Em um contexto geopolítico tenso no mundo, o Mercosul atravessa seu próprio período de turbulências internas desde que o Uruguai decidiu negociar sozinho um acordo comercial com o país asiático, diante da falta de avanços no tratado negociado por mais de duas décadas entre o bloco sul-americano e a União Europeia.
O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, disse que lhe "causa ansiedade e incerteza o avanço pequeno das negociações com a União Europeia, parceiro natural, histórico e de futuro" para o Mercosul.
Lacalle Pou e seu colega argentino, Alberto Fernández, tiveram diferenças agudas nos últimos anos diante da negativa de Buenos Aires para que Montevidéu negocie sozinho com terceiros países.
O Mercosul, que abrange cerca de 300 milhões de habitantes, inclui o Brasil e o Paraguai como sócios plenos, e tem como norma que as negociações comerciais sejam feitas em bloco, e não de maneira individual, a menos que exista a anuência de todos os membros.
Enquanto o Brasil moderou sua posição sobre esta polêmica, a Argentina se mantém inflexível. "Por que não lançamos juntos o acordo com a China? Por que não o avaliamos juntos? Esse acordo será muito mais forte assim", propôs Fernández, em referência aos avanços anunciados por Lacalle Pou antes da cúpula de Assunção sobre as tratativas de seu país com a China.
O presidente argentino citou o acordo comercial obtido entre o Mercosul e Singapura, o primeiro do grupo com um país do Sudeste Asiático, com uma clara alusão ao caminho empreendido pelo Uruguai com a China. "Que não nos enganemos com a ideia de buscar soluções individuais. O Mercosul deve viver por muito tempo. Deve viver para sempre", assinalou Fernández.
- Juntos ou separados -
Diante do discurso de seu colega argentino, Lacalle Pou garantiu que seu país tem plenas intenções de convidar os parceiros do Mercosul para participar de uma negociação com a China, mas em uma etapa posterior. E advertiu que se Brasil, Argentina e Paraguai decidirem não participar, o Uruguai irá avançar de qualquer forma.
"Está claro: as costas são muito mais largas com o Mercosul. Em poucos dias, nossas equipes estarão se juntando para começar as negociações do tratado com a China. Certamente, assim que avançarmos nessa etapa, a primeira coisa que pretendemos fazer é falar com o Mercosul, para ver se iremos todos juntos", assinalou o presidente uruguaio.
"Falaremos com os parceiros e iremos convidá-los", enfatizou. Caso contrário, "o Uruguai irá avançar. Temos a tranquilidade de que isso não viola, não erode, nem provoca ruptura em nossa organização. O Mercosul continuará existindo. Entendemos os outros países, mas pedimos compreensão neste caso", insistiu.
O chefe de Estado do Paraguai, Mario Abdo Benítez, anfitrião da cúpula, também fez um apelo pela manutenção da unidade.
"A conjuntura crítica global exige que concentremos, mais do que nunca, as energias na adoção da postura de políticas conjuntas e compartilhadas, que possibilitem satisfazer às necessidades de nossos povos", frisou. A crise econômica mundial "demanda, mais do que nunca, espaços como o Mercosul", ressaltou Benítez.
A cúpula desta quinta-feira em Assunção é primeira que se celebra de maneira presencial desde o começo da pandemia de covid-19. O presidente Jair Bolsonaro não compareceu e enviou uma mensagem de vídeo.
No encontro, Lacalle Pou recebeu oficialmente de Abdo Benítez a presidência rotativa do grupo para os próximos seis meses.