Jornal Estado de Minas

Coronavírus: 10 gráficos para entender a situação atual do Brasil na pandemia

(foto: BBC)

Em 12 de maio, o Brasil registrou 9,3 mil novos casos de covid-19, totalizando 177 mil notificações e 12,4 mil mortes. Mas o que esses e outros dados significam e revelam sobre a realidade da doença no Brasil? E como eles se comparam a outros países?

A BBC News Brasil reuniu dez dos principais indicadores para explicar qual é a situação atual do país na pandemia, apesar da escassez de testes laboratoriais que serviriam para um retrato mais fiel da realidade — especialistas usam expressões como "apagão de dados" e "voo cego".



Atualmente, quase não há mais leitos de UTI no sistema público de saúde de parte dos Estados, os casos e as mortes estão aumentando — mas a uma velocidade que tem caído ou se mantido constante —, há cada vez mais cidades pequenas atingidas e as pessoas têm respeitado menos o distanciamento social.

Veja abaixo.

1. Brasil é o sétimo país em número de casos, mas o décimo per capita

O primeiro caso de coronavírus no Brasil foi divulgado pelo governo federal em 26 de fevereiro. O paciente havia viajado a trabalho para a Itália, mas naquela época não se sabia que o vírus já circulava com força no país europeu.

Desde então, o volume de novos casos registrados tem crescido exponencialmente, mas a uma velocidade que tem caído nos últimos dias ou se mantido constante.

Em 12 de abril, registrou 1.388 novos casos em 24h. Em 12 de maio, foram 9.258.

Isso é muito ou pouco comparado com outros países? Bem, qualquer comparação internacional esbarra em limitações. Uma delas é que cada lugar do mundo está em uma fase particular da pandemia.



Então, em vez olharmos para os países num mesmo calendário, podemos evitar algumas distorções e compará-los, por exemplo, a partir do dia em que o 100º caso foi registrado em cada nação. Nesse estágio, o vírus já está circulando entre os cidadãos.

No gráfico abaixo, em escala logarítmica, o eixo vertical traz o número de casos e o eixo horizontal trata do número de dias a partir do centésimo caso. Essa escala permite ver com mais facilidade a progressão de casos.

Quanto mais vertical estiver a linha de casos diários, mais rápido a pandemia está avançando. Atualmente, o número de casos dobra no Brasil a cada 5 dias, a terceira pior taxa do mundo. Mas no início, quando o número de casos era menor e não havia medidas como quarentenas, isso acontecia a cada dois, três dias.

A uma taxa de contágio de 1.1, o número de casos passa de 0 a 25 mil em 13 semanas. Em 1, é metade disso (foto: BBC)

Segundo o físico Roberto Kraenkel, professor da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) e membro do Observatório Covid-19 (iniciativa independente de 43 pesquisadores do país), a taxa de contágio brasileira estava próxima de 3 no início da pandemia no país. Ou seja, cada pessoa infectada transmitia a doença para outras 3.



Atualmente, Kraenkel estima que essa taxa transite de 1 até 1.1. Para ele, isso significa que as medidas adotadas têm funcionado, mas não o suficiente para manter o número abaixo de 1, patamar que indica o recuo da pandemia. Numa taxa de 0.5, por exemplo, 10 infectados transmitem a doença para 5 pessoas.

Manter-se abaixo do patamar de 1 é a condição que a Alemanha adotou, por exemplo, para flexibilizar as medidas de distanciamento social. Caso alguma região volte a ter esse índice acima de 1, a quarentena será adotada novamente.

O gráfico abaixo explica a relação entre taxa de contágio e o crescimento absoluto do número de casos.

Gráfico da Fiocruz mostra a quantos dias o número de casos dobra no país (foto: Monitora Covid-19 Fiocruz)

O país que mais rápido adotou esse tipo de medida de distanciamento foi a China, com uma quarentena rigorosa no epicentro da pandemia, a província de Hubei, poucos dias depois que os casos passaram de cem. O confinamento da Itália inteira levou duas semanas desde o centésimo caso.



No 30º dia nessa trajetória do gráfico, que mede o avanço da doença a partir do 100º caso, as notificações cresciam aceleradamente nos EUA e de forma menos rápida no Brasil. A China já havia conseguido conter o avanço da doença e a Itália começava controlar a situação. EUA e Brasil não adotaram quarentenas nacionais, mas apenas em cidades ou Estados isolados.

Cinquenta dias depois do 100º caso, os EUA e a Itália indicam ter estabilizado a pandemia. A China praticamente não registra mais novos casos.

A trajetória do Brasil ainda aponta para cima, ou seja, o número de casos ainda cresce. Mas isso é só uma tendência e pode melhorar ou piorar a depender do que acontecer no Brasil.

Sobrecarga do sistema de saúde pode levar ao aumento da taxa de mortalidade da doença (foto: EPA)

Só que para entender mais precisamente o que está acontecendo, seria preciso testar a população em massa para saber quem está infectado.

O Brasil, no entanto, tem enfrentado uma série de dificuldades para ampliar sua capacidade de realização de testes, como problemas de gestão e demanda maior que a capacidade de análise dos laboratórios.



Outro problema é que o Ministério da Saúde não sabe informar direito quantos testes foram realizados ao todo no país.

Até 20 de abril, segundo a pasta, somente a rede brasileira de saúde pública havia realizado 132 mil testes. Ao todo. Nesse mesmo 20 de abril, os Estados Unidos realizaram 147 mil de testes em 24h, acumulando 4 milhões.

Se compararmos levando em conta o tamanho da população, o Brasil apresentava em 20 de abril uma taxa de 0,63 teste a cada mil habitantes. Os EUA, 12,2.

Mas afinal, sem testes suficientes, como calcular quantas pessoas estão infectadas no Brasil e não desenvolveram sintomas ou não ficaram doentes a ponto de ir para o hospital?

Há estudos em andamento para tentar responder isso. Um deles é coordenado pela Universidade Federal de Pelotas e está na segunda fase. Foram escolhidas por amostragem e testadas 4,5 mil pessoas em nove cidades.

Segundo os pesquisadores, para cada caso conhecido, há 12 não notificados.

2. Brasil tem menor taxa de mortes por 100 mil habitantes entre os 10 países mais atingidos

Ao longo da pandemia, o coronavírus matou ao menos 12,4 mil pessoas no Brasil (até 12/05). "Ao menos" porque especialistas afirmam que a identificação da causa da morte também padece de subnotificação, mas em menor grau.



A primeira delas a ser divulgada oficialmente se deu em 17 de março. O homem de 62 anos, que estava internado no hospital Sancta Maggiore, em São Paulo, morreu seis dias depois de surgirem os primeiros sintomas. Ele tinha diabetes e hipertensão, duas doenças pré-existentes que são consideradas fatores de risco para quem contrai o novo coronavírus.

Na última semana, morreram 3.877 pessoas. O auge diário até agora se deu em 12 de maio, com 881 mortes.

Os Estados Unidos são o país com maior número absoluto de mortes na atual pandemia, e o Brasil aparece em sétimo nessa comparação.

Se for levado em conta o tamanho da população, o Brasil aparece em último na lista de dez países mais afetados pela pandemia elaborada pela universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos.

O Brasil tem 3,5 mortes por 100 mil habitantes em lista liderada pela Bélgica, com 69,3.

A Johns Hopkins também analisa a chamada taxa de mortalidade, razão entre número de mortes por total de infectados. Segundo a universidade americana, essa comparação internacional enfrenta diversas distorções. Essa taxa tende a ser menor em países que fazem mais testes na população e tende a ser maior quando há sobrecarga do sistema de saúde.



O Brasil aparece em sétimo, com 7 mortes a cada 100 infectados. A Itália aparece em quarto, com 14 mortes a cada 100 infectados. Os EUA, em nono, tem 6 mortos a cada 100 infectados.

Essa taxa também varia bastante de um Estado para outro no Brasil. De 10,4% no Rio de Janeiro a 1,7% em Tocantins, segundo dados de 12 de maio.

Para além dos problemas de falta de testes e subnotificação, especialistas estimam que a taxa real de mortalidade da covid-19 seja algo entre 1% e 3%.

O número crescente de mortes em casa, que aumentou durante a pandemia, é outro indício de subnotificação. O total de mortes em casa cresceu em média 10,4% no país entre 16 de março e 30 de abril, conforme dados divulgados pelos cartórios.

Foram 27.217 óbitos no ambiente domiciliar, o que representa 20,1% do total de registros de óbitos feitos pelos Cartórios de Registro Civil desde a primeira morte por covid-19 (16 de março), de acordo com os números do Portal da Transparência do Registro Civil.



3. Doença mata mais idosos, pessoas com doenças cardíacas e negros

O Ministério da Saúde brasileiro divulgou uma análise sobre 1.985 mortes ocorridas no país. Os dados indicam algo semelhante ao que se viu em outros países. Por exemplo, a incidência maior entre homens. No Brasil, eles são 48% da população, mas são 60% dos pacientes que morreram com covid-19.

Um desequilíbrio também é visto na idade das vítimas. Os brasileiros com até 19 anos são 14% da população, mas representam menos de 1% das pessoas que morreram de covid-19.

Já as pessoas com mais 60 anos são 13% da população e 72% dos mortos.

Há outro ponto a ser citado que é a presença de doenças pré-existentes ou comorbidades em 70% dos mortos. Dessas pessoas, 46% tinham cardiopatia, 35% tinha diabetes e 9%, pneumopatia.

Os dados do Ministério da Saúde também mostram disparidade de raça ou cor de pele. Os negros são quase 1 em cada 4 hospitalizados, mas 1 em cada 3 mortos. Especialistas dizem que isso pode indicar desigualdade de acesso à saúde, mas isso ainda está sob estudo.



4. Ocupação de leitos UTI passa de 90% em 5 Estados

E nem todo mundo que contrai o novo coronavírus é internado ou morre. Em geral, a cada 100 infectados, 83 se recuperam, 15 precisam ser internados e 2 morrem.

Em 19 de abril, manifestantes protestaram em Manaus contra medidas de isolamento social do governo estadual do Amazonas (foto: Reuters)

Mas esses números variam conforme o lugar e a fase da pandemia.

E eles podem piorar se muita gente ficar doente ao mesmo tempo e sobrecarregar o sistema de saúde. Para se ter uma ideia, pesquisadores dizem que se São Paulo não tivesse adotado nenhuma medida de contenção, os leitos de UTI estariam lotados desde o dia 31 de março.

Isso é importante porque, embora não exista tratamento ou vacina contra o coronavírus, uma vida pode ser salva graças a um leito de unidade de terapia intensiva (ou UTI) com um respirador, que fornece oxigênio e trabalha como uma bomba.

Se formos comparar com outros países, o Brasil é um dos que tem mais leitos de UTI por habitante no mundo, muito por causa de outras epidemias que enfrentamos, como a violência e os acidentes de trânsito.



A OMS recomenda de 10 a 30 leitos de UTI para cada 100 mil habitantes. O Brasil tem cerca de 20. Mas essa taxa varia conforme a região, e a do Sudeste é o triplo da do Norte, por exemplo.

São quase 50 mil, metade na rede privada, metade na pública. Mas, como 7 em cada 10 brasileiros dependem do SUS, a demanda pelos leitos públicos é bem maior.

E quantos leitos estão ocupados por pacientes com covid-19? O governo brasileiro não sabe, mas está fazendo um censo desde meados de abril para tentar descobrir.

Bem diferente é a situação na Alemanha onde qualquer pessoa pode verificar em um site a taxa de ocupação em hospitais de todo país.

Um indicador importante para entender o que está acontecendo é o número de hospitalizações por síndrome respiratória aguda grave (SRAG), que é o quadro de saúde de um paciente hospitalizado por ter sido acometido pela covid-19 ou pela gripe, por exemplo. Neste ano, o número está 10 vezes maior.



Mas também dá para entender a situação a partir de dados divulgados pelos Estados sobre a ocupação de leitos UTI da rede pública.

Em 10 de maio, no Piauí, a taxa de ocupação dos leitos UTI para covid-19 era de 43%. No Espírito Santo, 63%. Em São Paulo, 69%. No Ceará, em Roraima, no Maranhão, em Pernambuco e no Rio de Janeiro, passa de 90%.

5. Doença já atinge todas cidades médias e grandes e agora avança pelo interior

Não se sabe a data exata em que o novo coronavírus desembarcou no Brasil, mas o primeiro caso da covid-19, a doença causada por ele, foi registrado em São Paulo no dia 26 de fevereiro.

A partir dali, o vírus começou a se espalhar pelo país, primeiro pelas rotas aéreas entre as capitais e os principais centros urbanos, depois pelas rodovias, que interligam as cidades brasileiras.

No dia 28 de março, havia casos registrados em 100% dos municípios com mais de 500 mil habitantes, em 42% dos municípios com população entre 100 mil e 500 mil pessoas e 15% dos que têm entre 50 mil e 100 mil habitantes.



No dia 28 de abril, havia casos registrados em todos dos municípios com mais de 100 mil habitantes e 86% dos que têm entre 50 mil e 100 mil habitantes.

Nos municípios pequenos, o primeiro caso surgiu em 14 de março. Desde então, 13% das cidades com menos de 10 mil habitantes registraram casos.

Os dados são do MonitoraCovid-19, um sistema criado, em 30 de março, por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

6. Adesão dos brasileiros ao isolamento social está em trajetória de queda

Sem vacina e remédios com eficácia comprovada, a principal estratégia que tem sido adotada ao redor do mundo para conter o avanço da covid-19 é o distanciamento social.

A intensidade varia conforme o governante, a gravidade da situação e a capacidade de realizar testes em massa.

No topo está o confinamento total e compulsório adotado pelo governo da Itália. Todo mundo foi proibido de sair de casa, exceto para ir ao mercado ou à farmácia, por exemplo. No lado oposto está o governo da Coreia do Sul, que não adotou confinamentos em massa, mas o isolamento apenas das pessoas que estavam doentes e o monitoramento de quem teve contato com elas.



(foto: BBC)

No Brasil, não houve quarentena nacional. O presidente Jair Bolsonaro avalia que uma medida do tipo tem um impacto socioeconômico mais devastador do que a doença em si, e compara o confinamento a um remédio que acaba matando o paciente.

O Distrito Federal foi a primeira unidade da federação a adotar algum tipo de restrição à circulação das pessoas, em 11 de março.

Só que um confinamento não obrigatório demanda que autoridades e especialistas façam recomendações e pedidos frequentes para aumentar ou manter a adesão das pessoas ao distanciamento social.

Muita gente, porém, continua a sair para trabalhar, principalmente os trabalhadores informais.

A principal maneira de medir essa mobilização é por meio da localização dos celulares. A empresa de tecnologia In Loco monitora a localização de 60 milhões de pessoas no Brasil (sem identificá-las) e elaborou um índice de isolamento social, divulgado diariamente.



O índice está abaixo do recomendável para evitar o alastramento da doença, e a tendência é de queda no país.

São Paulo, por exemplo, tem uma meta de 70% de isolamento, mas não passou de 62,5% e agora gira em torno de 43,6%.

Dos 5 Estados que mais aderem ao isolamento, 3 são da região Norte e 2 do Nordeste. Durante a pandemia, o número de mortes na capital de Amazonas, Manaus, quadruplicou em relação ao mesmo período no ano passado.

Por outro lado, dos 5 Estados que menos aderem, 3 são do Centro-Oeste. Segundo um levantamento do Google, também a partir de dados de celular, o movimento em áreas de lazer e comércio (exceto mercados e farmácias) em Goiás caiu 33%. No Amazonas, esse mesmo segmento recuou 50%.


(foto: BBC)