A Agência Nacional de Vigilância Sanitária incluiu nesta quinta-feira (23/07) a ivermectina na categoria de medicamentos submetidos a um controle especial.
Houve um salto da procura pelo medicamento como um suposto tratamento ou método de prevenção para covid-19, apesar de não haver evidências científicas de que ele é eficaz para esses fins, e a agência mudou as regras para sua compra nas farmácias por causa disso.
Em vez de uma receita simples, o consumidor deverá ter agora em mãos uma receita branca especial em duas vias, das quais uma ficará retida na farmácia. Cada receita terá validade de 30 dias, a partir da data de emissão, e poderá ser usada uma única vez.
O objetivo deste tipo de medida é garantir que os estoques que existem no mercado não se esgotem, ao combater a venda indiscriminada de remédios que têm sido divulgados para tratamento ou uso profilático para covid-19, sem que haja estudos que apontem que eles têm de fato esses efeitos.
Em março, a Anvisa fez o mesmo com a cloroquina e hidroxicloroquina, também por causa do aumento da procura nas farmácias.
Em abril, foi a vez do antiparasitário nitazoxanida, vendido no Brasil sob a marca Anitta, após o Ministério da Ciência anunciar que iria testá-lo como tratamento para covid-19.
A mudança do regime de controle da venda da ivermectina foi anunciada com a publicação de resolução nesta quinta-feira no Diário Oficial da União.
"Isso é para garantir que o medicamento não falte para que as pessoas que precisam dele sob prescrição médica. Será mais fácil achá-lo na drogaria, ao evitar possíveis desabastecimentos", disse Marcus Miranda, diretor da Anvisa.
Ivermectina é a 'nova cloroquina'
A ivermectina é comercializada desde o início dos anos 1980 para combater verminoses e parasitas, como piolhos, pulgas e carrapatos, em animais e seres humanos.
O medicamento atua no sistema nervoso central dos vermes e parasitas, provocando paralisia, e costuma ser usado em dose única.
Como a BBC News Brasil mostrou, a procura pela ivermectina aumentou bastante nos últimos meses, em especial desde o início de junho.
"A ivermectina é hoje o que a cloroquina era em março. As pessoas se convenceram de que ela pode ter algum efeito (contra a covid-19) e foram atrás de forma descontrolada", diz a infectologista Raquel Stucchi, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O Google aponta a ivermectina é o medicamento em teste contra a covid-19 mais buscado no Brasil hoje. Entre maio e julho, a ivermectina foi três vezes mais buscada do que a cloroquina.
De acordo com a empresa, o país é o terceiro país do mundo com mais interesse pela droga, atrás apenas da Bolívia e do Peru, onde a ivermectina tem sido usada no tratamento da covid-19, mesmo sem comprovação científica da sua eficácia.
Em algumas farmácias, ele chegou a sumir das prateleiras. E as fabricantes reforçaram a produção para dar conta da demanda.
Várias cidades estão distribuindo ivermectina em massa para a população como supostos tratamento ou prevenção da covid-19.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) fez menções à ivermectina como um suposto tratamento para a infecção pelo novo coronavírus, e muitas mensagens circularam no WhatsApp recomendando seu uso "para prevenir o contágio".
Além disso, alguns médicos vêm recomendando, nos consultórios e na internet, que as pessoas a tomem para evitar ou tratar a covid-19.
O que diz a ciência?
O interesse aumentou após a publicação de um estudo que concluiu em testes em laboratório que o antiparasitário pode neutralizar as propriedades infecciosas do vírus em 48 horas.
Mas trata-se apenas de uma análise preliminar, na qual a substância foi testada em uma cultura de células, e ainda há outros passos fundamentais até que seja possível verificar se esse efeito também ocorre em pessoas.
Um bom resultado nesta etapa está longe de garantir a eficácia contra o vírus. Além disso, a dose testada no estudo, se usada como medicamento, poderia gerar sérios danos à saúde.
"Não há nenhuma evidência científica de que funciona, zero, nada", reforça Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e diretor médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
"O que teve foi esse teste in vitro que mostrou que a ivermectina pode ter uma atividade antiviral, mas a dose necessária para isso também mata as células do organismo. Então, precisaríamos de uma hiperdose, que seria tóxica para nós, para ela funcionar."
À BBC News Brasil, o Ministério da Saúde disse que "não há orientação de uso de Ivermectina para o tratamento da covid-19".
A pasta afirmou ainda que "até o momento, não há nenhum medicamento, substância, vitamina, alimento específico ou vacina que possa prevenir a infecção pelo coronavírus ou ser utilizado com 100% de eficácia no tratamento".
- Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!