"O que nos informaram é que 27 câmeras (...) estão sendo removidas no Irã. Então, é claro, isso representa um sério desafio à nossa capacidade de continuar trabalhando lá", afirmou o diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, em uma entrevista coletiva na sede da organização, em Viena.
Os Estados Unidos também manifestaram sua preocupação antes de considerar como "provocações de Teerã".
O chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, garantiu que a ação do Irã pode derivar em "uma crise nuclear agravada" e um "maior isolamento econômico e político do Irã".
Ontem (8), o Irã anunciou que desconectou algumas das câmeras, sem especificar o número, para protestar contra a votação do Conselho de Governadores da AIEA sobre uma resolução que criticava Teerã por sua falta de cooperação.
"O Irã condena a adoção da resolução apresentada por Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha na reunião do Conselho de Ministros da AIEA, que é uma ação política, não construtiva e incorreta", afirma um comunicado do ministério das Relações Exteriores.
A crítica direcionada ao Irã, a primeira desde junho de 2020, foi aprovada por 30 dos 35 membros da AIEA. Apenas Rússia e China votaram contra, enquanto Índia, Líbia e Paquistão optaram pela abstenção.
O texto foi aprovado depois que a AIEA, com sede em Viena, expressou preocupação com restos de urânio enriquecido encontrados em três unidades nucleares não declaradas do Irã.
"A adoção da resolução, que é baseada no relatório apressado e desequilibrado do diretor geral da AIEA e em informações falsas e fabricadas pelo regime sionista (em uma referência a Israel), somente enfraquecerá o processo de cooperação e interação entre a República Islâmica do Irã e a Agência", afirma o ministério em seu comunicado.
Os países que promoveram esta iniciativa serão "responsáveis pelas consequências", tuitou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Saeed Khatibzadeh.
A desinstalação das câmeras constitui uma "resposta firme e proporcional", acrescentou.
Khatibzadeh também garantiu que o Irã tem "o programa nuclear pacífico mais transparente do mundo".
- "Não recuaremos" -
Além da desativação das câmeras, o Irã informou à AIEA a "instalação de centrífugas avançadas" na central de Natanz (centro), com as quais aumentou significativamente sua capacidade de enriquecimento de urânio.
Até agora, o Irã teve o cuidado de evitar confrontos com a AIEA, mas desta vez, o presidente ultraconservador Ebrahim Raisi foi inflexível. "Não vamos recuar", declarou, segundo a agência oficial Irna.
A AIEA, encarregada de verificar o caráter pacífico do programa nuclear iraniano, pode continuar as inspeções e tem outros instrumentos à sua disposição, mas a resposta de Teerã representa "menos transparência, mais dúvidas", explicou Grossi.
"Isso significa que estamos chegando ao fim da corrida? Espero que não", acrescentou, instando o Irã a retomar o diálogo assim que "as emoções se acalmarem um pouco".
- "Negociações em risco" -
Após a aprovação da resolução, França, Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos pediram a Teerã que "respeite suas obrigações" e coopere com a AIEA.
Se o bloqueio persistir, "em três ou quatro semanas", a AIEA não será mais capaz de fornecer a informação necessária para o monitoramento do programa nuclear iraniano, destacou Grossi, afirmando que isso representaria um "golpe fatal" ao acordo de 2015, o qual estabelecia a limitação das atividades nucleares em troca de uma redução das sanções internacionais contra o Irã.
Este acordo está paralisado desde que o ex-presidente Donald Trump retirou unilateralmente os Estados Unidos do pacto em 2018 e restabeleceu as sanções. Um ano depois das novas e severas medidas punitivas, o o Irã começou a descumprir os compromissos assumidos no âmbito do acordo.
As negociações para reativar o acordo nuclear começaram em abril de 2021, mas estão paralisadas desde março deste ano.
De acordo com Eric Brewer, especialista da 'Nuclear Threat Initiative' (NTI), com sede nos Estados Unidos, as decisões do Conselho de Ministros "podem piorar as coisas de maneira dramática".
De modo concreto, o analista teme que a decisão de interromper o funcionamento das câmeras dificulte o monitoramento da AIEA e permita que o Irã aumente suas capacidades de enriquecimento, além de acumular material suficiente para fabricar uma bomba.