Em poucos dias, o trigo e a soja americanos subiram mais de 20%, enquanto o milho europeu registrou alta superior a 16%.
Na segunda, registrou-se o pico na tendência de alta com a tensão provocada pelo motim na Rússia, que "poderia desestabilizar um grande exportador" de matérias-primas, destacou Damien Vercambre, da Inter-Courtage.
Estes temores foram intensificados pelo fato de Rostov no Don, a cidade tomada pelo grupo paramilitar Wagner, ser próxima aos portos do Mar Negro.
Mas, "afinal, não aconteceu nada", resumiu Gautier Le Molgat, da Agritel, após um acordo que evitou confrontos diretos com o Exército russo. "O mercado esteve um pouco inquieto" na segunda, mas "à noite, já não se falava mais" do assunto, resumiu.
Aliviado, o mercado mudou de rumo, com uma queda do trigo americano superior a 5% na terça-feira, diante da perspectiva de chuva em vários estados-chave do "cinturão do milho", a região cerealista do norte dos Estados Unidos.
Dois episódios de chuva são esperados nas próximas duas semanas depois das precipitações do fim de semana passado, explicou Rich Nelson, da Allendale.
A água também poderia beneficiar a soja. Mas a colheita de trigo está bastante adiantada para lucrar com o clima.
"Na semana passada, a indústria via o tempo seco se estender até julho, (...) mas o panorama mudou", afirmou o analista.
"O clima é importante para o milho, sobretudo em julho, no momento da polinização" no hemisfério norte, explicou Damien Vercambre. "Ainda há tempo".
- Mercado "irritável" -
A queda dos preços também se deve a ajustes de carteira, tomadas de benefícios e menor exposição dos investidores institucionais a um grão antes do fim do semestre, explicou Gautier Le Molgat.
Para Michael Zuzolo, da Global Commodity Analytics and Consulting, o movimento de correção foi tão violento que só pode ser explicado por mudanças de posição dos fundos especulativos, que voltam a apostar em uma queda dos preços.
A volatilidade dos preços, tradicionalmente alta neste período do ano devido ao clima, se acentua, segundo o analista, por operadores oportunistas e 'trading' por meio de algoritmos, o que aumenta as variações do mercado.
"Há uma desconexão entre a situação dos cultivos nos Estados Unidos, os rendimentos, e a evolução dos preços" nas últimas horas, enfatiza Michael Zuzolo.
Na segunda-feira, o Departamento de Agricultura americano (USDA) publicou novas estimativas, que calculam em apenas 50% os cultivos de milho em estado "bom" ou "muito bom", uma clara deterioração em relação à semana anterior (55%).
O panorama é similar para a soja, com 51% contra 54% nos percentuais de qualidade entre uma semana e outra.
Assim, estes primeiros meses de cultivo se anunciam como os piores desde 2012, um ano seco que viu a produção americana de milho cair 13%, na ocasião ao seu nível mais baixo em 16 anos.
"Há interrogações sobre as perspectivas de produção nos Estados Unidos. Isso faz com que o mercado se torne bastante sensível e rapidamente irritável", explica Le Molgat.
Também há dúvidas sobre a demanda, com a economia chinesa debilitada e os bancos centrais ocidentais firmes em suas políticas de juros para combater a inflação, sob o risco de frear o crescimento econômico mundial.
"Os estoques aumentam porque nos demos conta de que a inflação teve um efeito sobre a demanda", acrescenta Vercambre. "Portanto, há estoques de fim de safra mais importantes do que o previsto na França, na Europa", e nos Estados Unidos.
O mercado espera para a sexta-feira um relatório do USDA, que deve fornecer estimativas de estoques.