"Olhem, aqui sua dirigente. Que exemplo é esse para nossas filhas?", comentou uma internauta na imagem publicada nas redes sociais.
Kengo sabe qual foi a intenção desta divulgação: forçá-la a renunciar ao cargo em uma das regiões mais conservadoras do país.
Este tipo de ataque não é incomum na África, indicam especialistas à AFP.
Muitas mulheres que desejam entrar para a política enfrentam campanhas de desinformação online para dissuadi-las de se apresentarem às eleições ou desacreditá-las perante os eleitores.
Para resistir a estas pressões, é preciso ter "casca grossa", afirma a política queniana de 35 anos, que formou uma equipe para responder às campanhas de difamação nas redes sociais.
"A política sempre foi um mundo dominado por homens e para entrar nela é preciso ser muito agressiva", explica.
E para uma mulher, exercê-la é delicado. "Se for agressiva na forma de abordar os problemas, as pessoas dizem que é exagerada e linguaruda", afirma.
"Não é assim com nossos homólogos masculinos".
- "Medo" -
"Os ataques sexualizados são muito agressivos e buscam claramente minar a qualificação delas" para o cargo, explica Kristina Wilfore, cofundadora da ONG #ShePersisted (Ela persistiu), que combate a desinformação sexista e abusos online.
Um estudo com a participação de sua organização demonstrou que durante as eleições gerais do Quênia de 2022, as redes sociais permitiram "um discurso de ódio sobre as mulheres", disse Wilfore.
E embora sejam verificadas e corrigidas, as informações falsas "sempre deixam a sensação de que as mulheres não têm espaço em alguns locais públicos", lamenta.
No continente africano, elas ocupam apenas 24% dos 12.100 postos parlamentares, segundo um estudo de 2021 do projeto pan-africano "Women in political participation" (A participação política das mulheres, em tradução livre).
No Quênia, embora a Constituição determine que ao menos um terço das cadeiras da Assembleia Nacional seja ocupado por mulheres, esta cota não é preenchida.
- Nudez e fitas de sexo -
Em Ruanda, a empresária e opositora Diane Rwigara se deparou com supostas imagens suas nua na internet dias após anunciar sua candidatura às presidenciais de 2017. Mais tarde, declarou à CNN que essas imagens foram manipuladas e parte de uma campanha para que não desafiasse o presidente Paul Kagame, no poder desde o ano 2000.
Sua candidatura foi posteriormente recusada devido a supostas falsificações em sua solicitação. Em 2018, um tribunal a absolveu das acusações "infundadas".
Em abril, a ex-senadora queniana Millicent Omanga enfrentou pedidos de demissão de seu cargo de ministra adjunta após a divulgação de vídeos de uma suposta fita sexual. A AFP rastreou a origem de um destes vídeos e chegou à conta de uma atriz amadora de filmes adultos. Omanga nunca comentou publicamente o assunto e não respondeu ao contato da AFP.
Vários especialistas advertem que estas acusações, especialmente as de conotação sexual, podem se tornar mais frequentes com a ascensão da Inteligência Artificial.
Em 2019, o aplicativo DeepNude, que deixa mulheres virtualmente nuas, foi desativado diante de possíveis abusos.
"As redes sociais têm a principal responsabilidade de garantir que os espaços online não sejam usados (...) com o objetivo de causar dano", estima Leah Kimathi da ONG Conselho Queniano para as Redes Sociais Responsáveis.
"As plataformas investem muito menos em segurança na África em comparação com o resto do mundo", acrescenta.