"Devemos evitar uma escalada. Há um drama, a justiça faz o seu trabalho", declarou a primeira-ministra francesa, Élisabeth Borne, em Garges-lès-Gonesse (ao norte de Paris), onde a sede da prefeitura foi incendiada durante a noite.
Na terça-feira (27), um policial matou com um tiro o jovem Nahel, de 17 anos, quando ele se negou a obedecer as ordens de dois agentes durante uma operação de controle de trânsito em Nanterre, uma localidade ao oeste de Paris.
O Ministério Público afirmou nesta quinta-feira que as condições legais para o uso da arma "não se apresentaram" e pediu a prisão preventiva por homicídio voluntário do policial de 38 anos suspeito de ter atirado contra o jovem. O agente deve comparecer a uma audiência com dois juízes de instrução.
A tragédia provocou um grande movimento de indignação, do presidente Emmanuel Macron ao astro do futebol francês Kylian Mbappé, e a retomada do debate recorrente sobre a violência policial no país. Treze pessoas morreram em circunstâncias similares em 2022.
"Justiça por Nahel" e "Nunca mais", gritaram nesta quinta-feira as centenas de pessoas que participaram de uma passeata em Nanterre convocada pela mãe da vítima.
A tensão é grande nos subúrbios de Paris e os distúrbios se propagaram por toda a França. O ministro do Interior, Gérald Darmanin, anunciou a mobilização de 40.000 policiais e gendarmes nesta quinta-feira, incluindo 5.000 na capital do país.
Na quarta-feira, além de carros - 66 apenas em Estrasburgo (nordeste) -, os manifestantes também incendiaram escolas em várias cidades como Tourcoing (norte), várias delegacias e inclusive sedes de prefeituras, como a de Garges-lès-Gonesse, ao norte de Paris.
"As últimas horas foram marcadas por cenas de violência contra uma delegacia, mas também contra escolas, prefeituras e, portanto, contra as instituições da República (...) São injustificáveis", disse Macron no início de uma reunião de crise.
O balanço da segunda noite de distúrbios foi de 180 detidos e 170 agentes das forças de segurança feridos, de acordo com as autoridades, que enfrentam uma nova onda de protestos violentos este ano, depois das manifestações vinculadas à impopular reforma da Previdência.
- Estado de emergência como em 2005? -
A tragédia provoca a recordação dos distúrbios de 2005 nos subúrbios das grandes cidades, depois que dois adolescentes morreram eletrocutados quando fugiam da polícia em Clichy-sous-Bois, ao noroeste de Paris.
Um vídeo publicado nas redes sociais, cuja autenticidade foi comprovada pela AFP, mostra o momento em que um agente aponta uma arma para o motorista e atira à queima-roupa quando ele acelera com o veículo. Na gravação é possível ouvir a frase: "Você vai levar um tiro na cabeça", mas não fica claro quem a pronuncia.
A fuga do jovem, que tinha ficha na polícia por atos similares, terminou poucos metros à frente, quando o carro bateu contra um poste. A vítima morreu pouco depois de ser atingida por um tiro no tórax.
"Estamos cansados deste tratamento. Isto é por Nahel, nós somos Nahel", gritaram os jovens, que enfrentaram a polícia em alguns momentos durante a noite no subúrbio nordeste de Paris.
Em 2005, o governo do então presidente conservador Jacques Chirac decretou estado de emergência, pela primeira vez na França metropolitana desde o fim da guerra de independência da Argélia. Os dois policiais acusados foram absolvidos em 2015.
O líder da direita Éric Ciotti e a extrema direita pediram o acionamento imediato do estado de emergência, mas fontes do governo destacaram que a medida não é considerada no momento e que nenhum comandante policial solicitou a iniciativa durante a reunião de crise.
O governo enfrenta uma situação delicada, em particular porque as críticas da véspera geraram desconforto entre os sindicatos de policiais. Agora, o Executivo tenta combinar firmeza diante dos distúrbios com um apaziguamento para evitar que o aumento da tensão.