"A Guiana apresentou à Secretaria da Corte Internacional de Justiça um pedido de indicação de medidas provisórias" para solicitar que a Venezuela "não prossiga com o referendo consultivo como está planejado", conforme comunicado do tribunal da ONU divulgado nesta terça-feira (31).
Horas depois, a Guiana informou, por meio de nota, que o pedido responde a um "plano sinistro da Venezuela de se apoderar do território guianense", enquanto Caracas qualificou a ação de "barbárie".
"O que a Guiana pediu é um absurdo, pedir à Venezuela que revogue sua ordem constitucional, o que não vai acontecer", declarou a vice-presidente venezuelana, Delcy Rodríguez, em uma declaração à imprensa. "Isso que aconteceu (...) se não fosse tão trágico, seria risível".
- "Urgência" -
A Venezuela convocou um referendo consultivo para 3 de dezembro sobre o Essequibo, que propõe a criação de um estado (província) nesta região e nacionalizar seus habitantes.
A Guiana pediu à CIJ, "pela urgência do assunto", que marque uma audiência antes da data desta consulta para tomar uma posição.
"É uma situação inédita, onde um país se autoatribui ser a Constituição da República Bolivariana da Venezuela", criticou Rodríguez. E "agora pede a um organismo internacional (...) para anular a Constituição (...), é uma grosseria".
O Essequibo, com 160.000 km², rico em minerais e em biodiversidade, é administrado pela Guiana, que se ampara em um laudo assinado em 1899, em Paris, fixando limites que a Venezuela rejeita.
O Acordo de Genebra, assinado pela Venezuela em 1966 com o Reino Unido antes da independência da Guiana, estabeleceu as bases para uma solução negociada, desconhecendo o documento anterior.
A CIJ decidiu em 2020 que tinha jurisdição para analisar a disputa, apesar da objeção da Venezuela, que acabou participando do processo.
A queda de braço foi reavivada em 2015, após a descoberta de jazidas petroleiras por parte da americana ExxonMobil, da qual a Venezuela diz que a Guiana é "lacaia".
A relação está em um momento de alta tensão depois que a Guiana concedeu licenças para exploração de petróleo em águas disputadas. E, em meio a acaloradas trocas de farpas, Rodríguez acusou Georgetown de "agredir" os migrantes venezuelanos que chegam ao território.
O presidente Nicolás Maduro disse nesta terça-feira que a Venezuela não reconhece as licenças outorgadas pela Guiana.
"A todas as empresas que pretendem entrar em águas venezuelanas de maneira ilegal ou em águas não delimitadas, a Venezuela dará uma resposta legal (...) A Venezuela não reconhece nenhuma licença de Guiana em suas águas a delimitar ou em suas águas delimitadas", indicou o mandatário durante uma reunião com seu gabinete.
- O pedido -
A Venezuela argumenta que Essequibo pertence a Caracas porque fazia parte da Capitania Geral da Venezuela do Império Espanhol e que os limites na América do Sul foram estabelecidos sob o princípio "utis possidetis iuris", que implica que eles têm direito ao território que tinham durante a colônia.
O referendo consultivo, não vinculativo, consiste em cinco perguntas, que também abrangem o apoio e a rejeição de ambos os laudos, e consulta também sobre o não reconhecimento da jurisdição da CIJ, apesar de a Venezuela acabar aceitando-a.
A Guiana pediu à CIJ que a Venezuela suspenda as perguntas um, relacionada à validade do Acordo de Genebra; três, sobre a rejeição à jurisprudência do tribunal mundial; e cinco, sobre a anexação de Essequibo.
"A Venezuela não deve tomar nenhuma ação que tenha por objeto preparar ou permitir o exercício de soberania ou controle de fato sobre qualquer território que tenha sido concedido à Guiana Britânica no Laudo Arbitral de 1899", reafirmou o pedido.
A Venezuela anunciou a construção de uma pista de pouso perto da fronteira com Essequibo e tem insistido que responderá a qualquer tipo de agressão.
"Senhor presidente da Guiana, você está mexendo com uma nação de libertadores!", expressou o presidente Nicolás Maduro na véspera. "Sabemos defender o que é nosso!".