As autoridades russas exigiram que o centro deixasse o local no final de abril e levasse todos os seus pertences, incluindo a exposição sobre os crimes da era soviética.
"Não é comum vermos a morte de um museu", disse com amargura Valentin, um de seus últimos visitantes, que preferiu não revelar o sobrenome. "Se for recriado algum dia, será necessariamente em uma época diferente", acrescentou.
O centro, localizado próximo a uma praça onde fica parte do Muro de Berlim, foi inaugurado em 1996 para perpetuar o pensamento do grande físico, dissidente e defensor dos direitos humanos, Andrei Sakharov (1921-1989).
Mas a ofensiva contra a Ucrânia está sendo acompanhada dentro da Rússia por uma aceleração da repressão às últimas vozes dissidentes. E o Centro Sakharov não é exceção.
Classificado em 2014 como "agente estrangeiro", o museu deve deixar sua sede devido a um recente endurecimento da lei, que proíbe "agentes estrangeiros" de obter ajuda pública.
Desde a sua criação, esta instituição usou gratuitamente essas instalações graças a uma permissão do município de Moscou.
Por quase três décadas, recebeu centenas de debates e eventos culturais. Lá, milhares de pessoas se reuniram em 2015 em frente ao caixão do opositor assassinado Boris Nemtsov.
- "Gênio e herói" -
A AFP assistiu às últimas fases do seu desmantelamento. Seus funcionários tiveram que embalar dezenas de itens que compunham a exposição permanente da repressão soviética, que ficava exposta no prédio principal do Centro.
Outra sala adjacente acolheu até domingo uma exposição temporária que traça a vida da segunda mulher de Sakharov, a militante Elena Bonner.
Svetlana Gabdulina, uma professora de inglês, não conseguiu conter as lágrimas ao visitar a mostra.
"É muito importante saber que existem pessoas que querem viver em um mundo normal, onde há direitos, onde nos defendemos", disse, com os olhos marejados.
"Os russos podem ser inteligentes, civilizados e contribuir com algo importante para este mundo", acrescentou.
Considerado um dos pais da bomba de hidrogênio soviética, Sakharov mais tarde lutou pelos direitos humanos na URSS e alertou para os perigos da corrida armamentista.
Ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1975, ainda tem ruas e monumentos em sua homenagem na Rússia.
- Risco de dissolução -
Os bens do Centro serão colocados em um depósito e à disposição de pesquisadores até a abertura, em um futuro imprevisível, de uma nova sede.
Seu diretor, Sergei Lukashevski, exilado na Alemanha, destaca que suas equipes fizeram imagens do museu antes de ser desmontado para criar, talvez, uma versão virtual.
Lukashevski acredita que atualmente é "impossível" para a Rússia ter um museu físico sobre os crimes soviéticos. "Isso nos exporia muito rapidamente a vários golpes", disse à AFP.
Qualquer novo projeto está suspenso por falta de recursos financeiros devido a uma multa alta a pagar por "violar" o seu status de "agente estrangeiro" e também a um processo instaurado pelo Ministério da Justiça que pode terminar com sua "dissolução".
Mesmo neste último caso, a ONG será reconstituída na forma de um "coletivo", diz Lukashevski.
Na noite de domingo, quase 100 pessoas se reuniram para o encerramento da exposição temporária, o último ato público antes do despejo.
"O lugar desaparece, o povo fica", afirmou Yan Rachinski, um dos líderes do Memorial, pilar da luta pelos direitos humanos dissolvido no final de 2021 após ganhar o Prêmio Nobel da Paz.
MOSCOU