Após a decisão do BCE em junho de cortar as medidas de apoio monetário e de compra de ativos (para conter a inflação), o spread - a diferença entre as taxas de juros da Alemanha e da Itália em dez anos - subiu 245 pontos, seu nível mais alto em dois anos.
O anúncio do BCE de novos planos para combater o aumento do spread fez com que caísse, mas a renúncia de Draghi, rejeitada pelo presidente, disparou novamente o prêmio de risco italiano.
- Em que situação está a Itália? -
Além das tensões políticas, na Itália "existe um risco específico devido ao tamanho de sua dívida, sua baixa taxa de crescimento e sua dependência do gás russo", disse à AFP Gilles Moec, economista-chefe da seguradora e administradora AXA Group.
A Itália tem uma dívida de 2,7 trilhões de euros (quase o mesmo valor em dólares), a segunda maior da zona do euro depois da Grécia em relação ao seu PIB (150%), apesar da relação ter começado a diminuir.
Em termos de crescimento do produto interno bruto, o país está há anos na fila de trás na zona do euro: entre 1999 e 2019, cresceu apenas 7,9%, em comparação com 30,2% na Alemanha, 32,4% na França e 43,6% na Espanha.
Após a pandemia de coronavírus de 2020, o país conseguiu crescer 6,6% em 2021.
E o Banco da Itália prevê um crescimento de 3,2% para 2022, embora esse número possa ser de 1% se a Rússia cortar o fornecimento de gás como resultado das sanções pela guerra na Ucrânia.
- Areia movediça política -
A Itália é a maior beneficiária do plano de recuperação econômica lançado na Europa após a covid-19, com 191,5 bilhões de euros, e conta com esse dinheiro para relançar sua economia, mas terá de aceitar uma série de reformas impostas pela União Europeia.
A possível saída de Draghi, no entanto, complicaria a realização das reformas, e as tensões dentro da coalizão governista poderiam levar a eleições antecipadas.
A taxa de juros a dez anos estava abaixo de 0,5% quando "Super Mario" se tornou presidente do conselho de ministros, em fevereiro de 2021. Mas agora está em 3,4%.
"Se o governo Draghi cair amanhã, não consigo imaginar o que aconteceria com o diferencial", diz Franco Pavoncelo, professor de ciência política da Universidade John Cabot, em Roma.
Uma vitória para as forças da extrema-direita, ou para os populistas, degradaria a situação, como já aconteceu em 2018, quando a Liga de Matteo Salvini e o Movimento Cinco Estrelas governaram juntos.
- BCE ao resgate -
"Foi a pressão sobre a Itália que convenceu o BCE a criar uma ferramenta" para limitar as diferenças de custo de financiamento entre as economias mais fracas do euro, aponta Gilles Moec.
Com esta ferramenta, o BCE procura conter a especulação e evitar uma crise da dívida como a de 2012.
Para o economista-chefe do banco italiano Unicredit, Erik Nielsen, o súbito aumento das taxas em junho foi pura especulação: "não responde a um problema real de insolvência".
"A Itália é vista como o país mais vulnerável, por isso há especulações", acrescentou.
Mas a chegada de forças antissistema no governo italiano pode complicar a situação, já que os países ditos "austeros" do norte da Europa não veem com bons olhos a ajuda do BCE aos Estados eurocéticos.
- Crise semelhante à de 2012? -
Para o economista Jesús Castillo, do banco de investimento Natixis, um aumento das taxas de juros não perturbaria as finanças públicas italianas: "Para que haja problemas de solvência, têm que subir muito rapidamente e por muito tempo".
Além disso, os títulos da dívida da Itália têm duração média de sete anos, portanto, o aumento das taxas não afeta diretamente a dívida.
Por outro lado, o país está numa situação melhor do que em 2012. "Os fundamentos econômicos continuam compatíveis com a sustentabilidade da dívida de longo prazo", garante Castillo.
ROMA