Apesar da mobilização de 40.000 agentes de segurança, novos distúrbios foram registrados em diferentes pontos do país na noite de quinta-feira e a polícia já havia detido 176 pessoas antes da meia-noite (horário local), segundo um balanço do entorno do ministro do Interior.
Na terça-feira, a violência irrompeu nos subúrbios de Paris e se estendeu para outras partes da França depois da morte de Nahel, de 17 anos. O adolescente foi atingido por um disparo à queima-roupa efetuado por um agente durante uma blitz, que ficou registrado em vídeo.
Em um relatório interno, os corpos de segurança previam "uma generalização" da violência nas próximas noites, com "ações voltadas contra as forças da ordem e os símbolos do Estado", disse uma fonte policial.
"Não culpo a polícia, culpo uma pessoa: a que tirou a vida de meu filho", disse ao canal France 5 Mounia, mãe de Nahel, em sua primeira entrevista desde o ocorrido.
Segundo ela, o agente "viu um rosto árabe, um pequeno rapaz, e quis tirar sua vida".
Durante o dia, Mounia liderou uma marcha de protesto em sua cidade, Nanterre, a oeste de Paris, que terminou com confrontos com a polícia, destruição de mobiliário urbano e muito gás lacrimogênio.
Ontem, na segunda noite de distúrbios, delegacias, prefeituras, escolas e carros foram incendiados em várias cidades, com um balanço de 180 detidos e 170 membros das forças de segurança feridos.
O presidente Emmanuel Macron criticou os episódios de violência "injustificáveis" contra "as instituições e a República", e sua primeira-ministra, Élisabeth Borne, fez um apelo para "evitar uma escalada", enquanto "a Justiça faz o seu trabalho".
O governo mobilizou 40 mil policiais e gendarmes na noite desta quinta, e as cidades de Clamart, na região parisiense, e Compiègne, a 70 km da capital, decretaram toque de recolher noturno até segunda-feira.
Ônibus e bondes não vão circular pela região a partir das 21h, anunciaram as autoridades, obrigando milhares de usuários a voltar rapidamente para suas casas.
- O agente pede perdão -
A França vive uma nova onda de protestos este ano, depois das manifestações vinculadas à impopular reforma da Previdência entre janeiro e maio.
O estopim agora foi a morte de Nahel, quando o jovem se negou a obedecer às ordens de dois agentes durante uma blitz de trânsito em Nanterre.
Um vídeo publicado nas redes sociais, cuja autenticidade foi comprovada pela AFP, mostra o momento em que um agente aponta uma arma para o motorista e atira à queima-roupa quando ele acelera com o veículo.
A fuga do jovem, que já havia sido fichado na polícia por atos similares e tampouco tinha idade para dirigir, terminou poucos metros à frente, quando o carro bateu contra um poste. Ele morreu pouco depois pelo disparo no tórax.
Nesta quinta-feira, a Justiça decretou a prisão preventiva por homicídio doloso do policial de 38 anos suspeito de ter atirado no adolescente, segundo o Ministério Público, que considerou que o uso de sua arma não foi legalmente justificável.
Seu advogado garantiu que o agente pediu perdão à família e que estava "extremamente comovido" com a violência do vídeo veiculado com o ocorrido.
"As primeiras palavras que ele pronunciou eram para pedir perdão, e as últimas, para pedir perdão à família", declarou Laurent-Franck Liénard ao canal BFMTV.
"Ele está destruído. Não acorda de manhã para matar gente. Não quis matar", acrescentou.
- 'Sempre os mesmos são atacados' -
O drama gerou indignação generalizada, do presidente Macron ao jogador de futebol Kylian Mbappé, especialmente no momento em que a violência policial é um tema recorrente na França, onde 13 pessoas morreram em situações similares à de Nahel em 2022.
"Sempre os mesmos são atacados, os negros e os árabes, os bairros pobres. Matam um menino de 17 anos assim, sem motivo. Esta morte nos causa muito ódio", declarou à AFP Ayoub, de 16 anos, vestido de preto, durante a marcha em Nanterre.
Na memória coletiva dos franceses ainda estão os tumultos que explodiram em 2005 nas periferias das grandes cidades, depois que dois adolescentes morreram eletrocutados quando fugiam da polícia em Clichy-sous-Bois, nordeste da capital.
O governo do então presidente conservador Jacques Chirac decretou estado de emergência, uma medida que tanto a direita quanto a extrema direita pedem neste momento, mas que, por ora, não está sendo cogitada pelas autoridades.
O governo enfrenta uma situação delicada, em particular porque as críticas feitas ontem geraram mal-estar entre as associações de policiais. Agora, o Executivo tenta combinar firmeza diante dos distúrbios com um apaziguamento para evitar o agravamento da tensão.
PARIS