômicron do que contra a delta. Assim, quando uma pessoa vacinada é infectada neste momento, é principalmente pela ômicron.

Já os infectados não vacinados são apenas afetados não apenas pela ômicron, mas também - muito mais do que os vacinados - pela delta.

E os não vacinados não estão protegidos contra as formas graves da doença, se forem contaminados.



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