A medida implica na realização de eleições gerais antecipadas inéditas.
O presidente impopular, acusado pelos congressistas principalmente de esquerda de suposta corrupção em contratos de transporte de petróleo, ordenou "dissolver a Assembleia Nacional pela grave crise política e comoção interna", segundo documento divulgado pela Presidência.
Em um país abalado pela violência ligada ao narcotráfico e pela insatisfação popular com a alta do custo de vida, a decisão pode levar ao fim do governo de direita e também ser uma oportunidade para a esquerda recuperar forças. O líder da oposição é o ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), exilado na Europa e condenado a oito anos de prisão por corrupção.
Segundo a Constituição, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) tem até a próxima quarta-feira para convocar eleições presidenciais e legislativas para completar o atual mandato de quatro anos, iniciado em 2021.
"É uma decisão democrática não apenas porque é constitucional, mas porque devolve ao povo equatoriano a possibilidade de decidir", afirmou Lasso, em mensagem em rede de rádio e televisão.
O pleito deverá ser realizado no prazo de 90 dias e o presidente, de 67 anos, poderá ser candidato.
As forças militares e policiais do Equador declararam apoio ao presidente, cuja decisão "está sujeita a uma norma constitucional e deve ser respeitada completamente por todos os cidadãos", segundo uma declaração do general Nelson Proaño, comandante das Forças Armadas.
Esta é a primeira vez que um presidente equatoriano recorre à chamada "morte cruzada", estabelecida pela Carta Magna de 2008 e que pode ser ativada uma única vez durante os três primeiros anos de mandato.
Os Estados Unidos, por sua vez, se manifestaram através do porta-voz do Departamento de Estado, Vedant Patel, que assinalou que a relação com o país sul-americano "continua sendo forte".
"Apoiamos as instituições e processos democráticos do Equador e respeitamos a vontade da população e o governo", declarou.
- 'Ditadorzinho' -
Liderada por Correa, cujo movimento era a principal força do Congresso com 49 dos 137 assentos, a oposição tachou a decisão de Lasso de "ilegal" e "golpe de Estado".
"É óbvio que não existe nenhum estado de comoção interna, mas um julgamento político seguindo a Constituição. De qualquer modo, é a grande oportunidade de mandar Lasso, seu governo e seus legisladores de aluguel para casa", tuitou Correa, que mora na Bélgica, mas é muito influente no Equador.
A Frente Popular, uma aliança de organizações de trabalhadores, professores, camponeses, estudantes e mulheres, convocou protestos.
"As ruas serão o cenário onde vamos defender os direitos e as liberdades que hoje estariam em jogo por causa de um ditadorzinho", afirmou seu líder, Nelson Erazo, em alusão a Lasso.
O edifício do Congresso permanece sob proteção militar e policial, enquanto a sede de governo no centro histórico de Quito está custodiada por efetivos das forças da ordem, constataram jornalistas da AFP.
Em frente à sede da Presidência, alguns manifestantes com bandeiras do Equador gritavam "Fora Lasso!".
- Demandas de Inconstitucionalidade -
Virgílio Saquicela, ex-presidente do Congresso, e outros ex-parlamentares entraram com ações de inconstitucionalidade contra a decisão de Lasso. "Se a Justiça rejeitar o decreto, vamos voltar. Se não aprovar, vamos respeitar a decisão", afirmou.
Até a instalação da nova Assembleia Nacional, Lasso poderá governar mediante decretos-lei de urgência econômica, mas com a aprovação do Tribunal Constitucional.
Para o cientista político Santiago Cahuasqui, da Universidade SEK, as eleições antecipadas vão beneficiar a esquerda, porque "os setores da direita estão fragilizados por um governo com menos de 15% de credibilidade".
"Os setores de centro e da esquerda podem ter mais possibilidades e mais perspectivas", acrescentou, em entrevista à AFP.
Em junho passado, o Parlamento já tinha tentado depor Lasso em meio aos violentos protestos indígenas contra o alto custo de vida, mas faltaram 12 votos para tirá-lo do poder.
Sem apoio do Legislativo, "Lasso dá um autogolpe de Estado covarde com a ajuda da polícia e das Forças Armadas, sem apoio dos cidadãos, tornando-se uma ditadura iminente", tuitou Leonidas Iza, dirigente da poderosa Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie), que participou da deposição de três presidentes entre 1997 e 2005.
A Conaie se declarou em vigília e convocou uma assembleia para tomar uma resolução em relação à decisão do presidente de dissolver o Congresso.
O Equador ganhou fama de ser ingovernável depois de forçar a saída de três presidentes entre 1997 e 2005 à base de protestos.