As autoridades ordenaram a retirada de todos os menores desta cidade fantasma, encurralada e bombardeada pela Rússia por três lados, e na qual não restou nenhum imóvel de pé.
"Eles levaram meu neto de 15 anos", conta Katerina, de 64, sentada em um abrigo subterrâneo aberto alguns dias atrás.
"Começaram a retirada e o levaram embora. Ele não queria ir e sua mãe também não queria vê-lo ir. A casa dele é a casa dele, mesmo que morassem no porão", lamenta.
Devido às falhas da rede telefônica, a avó não sabe onde está o adolescente. Mas confessa que é melhor que ele tenha saído. "Até fico feliz. Talvez seja melhor lá (onde estiver). Aqui há disparos e não dá para dormir à noite", afirma.
O prefeito de Avdiivka, Vitali Barabach, disse na segunda-feira que ainda há oito crianças na cidade, acusando os pais de "escondê-las".
"Nós iremos buscá-las", ele prometeu.
De acordo com Mikhailo Purishev, diretor do novo centro de recepção para os moradores de Avdiivka, a polícia levou duas crianças na segunda-feira. Este homem, de 37 anos, é conhecido por ter retirado os habitantes de sua cidade natal, Mariupol, uma cidade portuária tomada pelos russos em maio de 2022.
Ele já estabeleceu refúgios nos piores focos da guerra, em particular em Bakhmut (leste).
Segundo ele, restam cerca de 2.000 habitantes em Avdiivka, em comparação com os 30.000 que viviam lá quando o Kremlin lançou sua invasão em fevereiro de 2022.
A cidade está na linha de frente desde 2014, no início da guerra entre as forças ucranianas e separatistas lideradas por Moscou.
- Crianças "reféns" dos pais -
Purishev não tem muita paciência com as famílias que permanecem em Avdiivka e considera as crianças "reféns dos pais".
Ele lembra a morte recente de um bebê de cinco meses após um ataque russo e diz que as crianças que vivem em porões "às vezes não veem o céu por três meses".
Em Avdiivka, ele administra um novo abrigo subterrâneo com a ajuda de moradores e voluntários. Um poço cavado com 40 metros de profundidade fornece água para o banho e máquinas de lavar roupa. Tem até um salão de beleza.
Na rua, além dos disparos da artilharia ucraniana e do latido dos cachorros, praticamente não se ouve barulho.
Algumas viaturas transportam soldados e o ar impregna-se do cheiro de fumaça dos tubos dos fogões que emergem das porões.
Liudmila, de 66 anos, corta lenha para o fogão no porão onde mora com outras seis pessoas. Ela afirma estar "constantemente tensa e assustada".
"Será que vamos sobreviver?", questiona. "Todo mundo perdeu muito peso e ficou mais grisalho", conta.
Avdiivka não possui ambulâncias nem equipes de resgate.
No hospital central, os dois médicos restantes fornecem tratamento básico e estabilizam pacientes gravemente feridos. Estes são então levados pela polícia ou por voluntários para cidades mais distantes do front da batalha.
O único cirurgião, Mikhailo Orlov, explica que os civis são feridos por estilhaços, morteiros e balas.
"Eles sofrem lesões cerebrais traumáticas abertas, ferimentos penetrantes no tórax e no abdome, feridas nas extremidades superiores e inferiores", destaca.
O diretor do hospital, Vitali Sitnik, abre a porta de uma das salas de enfermaria abandonadas, removendo uma janela quebrada recentemente. "Dedicamos tanto esforço e dinheiro à reforma" das instalações, lamenta.