"Como camponeses sem terra, vamos continuar (nas fazendas). Se for preciso brigar com o mesmo governo que colocamos lá, teremos que brigar", advertiu um de seus líderes, que falou com a AFP sob a condição de anonimato, temendo uma "perseguição judicial".
Cerca de mil famílias ocupam há um ano duas fazendas de cana no município de Corinto, no departamento (estado) de Cauca.
Frente à expectativa gerada pela reforma proposta por Petro para redistribuir a propriedade rural, multiplicaram-se as invasões de terras, segundo associações de pecuaristas e usineiros.
Nesta terça, o governo rechaçou estas ações. O ministro da Defesa, Iván Velásquez, lembrou que a polícia está autorizada a retomar as construções "dentro das 48 horas seguintes à ocupação".
Os camponeses interpretaram suas palavras como um ultimato, atiçando as tensões em Corinto.
"O comunicado lançado pelo presidente é algo muito preocupante para o processo que nós estamos realizando", comentou o dirigente das comunidades.
A desocupação, reforçou, implicaria "alguma arremetida, algum atropelo da força pública".
Os ocupantes vivem nas construções precárias das fazendas, que não têm mais portas ou janelas. Outros ergueram acampamentos nas terras invadidas.
Eventualmente, enfrentam a polícia com atiradeiras e pedras. Desde a chegada de Petro ao poder, em 7 de agosto, os confrontos tinham parado, mas com o chamado de atenção do governo, poderiam voltar.
"Esse tipo de ameaças e ações jurídicas do governo não são novos e prosseguimos aqui", afirmou o líder de outras famílias que também ocupam sítios em Corinto.
No entanto, "aqui tem muita fortaleza", advertiu o dirigente, que também se absteve de se identificar por motivos de segurança.
- Primeiro o diálogo -
Nesta quinta-feira, o ministro da Defesa esclareceu que não deu "nenhuma ordem excepcional" para que a polícia ou o exército desocupem as fazendas. "A instrução é privilegiar sempre o diálogo sobre as medidas de força", tuitou.
Petro, primeiro presidente de esquerda da Colômbia, prevê realizar uma "reforma agrária" para redistribuir a propriedade rural no país onde mais se concentra terra em poucas mãos, segundo a ONG inglesa Oxfam.
No âmbito desta política, o governo anunciou que cederá aos "colombianos mais vulneráveis" as propriedades apreendidas de corruptos e da máfia do narcotráfico.
O acesso à terra está no centro do conflito armado que castigou a Colômbia por quase seis décadas.
Surgidos nas décadas de 1960, no calor da Guerra Fria, vários grupos, formados em sua maioria por camponeses, pegaram em armas para exigir uma redistribuição da propriedade agrícola.
Os paramilitares de extrema direita, inimigos declarados dos insurgentes, expulsaram violentamente milhares de famílias de suas terras para depois vendê-las a pecuaristas ou latifundiários.
Em 2018, indígenas do povo Nasa, no Cauca, começaram a ocupar grandes fazendas para libertar, segundo proclamam, a "Mãe Terra".
Quando ocupam um terreno, costumam expulsar os trabalhadores e erradicar a cana - que consideram uma monocultura nociva - para substituí-la por zonas de reflorestamento e pequenos cultivos de arroz e banana.
Em algumas vias, podem ser vistos troncos e valas abertas pelos camponeses para impedir o avanço dos veículos da tropa de choque da polícia. Também patrulham a área com rádios para alertar sobre a presença de autoridades.
Assim como outras comunidades que se somaram a esta prática, os nasa justificam as invasões, alegando a má qualidade e a superpopulação das terras altas que margeiam o vale fértil onde a cana é cultivada.
Segundo os dados mais recentes da Oxfam, 1% das fazendas de maior porte tem em seu poder 81% da terra na Colômbia.