Trata-se de mais um passo para normalizar as relações Brasil-EUA. A Casa Branca espera se reaproximar do Planalto com o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e havia a vontade em Washington de que um representante oficial do país estivesse em Brasília durante a posse de Lula, em 1º de janeiro. Desde 2021, o cargo é ocupado de forma interina pelo encarregado de negócios Douglas Koneff.
A experiência é considerada um forte ativo, mas é comum no governo americano a indicação de doadores de campanha para representar os EUA em outros países. Bagley também cumpre o requisito —ela e seu marido doaram centenas de milhares de dólares para as campanhas de Obama e Hillary no passado. No setor privado, a família é dona de uma companhia telefônica que opera no Arizona e no Novo México.
Bagley foi indicada por Biden em janeiro deste ano, mas a nomeação estava travada desde junho, quando a Comissão de Relações Exteriores do Senado americano não aprovou seu nome. Houve resistência sobretudo devido a declarações de Bagley, em 1998, à revista da Associação para Treinamento e Estudos Diplomáticos, consideradas antissemitas.
Em duas das perguntas da entrevista de 86 páginas, Bagley afirmou que "sempre há a influência do lobby judeu porque há muito dinheiro envolvido". "Os democratas tendem a seguir o que os judeus definem sobre Israel e a dizer coisas estúpidas. Sempre surgem coisas como mudar a capital para Jerusalém. São coisas que nós não deveríamos nem sequer tocar."
As falas foram citadas na sabatina a que Bagley foi submetida no Senado, em maio, quando respondeu que "não quis dizer nada daquilo" e que "foi uma má escolha de palavras". O episódio repercutiu de maneira negativa, o que acabou travando sua nomeação.
Por meses houve especulações se o governo Biden indicaria outro nome para a vaga ou se insistiria na escolha da diplomata. No último dia 6, o senador Mark Warner fez uma manobra para retirar a indicação da Comissão de Relações Exteriores e levar para o plenário do Senado.
A justificativa foi a de que os EUA deveriam ter um embaixador no Brasil até a posse de Lula. "O Brasil terá um novo presidente e, francamente, é constrangedor que estejamos há quase dois anos sem um embaixador no Brasil", disse Warner. "Em termos das relações norte-sul, nossas relações com o Brasil são tão importantes quanto com qualquer outra nação do hemisfério sul, temos muito trabalho a fazer."
Nesta quarta, a indicação de Bagley foi votada após requisição do senador Cory Booker, de Nova Jersey, e o nome dela foi confirmado de forma unânime pelo Senado, sem votação nominal.
A movimentação no Senado aconteceu pouco após viagem de uma comitiva do governo americano ao Brasil. Jake Sullivan, assessor de Segurança Nacional dos EUA, foi a Brasília no começo do mês e se reuniu com representantes do governo Bolsonaro e membros da equipe de Lula, quando levou ao presidente eleito do Brasil um convite para viajar a Washington. Com a equipe do novo governo, a comitiva americana discutiu a possibilidade de uma nova operação militar no Haiti e a crise na Venezuela. O governo Biden também quer avançar na pauta ambiental, e, para que tudo isso avance, era considerada essencial a presença de um embaixador definitivo no país.
A ausência de um embaixador não é exclusividade do Brasil. Hoje, há 33 indicações pendentes na Comissão de Relações Exteriores do Senado, a maioria para nações menores, mas também para alguns países-chave na geopolítica americana, como Índia e Arábia Saudita. Houve um esforço para aprovar nomeações na reta final do ano: até o começo do mês, havia mais de 40 postos vagos mundo afora.