Jornal Estado de Minas

PARIS

Criações do britânico Paul Smith decoram paredes do Museu Picasso de Paris

Quando pediram ao estilista Paul Smith para decorar as paredes do Museu Picasso de Paris para reorganizar a coleção permanente, ele decidiu que seria melhor fazê-lo com fleuma e um certo toque de humor britânico.



O museu com a coleção mais importante de obras do pintor espanhol decidiu rejuvenescer sua cenografia e adicionar novas perspectivas como parte de sua agenda de atividades comemorativas pelo 50º aniversário da morte de Pablo Picasso, em 8 de abril.

Aos 76 anos, Paul Smith optou por dar cores às paredes, seja com listras (um de seus padrões preferidos ao criar roupas) ou desenhos que lembram antigos papéis pintados há 100 anos.

Na sala que reúne os melhores exemplos do período azul do pintor malaguenho, nada mais simples do que usar azul-escuro.

Para os desenhos inspirados na tauromaquia, vermelho-sangue. Para os arlequins, losangos enormes.

"Tinha carta branca para fazer o que quisesse em todo o museu, o que certamente é fantástico, mas também aterrorizante", admitiu Smith em declarações à AFP.

O projeto começou a ser concebido há cinco anos e Smith usou o tempo para explorar os arquivos do museu, com quase 200.000 obras e objetos de todo tipo.

O resultado é uma recriação visualmente fascinante do universo de Picasso, uma mistura da energia transbordante do pintor espanhol e da fleuma e ironia de Smith, conhecido pela austeridade e pelos toques de humor nas vitrines de suas lojas de roupas.



O estilista trouxe à luz, entre outros, uma série de revistas de moda que Picasso se divertia em adornar com desenhos, alguns lascivos, como por exemplo os demônios com órgãos sexuais compridos ao lado de figuras angelicais de modelos de roupas dos anos 1950.

Picasso "nunca ficava quieto", explica Smith. "Desenhava em revistas, guardanapos, jornais. Pensava constantemente em como criar formas", explica.

- Selins como cabeças de touro -

Em outra sala, Smith põe contra uma parede o conhecido selim de bicicleta recriado por Picasso, ornado com um guidão disposto na forma de chifres de touro, com uma série de selins brancos do outro lado da sala, com exceção de um, colorido.

"A forma como pensava as coisas era fascinante e muito interessante", explica o estilista.

"Fiz algo muito decorativo porque a ideia é que os estudantes e os jovens venham ver sua obra sob uma perspectiva diferente", acrescenta.

A exposição também exibe obras de outros seis artistas, incluindo uma tela da nova-iorquina Mickalene Thomas, em diálogo com as obras de Picasso da época da Segunda Guerra Mundial.



"Para se manter no mundo da moda como uma marca independente, você precisa questionar constantemente, reavaliar, e é por isso que me pediram que eu me encarregasse desta exposição", explica.

- 'Não é um mausoléu' -

O mito de Picasso e a presença maciça de suas obras no mundo, sua influência visual, impõem uma reavaliação constante do trabalho em seus museus, explica à AFP sua diretora, Cécile Debray.

"O trabalho deste museu não é servir de mausoléu para um grande homem", acrescenta.

"Queremos estar abertos aos debates e à reflexão sobre Picasso, para reconsiderar seu trabalho e demonstrar sua vitalidade contínua", assegura.

O tom brincalhão de Smith não impede, no entanto, abordar temas mais espinhosos. A exposição evita as acusações de setores feministas sobre a parte mais misógina de Picasso mas, ao contrário, é aberta a críticas de artistas africanos.

O congolês Cheri Samba e o nigeriano Obi Okigbo abordam estas críticas em suas obras.

No entanto, Picasso demonstrou publicamente em várias ocasiões sua admiração pela arte então denominada de "primitiva".

Paul Smith acredita que Picasso era simplesmente um homem aberto a todas as influências.

"Nunca hesitou em admitir que pegava emprestado de Cezanne ou de clássicos como Manet", diz Smith. "Muitos criadores da atualidade não admitem nunca suas influências".