A ofensiva provocou clamor internacional, com reuniões de emergência previstas em vários países. Os 27 membros da União Europeia se reúnem na parte da tarde em Bruxelas, enquanto a Otan convocou uma videoconferência para sexta-feira.
Dois dias depois de reconhecer a independência dos territórios separatistas ucranianos na região de Donbas, o presidente russo, Vladimir Putin, ordenou durante a madrugada a invasão do país vizinho.
"Tomei a decisão de uma operação militar", declarou Putin em um discurso. "Vamos nos esforçar para alcançar uma desmilitarizaração e uma desnazificação da Ucrânia", afirmou.
"Não temos nos nossos planos uma ocupação dos territórios ucranianos, não pretendemos impor nada pela força a ninguém", assegurou, apelando aos soldados ucranianos "a deporem as armas".
Ele repetiu suas acusações infundadas de um "genocídio" orquestrado pela Ucrânia nos territórios separatistas pró-Rússia no leste do país e utilizou como argumento o pedido de ajuda dos separatistas e a política agressiva da Otan em relação à Rússia, da qual a Ucrânia seria uma ferramenta.
Seu porta-voz, Dmitry Peskov, disse a repórteres que Moscou pretende impor um "status neutro" à Ucrânia, sua desmilitarização e a eliminação dos "nazistas" que, segundo ele, estão no país.
"A duração (da operação) será determinada por seus resultados e sua relevância. Isso será determinado pelo comandante-em-chefe", declarou, referindo-se ao presidente Putin.
"De modo ideal, a Ucrânia precisa ser libertada e limpa dos nazistas", reiterou, acrescentando que seu país não está tentando organizar uma "ocupação".
Pouco depois da meia-noite começaram a ser ouvidas explosões em várias cidades ucranianas, da capital, Kiev, a Kharkiv, a segunda maior cidade do país na fronteira com a Rússia, mas também em Odessa e Mariupol, às margens do Mar Negro.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, proclamou a lei marcial no país e pediu aos compatriotas que "não entrem em pânico", antes de anunciar o rompimento das relações diplomáticas com Moscou.
Por volta das 10h00 GMT (7H00 de Brasília), seu gabinete informou que "mais de 40 militares ucranianos morreram, dezenas ficaram feridos" e "quase 10 civis morreram".
As autoridades da região de Odessa também indicaram que 18 pessoas morreram em um vilarejo bombardeado pela Rússia.
Por volta das 12h00 GMT (9h00 de Brasília), a ofensiva parecia ter como alvo Kiev: as autoridades ucranianas disseram que as forças terrestres russas entraram nas proximidades da capital e que um avião militar ucraniano caiu na região com 14 pessoas a bordo.
No metrô de Kiev, dezenas de pessoas tentavam se abrigar ou deixar a cidade, de trem ou por estrada.
"Acordei com o som de bombas, fiz as malas e fugi", contou à AFP Maria Kachkoska, de 29 anos, agachada em estado de choque no metrô.
Mesmo quando ainda era escuro, o trânsito era similar ao da hora do rush. Carros cheios de famílias corriam para fora da cidade, para o oeste ou para áreas rurais, longe da fronteira russa, a 400 km de distância.
- "Pedi que fosse embora" -
Em Chuguev, perto de Kharkiv, uma mulher e seu filho lamentavam a morte de um homem por um míssil, uma das primeiras vítimas dos ataques. "Eu pedi que ele fosse embora", repetia o filho, ao lado de um carro destruído e da cratera deixada pelo projétil que caiu entre dois prédios de cinco andares.
O exército russo assegurou que visa apenas locais militares ucranianos com "armas de alta precisão". E alegou ter destruído bases aéreas ucranianas e de defesa antiaérea, enquanto Kiev declarou ter abatido cinco aviões russos e um helicóptero.
A Ucrânia anunciou o fechamento do seu espaço aéreo para a aviação civil. Os voos foram cancelados nos aeroportos das principais cidades do sul da Rússia, perto da Ucrânia, e Moscou fechou o Mar de Azov ao transporte.
A invasão russa, após meses de tensão e esforços diplomáticos para evitar uma guerra, provocou uma torrente de condenação internacional.
"Presidente Putin, em nome da humanidade, leve suas tropas de volta à Rússia!", pediu o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, visivelmente exausto, durante uma reunião de emergência do Conselho de Segurança.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, denunciou um "ataque injustificado". "O presidente Putin escolheu uma guerra premeditada que trará perdas catastróficas de vidas e sofrimento humano", afirmou em um comunicado.
"Apenas a Rússia é responsável pela morte e a destruição que este ataque provocará", insistiu, depois de destacar que "o mundo fará com que a Rússia preste contas".
Ele também conversou com o presidente ucraniano, prometendo seu apoio.
O presidente francês, Emmanuel Macron, atual presidente do Conselho da União Europeia, pediu aos europeus "unidade" e convocou um conselho de segurança no Palácio do Eliseu.
"Os líderes russos enfrentarão um isolamento sem precedentes", alertou Josep Borrell, chefe da diplomacia da UE.
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, advertiu que os países ocidentais pretendem impor "grandes sanções" contra a economia da Rússia, em resposta à invasão da Ucrânia, e chamou Vladimir Putin de "ditador".
- Mercados em pânico -
O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, condenou um "ataque imprudente e não provocado" da Rússia.
Uma reunião de emergência dos embaixadores da Aliança Atlântica foi convocada.
A China, com relações estreitas com Moscou, disse que "compreende as preocupações razoáveis da Rússia em matéria de segurança".
"A China sempre respeitou a soberania e a integridade territorial de todos os países", disse o ministro chinês das Relações Exteriores, Wang Yi, a seu colega russo, Serguei Lavrov.
"Ao mesmo tempo, também observamos que a questão ucraniana tem uma história especial e complicada. Entendemos as preocupações razoáveis", declarou.
Muitos temem que a crise na Ucrânia possa levar ao conflito mais grave na Europa desde 1945. Uma intervenção russa poderia resultar em "até cinco milhões de pessoas deslocadas", alertou a embaixadora americana na ONU, Linda Thomas-Greenfield.
Washington e seus aliados ocidentais adotaram as primeiras sanções na terça-feira em resposta ao reconhecimento dos separatistas do Donbas apoiados por Moscou, que Kiev vem lutando há oito anos, um conflito que já matou mais de 14.000 pessoas até o momento.
Os mercados mundiais foram imediatamente atingidos. Logo após o discurso de Putin, a cotação do barril de petróleo superou US$ 100 pela primeira vez em mais de sete anos.
Após uma interrupção, a Bolsa de Moscou reabriu e operava em queda de quase 14%.
Os Estados Unidos devem apresentar um projeto de resolução na mesa do Conselho de Segurança da ONU condenando a Rússia por sua "guerra" na Ucrânia.
KIEV