No quarto mês de guerra na Ucrânia, o presidente russo, Vladimir Putin, desafia a União Europeia (UE) com cortes de gás considerados como uma "chantagem".
De fato, Moscou pressiona onde mais dói e joga com a vulnerabilidade energética dos europeus, que consomem em média 40% do gás procedente da Rússia. Esse percentual é ainda maior em outros países: 55% no caso da Alemanha, e 85%, da Bulgária.
Na maioria dos países europeus, a escassez de gás ainda não é sentida, pois em pleno verão não é necessário ligar o aquecimento. Mas é justamente no período de verão que os países costumam reabastecer suas reservas, com o objetivo de estocar pelo menos 80% até novembro na UE.
A queda nas entregas eleva os preços, o que será caro para as indústrias, especialmente na Alemanha, cujas fábricas, muitas vezes diretamente conectadas a gasodutos, precisam de grandes quantidades de gás nas indústrias química, siderúrgica, de cimento e fertilizantes.
"Os russos usam o gás como arma há muito tempo", disse à AFP Thierry Bros, professor do Instituto Sciences Po de Paris.
"O Kremlin utiliza o princípio da incerteza para analisar nossa unidade e pressionar o mercado de commodities e empurrar os preços para cima", completou.
Nesta sexta-feira, a operadora da rede francesa de transporte de gás GRTgaz anunciou que não recebe gás russo por gasoduto desde 15 de junho, com a "interrupção do fluxo físico entre França e Alemanha".
O gás russo representa 17% do utilizado na França, aonde chega por gasoduto, ou em forma líquida em navios.
A oferta caiu 60% desde o início do ano, segundo a GRTgaz. Desde quarta-feira (15), a oferta foi reduzida a zero.
A GRTgaz não sabe a causa do corte, mas ocorre no momento em que a empresa russa Gazprom reduziu consideravelmente as entregas para a Alemanha através do gasoduto Nord Stream 1.
- Compras de GNL -
"Não devemos ter ilusões, estamos em confronto com Putin", disse o ministro alemão da Economia e do Clima, Robert Habeck, na quinta-feira (16), à televisão estatal.
"É uma decisão que ele toma arbitrariamente: é assim que ditadores e déspotas agem", acrescentou.
As consequências também são graves para a Itália, que receberá nesta sexta-feira apenas 50% do gás encomendado por sua empresa nacional Eni.
A Itália é altamente dependente do gás russo, porque importa 95% do gás que consome. Cerca de 40% de suas compras de gás no exterior foram procedentes da Rússia em 2021.
Na quinta, durante uma visita a Kiev, o chefe do Governo italiano, Mario Draghi, qualificou de "mentiras" as explicações dadas pela Gazprom para justificar a redução da oferta, incluindo operações de manutenção.
"A Gazprom não precisa de nenhuma justificativa. É uma decisão política do Kremlin. Está cortando de forma diferenciada para quebrar a unidade europeia", diz o especialista Thierry Bros.
A Europa, que no momento impôs um embargo ao petróleo russo, mas não ao gás, procura fontes alternativas para substituí-lo, especialmente pelo gás natural liquefeito (GNL).
A França, por exemplo, importa gás de outros países, como a Espanha, que aumentou sua oferta. E aumentou suas compras de GNL, que chega de navio.
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