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Estado de Minas Guerra na Europa

UE vai excluir bancos russos das compensações

Potências ocidentais decidem isolar sistema financeiro russo e podem congelar ativos do Banco Central da Rússia na Europa


27/02/2022 04:00

Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen
Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen disse que as transações financeiras serão congeladas e a liquidação dos ativos russos será impossível (foto: Johanna Geron/Pool/AFP)

As potências ocidentais decidiram excluir vários bancos russos do serviço de compensações interbancárias Swift, fundamental em transações internacionais, como parte de um arsenal de sanções contra a Rússia pela invasão da Ucrânia, anunciou o governo alemão ontem. Os bancos sancionados serão “cortados dos fluxos financeiros internacionais, o que reduzirá substancialmente suas operações globais”, destacou o governo da Alemanha. Mais cedo, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, disse que líderes mundiais teriam “as mãos sujas de sangue” se não banissem a Rússia da rede de pagamentos Swift, fundamental para transações eficazes de valores financeiros ao redor do mundo.

Swift é uma plataforma financeira global que permite a transferência rápida e tranquila de dinheiro através de fronteiras. Seu nome significa Sociedade para Telecomunicação Financeira Mundial entre Bancos, na tradução da sigla, do inglês. Ele envia mais de 40 milhões de mensagens por dia, e trilhões de dólares passam de mão em mão entre empresas e governos. Acredita-se que mais de 1% dessas mensagens envolvam pagamentos russos.

O Swift foi criado por bancos americanos e europeus, que não queriam que uma única instituição desenvolvesse seu próprio sistema e tivesse um monopólio sobre essas transações. Hoje, a rede é de propriedade conjunta de mais de 2 mil bancos e instituições financeiras. É gerenciada pelo Banco Nacional da Bélgica, em parceria com grandes bancos centrais de várias partes do mundo – incluindo o americano Federal Reserve e o Banco da Inglaterra, do Reino Unido.

A Comissão Europeia anunciou ainda que vai propor “paralisar os ativos do banco central russo na União Europeia (UE), para que Moscou não possa usá-los para financiar a invasão da Ucrânia, disse a presidente da comissão, Ursula von der Leyen. Com essa medida, “as transações financeiras serão congeladas e a liquidação dos ativos russos será impossível”, explicou Ursula em vídeo após se reunir com representantes de Estados Unidos, França, Alemanha e Itália.

As sanções ocidentais para excluir os bancos russos do sistema global e criar barreiras ao banco central daquele país tornam a Rússia um “pária” financeiro, com um rublo “em queda livre”, disse um funcionário do alto escalão americano ontem. “A Rússia se tornou um pária financeiro e econômico global”, afirmou a fonte. Seu banco central “não pode apoiar o rublo. Apenas Putin pode decidir que custo adicional está disposto a assumir”, declarou o funcionário, acrescentando que um grupo de trabalho “perseguirá os iates, jatos, carros de luxo e mansões” dos oligarcas russos. As potências ocidentais definiram ontem uma nova rodada de sanções financeiras contra a Rússia pela invasão à Ucrânia.

Impacto 

Com a suspensão da Rússia do Swift, empresas russas perdem acesso às tranquilas e eficazes transações instantâneas oferecidas pelo sistema de compensações. Pagamentos por seus produtos de energia e para a agricultura seriam seriamente abalados. Bancos provavelmente terao de lidar diretamente um com o outro, o que provocará atrasos e custos adicionais, e consequentemente reduzirá a entrada de recursos para o governo russo. A Rússia já sofreu ameaça de ser retirada do Swift antes – em 2014, quando anexou a Crimeia, território ucraniano. A Rússia disse na época que a medida seria o equivalente a uma declaração de guerra.

Aliados ocidentais não seguiram em frente com a medida, mas a ameaça levou a Rússia a desenvolver seu próprio sistema de transferência entre países, porém ainda incipiente. Moscou criou governo o Sistema Nacional de Pagamentos de Cartão, conhecido como Mir, para processar pagamentos com cartões. No entanto, poucos países o utilizam atualmente.

A Rússia é o maior fornecedor de petróleo e gás da União Europeia, e encontrar fornecedores alternativos não será fácil. Com preços de energia já disparando ao redor do mundo, uma interrupção adicional é algo que muitos governos gostariam de evitar. Além disso, empresas credoras dos russos terão de encontrar outras formas de serem pagas. O risco de um caos no sistema bancário internacional é muito grande, dizem vários observadores.

Alexei Kudrin, ex-ministro das Finanças da Rússia, sugeriu que uma expulsão do Swift poderia provocar uma redução de 5% no PIB (Produto Interno Bruto) da Rússia. Há, porém, dúvidas sobre o impacto na economia russa no longo prazo. Bancos russos poderiam redirecionar pagamentos através de países que não lhe impuseram sanções, como a China, que tem seu próprio sistema de pagamentos.

Manifestações de solidariedade

Com passeatas à luz de tochas, ou simples caminhadas nas ruas, as manifestações de solidariedade com a Ucrânia e contra a invasão russa se multiplicam em todo mundo, da Argentina à Geórgia, passando por Canadá e Itália. Milhares de manifestantes saíram às ruas ontem, em Nova York, para protestar contra a invasão da Rússia na Ucrânia, numa manifestação que contou com milhares de ucranianos e descentes que vivem na cidade dos EUA. Na sexta-feira à noite, quase 30.000 pessoas se reuniram na Geórgia, antigo país soviético. A guerra, que segundo Kiev já custou a vida de pelo menos 198 civis, provocou um sentimento de “déjà vu” na Geórgia, também vítima de uma devastadora invasão russa em 2008.

Os manifestantes marcharam pela principal rua da capital, Tbilisi, agitando bandeiras ucranianas e georgianas e cantando os hinos nacionais de ambos os países.Temos compaixão pelos ucranianos, talvez mais do que outros países, porque conhecemos a agressão bárbara da Rússia no nosso solo, disse à AFP Niko Tvauri, um motorista de táxi de 32 anos. Ucranianos, georgianos, o mundo inteiro deve resistir a Putin, que quer restaurar a União Soviética, declarou Meri Tordia, professora de francês de 55 anos. “A Ucrânia está sangrando, e o mundo está assistindo e falando sobre sanções que não conseguem parar Putin”, acrescentou ela, chorando.

Em Roma, uma marcha à luz de tochas com milhares de participantes desfilou na noite de ontem, até o Coliseu, com cartazes que diziam “Putin, assassino!”, “Sim à paz, não à guerra”, ou ainda “Banir a Rússia do Swift”. Outros cartazes mostravam o presidente russo com a mão manchada de sangue sobre o rosto, ou comparavam-no a Hitler com a menção: "Você sabe reconhecer a história quando ela se repete?”.

“Sempre fomos próximos do povo ucraniano (...) Daqui, nosso sentimento de impotência é enorme. Não podemos fazer mais nada no momento", disse à AFP Maria Sergi, de 40 anos, uma italiana nascida na Rússia. Vladimir Putin “causou muitos danos, até mesmo ao seu próprio povo. Temos muitos amigos que sofreram muito por causa de sua política”, acrescentou. Em Atenas, na noite de sexta-feira, em frente à embaixada russa, mais de 2.000 pessoas se reuniram a pedido do Partido Comunista e do partido de esquerda radical Syriza. Tradicionalmente pró-russos, esses partidos denunciam a “invasão russa da Ucrânia” e uma “guerra imperialista contra um povo”.

Tóquio, Taipei, Curitiba, Nova York e Washington também foram palco de manifestações. Na Argentina, cerca de 2.000 pessoas, incluindo imigrantes ucranianos e argentinos de ascendência ucraniana, manifestaram-se em Buenos Aires, pedindo à embaixada russa "a retirada incondicional" das tropas “assassinas” de Putin. Embrulhados na bandeira ucraniana, vestidos com trajes tradicionais, com faixas em espanhol, ucraniano, ou inglês, dizendo “Pare a guerra”, ou “Putin tire suas mãos da Ucrânia”, os manifestantes gritavam palavras de ordem em ucraniano, como “Glória à Ucrânia, Glória aos seus heróis” e cantavam os hinos ucraniano e argentino.

“Russos e ucranianos têm muito em comum. Então, meu principal sentimento é a raiva. A última coisa que imaginei era que os russos entrariam para matar meu povo", disse Tetiana Abramchenko, de 40 anos, quase às lágrimas. Ela chegou com a filha à Argentina em 2014, após a anexação russa da Crimeia. Em Montreal, no Canadá, dezenas de pessoas não hesitaram em enfrentar uma tempestade de neve para protestar sob as janelas do Consulado Geral russo. “Putin, tire suas mãos da Ucrânia”, cantaram em coro. “Sou contra esta guerra”, afirmou Elena Lelièvre, engenheira russa de 37 anos, em entrevista à AFP. Alguns manifestantes seguravam um retrato de Vladimir Putin coberto com uma mão ensanguentada, e outros carregavam bandeiras ucranianas ao vento. Outras manifestações também foram organizadas em Halifax, Winnipeg, Vancouver e Toronto nos últimos dias.

Críticos à guerra se organizam

A diretora da rede internacional de TV RT está furiosa. Como cidadãos russos podem ser contra a guerra de Vladimir Putin na Ucrânia? Para ela, é simples: eles não são mais russos. Margarita Simonian, que costuma fazer comentários fervorosos no Twitter em defesa do presidente russo, a quem chama de líder, não faz rodeios: “Se agora têm vergonha de ser russos, não se preocupem, não são russos”. Milhares de pessoas se manifestaram contra a invasão russa à Ucrânia e a reação da polícia foi a mesma que com opositores do Kremlin: realizando centenas de prisões. Tanto é que o movimento se transferiu para a internet e começou a se fazer ouvir e a receber apoio de alguns famosos.

As bandeiras ucranianas são onipresentes nas fotos de perfil, assim como os emojis de choro. A hashtag #HeTBohe? (não à guerra) era popular no Twitter ontem. Desde a última quinta-feira, data do início da invasão, celebridades russas de maior ou menor calibre expressaram seu horror, sua impotência, e pediram o fim imediato da guerra, que atinge o coração da Europa. Funcionária do jornal “Kommersant”, a jornalista Elena Tchernenko, disse que foi excluída do pool de colegas que acompanhavam o ministro russo das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, por ter iniciado uma petição contra a guerra.

Uma carta aberta das profissões artísticas e culturais foi apoiada ontem por mais de 2.000 pessoas do sindicato. Médicos e enfermeiros assinaram sua própria carta on-line.


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