"Como meu mandato de alta comissária chega ao fim, a 50ª sessão do Conselho será a última em que me expresso", disse a ex-presidente chilena, de 70 anos, ao Conselho de Direitos Humanos em Genebra.
Bachelet avisou seu "chefe" Antonio Guterres, o secretário-geral da ONU, há dois meses.
"Ele queria que eu ficasse, mas (...) já não sou uma jovem e depois de uma longa e rica carreira, quero voltar ao meu país, com minha família", explicou.
Guterres elogiou Bachelet e disse que ela "vivia e respirava os direitos humanos". "Fez as coisas avançarem em um contexto político extremamente difícil", acrescentou.
"Estou triste de vê-la ir embora. Por sua história pessoal, defendia os direitos humanos como poucos", reagiu no Twitter a embaixadora alemã nas Nações Unidas, Katharina Stasch, em Genebra.
O cargo de alto comissário para os Direitos Humanos enfrenta fortes pressões políticas de muitos países ao redor do mundo. Apesar da possibilidade de dois mandatos, quase todos os antecessores de Bachelet evitaram ficar mais de um mandato.
Primeira mulher a assumir a presidência do Chile, vítima de torturas, Bachelet foi nomeada alta comissária pelo secretário-geral da ONU em 2018. Seu mandato acaba no fim de agosto
O estilo de Bachelet, baseado no diálogo, marcou uma clara ruptura com seu antecessor, o jordaniano Zeid Ra'ad Al Hussein.
"Continuem buscando o diálogo", afirmou ao Conselho. "É necessário estar preparado para ouvir o outro, entender seus pontos de vista e trabalhar ativamente para encontrar uma área comum".
- China -
Recentemente, ela foi alvo de duras críticas por parte dos Estados Unidos e de ONGs como Human Rights Watch e Anistia Internacional, que a acusaram de ter uma posição muito tolerante diante das violações dos direitos humanos na China.
A chilena foi criticada por não ter denunciado com mais firmeza os abusos durante sua visita ao país asiático, a primeira de uma pessoa que ocupa seu cargo desde 2005.
"Isto não tem nada a ver com a decisão de não tentar um segundo mandato", disse. "Sempre escuto as críticas, mas não é isso que me faz adotar certas posições".
Também foi criticada por adiar a publicação de um relatório que documenta a situação dos direitos humanos em Xinjiang.
Nesta segunda-feira, Bachelet explicou que primeiro vai compartilhar o relatório com as autoridades chinesas - como acontece com todos os países - antes da publicação.
Ela reiterou que, durante os encontros com as autoridades chinesas, incluindo o presidente Xi Jinping, falou sobre as violações dos direitos humanos.
"Sempre destaquei a importância do diálogo em minhas interações com todos os países-membros, inclusive sobre as questões mais difíceis", afirmou.
Bachelet anunciou um acordo com a China para uma reunião anual de alto nível dedicada aos direitos humanos.
- Detenção e tortura -
Nascida em 29 de setembro de 1951 em Santiago, Michelle Bachelet passou a infância em várias cidades do Chile, onde seu pai, piloto da Aeronáutica, era enviado. Em 1970, ela começou a estudar Medicina e entrou para as Juventudes Socialistas.
Ela sofreu na própria pele o golpe militar de 11 de setembro de 1973 e a violenta ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990). Seu pai, Alberto Bachelet, morreu em 1974, vítima de tortura por permanecer leal ao governo do presidente socialista derrubado Salvador Allende.
A morte do pai marcou para sempre a vida de Michelle, que sempre tentou permanecer à altura dos desafios.
Em 1975, ela foi detida ao lado da mãe pelo Serviço Secreto. As duas foram levadas para o centro de "Villa Grimaldi"', uma área clandestina de torturas de Santiago.
Depois, ambas partiram para o exílio, primeiro na Austrália e depois na Alemanha Ocidental, onde ela prosseguiu os estudos de Medicina. Retornou ao Chile 1979 e se formou três anos depois.
Esta pediatra, mãe de três filhos, foi presidente do Chile em duas ocasiões.
Depois do primeiro mandato (2006-2010), concluído com níveis recordes de popularidade, Bachelet não disputou a eleição seguinte, porque a Constituição impede dois mandatos consecutivos.
Foi então nomeada diretora da ONU-Mulheres, em Nova York, cargo internacional no qual promoveu o valor das mulheres na política.
No fim de 2013, voltou a disputar a presidência do país e conquistou um segundo mandato (2014-2018). Nele, conseguiu a aprovação de várias reformas progressistas, como o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a descriminalização do aborto.