"Quarenta e seis é o número total de corpos que chegaram à Medicina Forense", disse o porta-voz do Ministério Público, Yuri Mora, que explicou que é preciso aguardar os exames de identificação para verificar se todas as vítimas são detentas.
A porta-voz da Direção de Medicina Forense, Issa Alvarado, informou que "há 23 corpos identificados com nomes e sobrenomes e foram entregues aos familiares".
O confronto entre gangues rivais aconteceu na terça-feira (20) no Centro Feminino de Adaptação Social (Cefas) em Támara, 25 quilômetros ao norte de Tegucigalpa.
Segundo as autoridades, detentas da gangue Barrio 18 invadiram o prédio onde estão suas rivais da Mara Salvatrucha (MS-13), atirando com armas de grosso calibre, e depois atearam fogo ao local.
"O módulo está completamente destruído, foi totalmente queimado", disse a presidente da associação de familiares de pessoas privadas de liberdade, Delma Ordoñez.
Os corpos começaram a chegar ao Necrotério Judicial de Tegucigalpa na terça-feira à tarde.
Durante toda a noite, familiares se reuniram nos arredores do necrotério em busca de informações, muitos sem saber se suas familiares estavam entre as vítimas.
"Não sei se minha filha foi baleada ou esfaqueada", disse Olga Castro, entre lágrimas, a veículos da imprensa local.
"Dizem que as ouviram gritando para abrir os portões porque no módulo 1, onde ela estava, trancaram por fora enquanto estavam pegando fogo", relatou ela, mãe de Jenny Patricia Castro, de 44 anos.
"Ninguém apareceu para abrir os portões. Que se faça justiça", clamou.
A entrega dos corpos começou na madrugada, segundo Alvarado.
"Espera-se que seja um processo rápido para dar uma resposta imediata aos familiares", afirmou a porta-voz à AFP.
Ela indicou que a Medicina Forense tem uma sala de necropsias com capacidade para 15 macas, e cinco equipes de médicos trabalham de forma simultânea.
No "processo", o corpo que dá entrada é etiquetado com um número de necropsia, e então são feitos raios-x e exames laboratoriais para a elaboração de um parecer que é entregue ao Ministério Público.
Os médicos determinam as causas da morte de cada pessoa, porque houve "disparos de armas de fogo, armas brancas, pessoas carbonizadas", acrescentou.
O Cefas abrigava cerca de 900 detentas.
- "Emergência" -
A presidente de Honduras, Xiomara Castro, disse no Twitter que está "abalada" com o "monstruoso assassinato de mulheres (...) planejado por gangues" e "à vista" das autoridades de Segurança. Ela anunciou "medidas drásticas" após o incidente e, à noite, demitiu o ministro da Segurança.
O ministro Ramón Sabillón será substituído pelo atual diretor da Polícia Nacional, Gustavo Sánchez.
A vice-ministra de Segurança, Julissa Villanueva, declarou "emergência" no presídio e autorizou "a intervenção imediata com acompanhamento de bombeiros, policiais e militares", escreveu no Twitter.
Villanueva foi nomeada para o cargo depois que confrontos em quatro presídios deixaram um morto e sete feridos em abril.
A vice-ministra anunciou, então, um plano para controlar os 26 presídios do país, onde estão cerca de 20 mil detentos. O plano inclui "desarmamento real por meio de buscas manuais e eletrônicas permanentes" e "bloqueio total do sinal telefônico" para evitar que os reclusos continuem cometendo crimes dentro das cadeias.
Em dezembro passado, Castro declarou um "estado de exceção" para enfrentar as gangues violentas, em uma medida semelhante à implementada pelo governo de Nayib Bukele, em El Salvador, há mais de um ano.
Villanueva afirmou que o incidente no presídio feminino é um "ataque ao governo" por causa das "ações empreendidas" contra a criminalidade.
"Diante de uma ação, sempre há uma reação. Ela pode fazer tudo o que for humanamente possível para tentar impedir a entrada dessas armas", mas "pelo contrário, parece que as coisas pioraram", comentou o criminologista Gonzalo Sánchez, em conversa com a AFP.
"Há 30 anos, o crime organizado, o narcotráfico e as gangues MS e 18 têm espalhado o terror. Isso se tornou um monstro de mil cabeças hoje em dia, difícil de combater", acrescentou.
- Triângulo da morte -
Juntamente com seus vizinhos El Salvador e Guatemala, Honduras forma o chamado "triângulo da morte", infestado de gangues que controlam o tráfico de drogas e o crime organizado.
Sánchez lamentou que os "centros penitenciários agora se transformaram em universidades do crime", onde são planejados massacres, assassinatos e sequestros, "com a cumplicidade das autoridades".
No Twitter, o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos em Honduras (OACNUDH) instou o Estado hondurenho "a investigar os fatos, prevenir sua repetição e proteger a vida das pessoas privadas de liberdade".
"O país incorre em responsabilidade internacional quando os direitos humanos das pessoas privadas de liberdade são violados", afirmou a Comissão Nacional de Direitos Humanos (Conadeh) do Estado, também em um tuíte.
"Pelo menos 1.050 pessoas privadas de liberdade perderam a vida violentamente nos centros penitenciários de Honduras desde 2003", denunciou a Conadeh.
A maior tragédia ocorreu em 14 de fevereiro de 2012, quando 362 detentos foram queimados vivos na prisão de Comayagua, cerca de 50 km ao norte da capital.
Honduras é um dos países com maior nível de violência penitenciária no mundo, totalizando mais de mil mortos em duas décadas.