O prédio medieval, onde o célebre luthier morou entre 1667 e 1680, ganhou vida transformando-se em centro de formação para jovens artesãos e músicos, e local de peregrinação para amantes das quatro cordas.
Estar na casa onde o mestre luthier de Cremona viveu e criou "é mágico. Sinto as vibrações", exclama Fabrizio von Arx, violinista ítalo-suíço de 47 anos, autor do projeto de restauração da Casa Stradivari.
"Entre estas paredes nasceu o mito Stradivarius e começou a brotar sua visão da ressonância perfeita do violino", comenta, durante uma visita.
Depois de um ano e meio de obras, o edifício - onde o luthier morou com a primeira esposa e os seis filhos do casal - reabriu ao público na terça-feira, graças à Fundação Casa Stradivari, criada em 2021 por Von Arx.
Embora as vigas originais da sala de estar do primeiro andar tenham sido restauradas, não há vestígios do ateliê no térreo, transferido para outra casa em Cremona, demolida. Dois bancos de trabalho do luthier foram realocados.
O misterioso "Altana", terraço coberto no sótão - rodeado de paredes grossas de tijolos -, permaneceu intacto e continua alimentando a lenda.
"Ali, ele pendurava seus violinos para secá-los à luz do entardecer. Daí a cor enigmática de seu verniz, entre o vermelho, o marrom e o laranja", relata Von Arx à AFP.
"Com o calor e a umidade que prevalecem em Cremona, a madeira dos violinos trabalha muito e depois se estabiliza", detalha, considerando este um dos segredos do som extraordinário dos Stradivarius.
- Busca pelo som perfeito -
"A fórmula do verniz", escrutada com lupa por incontáveis cientistas, "era a mesma que outros luthiers da cidade usavam", assegura o violinista.
No entanto, "depois do trabalho, passava o tempo na sala de estar com seus amigos músicos para escutar seus violinos e aperfeiçoá-los com sua ajuda", acrescenta.
A obsessão pelo som perfeito também levou Von Arx a adquirir, em 2017, com a ajuda de um mecenas suíço, um Stradivarius de 1720, o Madrileño, por 8 milhões de francos suíços (aproximadamente R$ 27 milhões, na cotação da época).
"Foi amor à primeira vista", confessa o violinista, que inclusive o fez benzer por um cardeal na basílica de São Marcos, em Veneza, renomeando-o de "O anjo".
Dos 1.100 violinos, violoncelos, violas e outros instrumentos de cordas que nasceram no ateliê do luthier, falecido em 1737 aos 93 anos, restam atualmente cerca de 650.
O recorde em um leilão foi batido em 2011, quando um Stradivarius chamado "Lady Blunt" foi arrematado por 15,89 milhões de dólares (aproximadamente R$ 30 milhões, na cotação da época).
A francesa Benedicte Friedmann, de 48 anos, está entre os mais de 180 luthiers radicados em Cremona, cidade de 70.000 habitantes.
"Stradivarius soube levar o instrumento à perfeição acústica e estética. É incomparável", reconhece.
Goivas, tesouras, navalhas, serras e pequenas escovas de madeira se empilham sobre sua mesa de trabalho. Meticulosamente, ela põe o braço no corpo de um violino encomendado por um músico antes de aplicar o verniz e montar o resto.
Violinista de formação, ela testa suas criações depois de montadas, depois de um mês e meio de trabalho, e continua usando as mesmas técnicas de 300 ou 400 anos atrás. "O que mudou foram as ferramentas, mais modernas", explica.
Quanto aos segredos de Stradivarius, ela confirma que "o verniz é muito importante do ponto de vista acústico, porque se for duro demais, impede que o violino vibre".
Para Fausto Cacciatori, curador do museu do violino de Cremona, "o segredo são as habilidades extraordinárias de Stradivari. O mestre nunca deixou de experimentar, buscando o som perfeito", ressalta.