Retoricamente, Teerã chegou à frente desde o primeiro dia da guerra, defendendo a causa do Hamas, o movimento islamista palestino que apoia há anos.
Depois de aplaudir "o sucesso" do ataque sem precedentes do Hamas, lançado em 7 de outubro contra Israel, suas autoridades mencionam a guerra em cada uma das suas intervenções públicas.
Mas, para além das palavras, a estratégia do Irã é decidida nas sombras, para deixar que os seus adversários declarados - Israel e Estados Unidos - e a comunidade internacional tentem adivinhar as suas verdadeiras intenções.
Em Teerã e no exterior, os especialistas acreditam que o governo está aberto a se adaptar aos desenvolvimentos da guerra, que se intensificou no sábado (28) em Gaza, com bombardeios e confrontos terrestres entre combatentes do Hamas e soldados israelenses.
Neste momento, "o Irã não está interessado em se envolver diretamente na guerra", disse Hadi Mohammadi, pesquisador de política internacional em Teerã.
"Os iranianos deixaram claro desde o início que não procuram envolvimento direto ou confronto", diz a iraniana Sara Bazoobandi, do Instituto Giga de Estudos do Oriente Médio, com sede na Alemanha.
"O Irã continua enviando alertas sobre uma possível reação do Hezbollah (libanês) e de outros grupos do que chama de 'frente de resistência'", acrescenta. Embora seja necessário ter "cuidado" na forma como os formula, porque os riscos podem "ser altos".
Neste domingo, o presidente iraniano, Ebrahim Raïssi, acusou Israel de ter ultrapassado as "linhas vermelhas" ao intensificar a sua ofensiva contra o Hamas em Gaza, o que "poderia pressionar" outras partes "a agir".
"O Irã considera que é seu dever" apoiar "o eixo de resistência", que inclui grupos armados como o Hamas e o Hezbollah libanês, acrescentou em entrevista à Al Jazeera. Afirmou ainda que estes grupos são "independentes nas suas opiniões, decisões e ações".
- "O custo pode ser alto" -
Estas declarações públicas destinam-se a contrariar as acusações de Washington, que culpa o Irã pelos ataques que atingiram tropas americanas na Síria e no Iraque nos últimos dias e feriram cerca de vinte soldados americanos.
A Casa Branca afirmou que o Irã "facilita ativamente" estes ataques e, segundo o Pentágono, as organizações "que realizam estes ataques são apoiadas pela Guarda Revolucionária".
O presidente Joe Biden enviou "uma mensagem direta" ao líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, para alertá-lo contra quaisquer novos ataques por parte destes grupos.
Segundo a especialista Sara Bazoobandi, um dos objetivos estratégicos básicos de Teerã é "manter o conflito longe das suas fronteiras".
Mas "para defender a sua posição na região, terá de apoiar os grupos que aderem a ele durante esta crise". "O custo pode ser alto", acredita, enquanto os Estados Unidos reforçam a sua presença militar no Oriente Médio.
O Irã só participará diretamente "se Israel atacar o território iraniano ou se os seus interesses estratégicos forem ameaçados em outros países", afirma Hadi Mohammadi.
O comentarista político Abbas Aslani destaca ainda que é impossível, neste momento, "prever o que vai acontecer". Mas "o Irã terá de reagir de uma forma ou de outra se o conflito for regionalizado ou se os seus interesses forem atacados por outras partes".
"Qualquer ato imprudente contra o Irã provocará uma forte reação", alertou o ministro da Defesa, Mohammad Reza Ashtiani, antes de uma série de manobras militares serem realizadas no país nos últimos dias.
Enquanto isso, os especialistas salientam que Teerã já alcançou vários objetivos, como travar o processo de normalização das relações entre a Arábia Saudita e Israel, sob os auspícios dos Estados Unidos. Outras capitais árabes também se distanciaram de Israel.
Para Bazoobandi, o Irã também considera que o ataque surpresa de 7 de outubro em Israel "humilhou os serviços de segurança israelenses", que não conseguiram impedi-lo. "Imagino que para Teerã esta humilhação pública possa ser suficiente, sem que seja necessária uma escalada".