"Não é o Canadá, mas é quase", diz Lisa, de 62 anos, ao acordar no gramado gelado de uma área de serviço na estrada na região da Bretanha, no extremo oeste da França.
Até onde a vista alcança, desfilam caminhões, carros e alguns tratores decorados para o grande dia com bandeiras francesas e bretãs, coletes amarelos pendurados no retrovisor e faixas.
Para Lisa, que prepara seu veículo há três dias, não é sua primeira luta: ela participou desde o início do protesto social dos "coletes amarelos" que abalou a França em 2018 e 2019, e também ajuda os migrantes.
"Eu não pisquei. Estou completamente animada", diz esta auxiliar de enfermagem em um hospital público há 42 anos, que para a ocasião viaja com seu amigo e colega de protesto Phil.
A noite anterior foi animada no estacionamento da rodovia: "Algumas cervejas e música até meia-noite".
Gaitas de fole e notas de Bella Ciao. Depois de algumas horas de sono, é preciso esperar na fila para ir ao banheiro. E também para comer alguma coisa na barraca de comida instalada no dia anterior e que está transbordando de doações: pacotes de água, caixas de frutas, compotas, chocolate... como nos tempos dos "coletes amarelos".
Esta coluna, formada por uma improvável aliança de ativistas de esquerda, extrema-direita e "coletes amarelos", partiu de várias cidades da Bretanha, mas com a mesma visão negativa do governo.
Além de rejeitar as medidas sanitárias adotadas para conter a pandemia de covid-19, como a vacinação obrigatória ou o passaporte sanitário, esse grupo heterogêneo também se preocupa com o custo de vida.
Para Lisa, o desejo de "viver algo juntos" também os une nesta ação inédita na França, inspirada nos caminhoneiros do Canadá que há duas semanas bloqueiam o centro de Ottawa.
"Estamos frustrados, esperávamos algo assim, um catalisador", acrescenta Phil, que compara a empolgação atual aos primeiros dias dos "coletes amarelos", movimento que perdeu força com a chegada da pandemia.
- "Arrepiada" -
"Quando vamos às manifestações, nos sentimos menos sozinhos", diz a ativista, que comemora 58 anos a bordo de seu caminhão.
"Ao recusar a vacina, sofremos muitas rupturas na família ou no trabalho."
"É uma aventura. Eu juro para você que o que estamos vivendo não é pouca coisa", afirma ao assumir o volante com seu companheiro de viagem de cabelos compridos e ruivos, com sua buzina e sua risada fácil.
"Vamos embora! Fico arrepiada", diz Lisa, gravando-se ao vivo com seu celular. A comitiva, composta por várias centenas de carros, caminhonetes e camiões, dirige-se a Le Mans por estradas secundárias, sem ultrapassar os 60 entre campos e, por vezes, gendarmes.
"É uma pena para aqueles que vão trabalhar. Eu me sinto mal por eles", lamenta Lisa.
Dentro do veículo, ela e Phil se sentem como se tivessem saído de férias, grudados no carro da frente. "Quero que tudo corra bem (...) ficaria chateada se saísse do controle", insiste a manifestante.
"Só precisamos que eles vejam, ouçam essas pessoas que querem viver normalmente e livremente."
Phil diz que eles podem ter que remover as faixas do "comboio da liberdade" ao se aproximarem de Paris, onde as autoridades anunciaram que impedirão qualquer tentativa de bloquear a capital.
CHÂTEAUBOURG