Vamos começar dizendo que o universo é grande. Estima-se que, se olharmos em qualquer direção, suas regiões visíveis mais distantes estão a cerca de 46 bilhões de anos-luz de distância.
Isso significa ter um diâmetro de 540 sextilhões de milhas (ou 54 seguido por 22 zeros).
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Mas este é, na verdade, nosso melhor palpite: ninguém sabe exatamente o quão grande o universo realmente é.
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Mas, como tampouco sabemos sua idade precisa, é difícil determinar até que ponto ele se estende além dos limites do que podemos ver.
No entanto, os astrônomos tentaram usar uma propriedade para descobrir, um número conhecido como constante de Hubble.
"É uma medida de quão rápido o universo está se expandindo agora", diz Wendy Freedman, astrofísica da Universidade de Chicago, nos EUA, que dedica sua carreira a fazer estas medições.
"A constante de Hubble estabelece a dimensão do universo, tanto seu tamanho quanto sua idade", acrescenta.
Pense no universo como um balão que infla.
À medida que as estrelas e galáxias, pontos na superfície de um balão, se separam mais rapidamente, maior é a distância entre elas.
Da nossa perspectiva, isso significa que quanto mais longe uma galáxia está de nós, mais rápido ela se afasta.
Infelizmente, quanto mais os astrônomos calculam esse número, mais ele parece desafiar as previsões baseadas em nossa compreensão do universo.
Um método de medir diretamente nos dá um certo valor, enquanto outra medição, que se baseia na nossa compreensão de outros parâmetros sobre o universo, diz algo diferente.
Ou as medidas estão incorretas ou há algo de errado na maneira como pensamos que nosso universo funciona.
Mas os cientistas acreditam que agora estão mais perto de encontrar uma resposta, graças em grande parte a novos experimentos e observações destinadas a descobrir o que é exatamente a constante de Hubble.
"O que enfrentamos como cosmologistas é um desafio de engenharia: como medimos essa quantidade da forma mais precisa e exata possível?", afirma Rachael Beaton, astrônoma que trabalha na Universidade de Princeton, nos EUA.
Para enfrentar este desafio, diz ela, não só é preciso obter os dados para poder medir, como também verificar as medidas de todas as maneiras possíveis.
"Da minha perspectiva como cientista, isso é mais como montar um quebra-cabeça do que estar dentro de um mistério no estilo Agatha Christie."
A primeira medição da constante de Hubble, feita em 1929 pelo astrônomo Edwin Hubble, que deu nome a ela, foi de 500 km por segundo por megaparsec (km/s/Mpc).
O megaparsec é uma unidade de distância usada em astronomia equivalente a 3,26 milhões de anos-luz.
O valor calculado pelo cientista indica que para cada megaparsec mais longe da Terra que você olha, as galáxias que você vê estão se afastando de nós 500 km/s mais rápido do que aquelas que estão a um megaparsec mais perto.
Mais de um século após a primeira estimativa de Hubble da taxa de expansão cósmica, esse número foi revisto várias vezes.
As estimativas de hoje variam entre 67 e 74 km/s/Mpc.
Parte do problema é que a constante de Hubble pode ser diferente dependendo de como é medida.
A maioria das descrições da discrepância da constante de Hubble diz que há duas maneiras de medir seu valor.
Uma delas observa a velocidade com que as galáxias próximas estão se afastando de nós, enquanto a segunda usa a radiação cósmica de fundo em micro-ondas (CMB, na sigla em inglês) — vestígios de luz do Big Bang.
Ainda podemos ver essa luz hoje, mas como as partes distantes do universo estão se afastando de nós, a luz se estendeu em ondas de rádio.
Esses sinais de rádio, descobertos por acidente na década de 1960, nos dão uma ideia de como era o universo nos tempos mais remotos.
Duas forças concorrentes, a atração da gravidade e a pressão para fora da radiação, fizeram um cabo de guerra cósmico com o universo em sua infância.
Isso criou distúrbios que ainda podem ser vistos na radiação cósmica de fundo em micro-ondas como pequenas diferenças de temperatura.
Usando essas perturbações, é possível medir quão rápido o universo estava se expandindo logo após o Big Bang — e isso pode ser aplicado ao Modelo Padrão de Cosmologia para deduzir a taxa atual de expansão.
Este Modelo Padrão é uma das melhores explicações que temos de como o Universo começou, do que ele é feito e o que vemos ao nosso redor hoje.
Mas há um problema.
Quando os astrônomos tentam medir a constante de Hubble observando como as galáxias próximas estão se afastando de nós, eles obtêm um valor diferente.
"Se o Modelo está correto, então você imaginaria que os dois valores, o que você mede hoje localmente e o valor que você deduz das primeiras observações, estariam alinhados", diz Freedman.
"E não estão."
Quando o satélite Planck da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês) mediu as discrepâncias na CMB, primeiro em 2014 e depois novamente em 2018, o valor obtido para a constante de Hubble foi de 67,4 km/s/Mpc.
Mas esse número é cerca de 9% menor do que o valor que astrônomos como Freedman mediram ao observar galáxias próximas.
Outras medições da CMB em 2020 usando o Telescópio de Cosmologia do Atacama se correlacionam com os dados do satélite Planck.
"Isso ajuda a descartar que houve um problema sistemático com o Planck a partir de algumas fontes", diz Beaton.
Se as medições de CMB estiverem corretas, restam apenas duas possibilidades: ou as técnicas usando luz de galáxias próximas não funcionam ou o Modelo Padrão de Cosmologia precisa ser alterado.
A técnica usada por Freedman e seus colegas é baseada em um tipo específico de estrela chamada variável cefeida.
Descobertas há cerca de 100 anos por uma astrônoma chamada Henrietta Leavitt, essas estrelas mudam seu brilho, pulsando mais fraco ou com mais intensidade ao longo de dias ou semanas.
Leavitt descobriu que quanto mais brilhante a estrela, mais tempo leva para se iluminar, depois escurecer e então brilhar novamente.
Agora, os astrônomos podem dizer exatamente o quão brilhante uma estrela realmente é, estudando esses pulsos de brilho.
Ao medir o quão brilhante ela nos parece da Terra e sabendo que a luz diminui em função da distância, esta técnica proporciona uma maneira precisa de medir a distância até as estrelas.
Freedman e sua equipe foram os primeiros a usar variáveis %u200B%u200Bcefeidas em galáxias vizinhas à nossa para medir a constante de Hubble utilizando dados do Telescópio Espacial Hubble.
Em 2001, eles calcularam 72 km/s/Mpc.
Desde então, o valor obtido a partir do estudo de galáxias locais tem girado em torno do mesmo ponto.
Usando o mesmo tipo de estrela, outra equipe utilizou o Telescópio Espacial Hubble em 2019 e chegou a 74 km/s/Mpc.
Apenas alguns meses depois, outro grupo de astrofísicos usou uma técnica diferente envolvendo a luz proveniente de quasares e obteve um valor de 73 km/s/Mpc.
Se essas medidas estiverem corretas, então é possível pensar que o universo poderia crescer mais rápido do que as teorias do Modelo Padrão de Cosmologia permitem.
Isso pode significar que esse modelo, e com ele nossa melhor tentativa de descrever a natureza fundamental do universo, precisa ser atualizado.
No momento, não dá para responder ao certo. Mas, se for esse o caso, as implicações podem ser profundas.
"Isso pode nos indicar que está faltando alguma coisa em nosso Modelo Padrão", diz Freedman.
"Ainda não sabemos por que isso está acontecendo, mas é uma oportunidade de avançar em direção a uma descoberta."
Se o Modelo Padrão estiver errado, uma das primeiras coisas que pode significar é que nossos modelos de do que o universo é feito, as quantidades relativas de matéria bariônica ou "normal", matéria escura, energia escura e radiação, não estão muito certas.
Além disso, se o universo está realmente se expandindo mais rápido do que pensamos, ele poderia ser muito mais jovem do que os 13,8 bilhões de anos que atualmente acredita-se que tenha.
Uma explicação alternativa para a discrepância é que a parte do universo em que vivemos é de alguma forma diferente ou especial em comparação com o resto do universo, e essa diferença está distorcendo as medidas.
"Está longe de ser uma analogia perfeita, mas você pode pensar em como a velocidade ou aceleração do seu carro muda conforme você sobe ou desce uma colina, mesmo se você estiver aplicando a mesma pressão no pedal do acelerador", diz Beaton.
"Acho pouco provável que seja a causa principal da discrepância na constante de Hubble que vemos, mas também acho importante não ignorar o trabalho desses resultados."
Mas os astrônomos acreditam que estão mais perto de determinar qual é a constante de Hubble e qual das medidas está correta.
"O que é empolgante é que acredito que realmente vamos resolver isso em um período de tempo bastante curto, seja em um, dois ou três anos", afirma Freedman.
"Há tantas coisas vindo no horizonte e que vão melhorar a precisão com que podemos fazer essas medições que acho que vamos chegar ao fundo disso."
Uma dessas coisas é o observatório espacial Gaia da ESA, que foi lançado em 2013 e tem medido as posições de cerca de 1 bilhão de estrelas com alto grau de precisão.
Os cientistas o estão usando para calcular as distâncias até as estrelas com uma técnica chamada paralaxe.
À medida que este observatório espacial orbita ao redor do Sol, seu ponto de vista no espaço muda, assim como se você fechasse um olho e olhasse para um objeto, e depois olhasse com o outro olho, o objeto parece estar em um lugar ligeiramente diferente.
Portanto, ao estudar objetos em diferentes épocas do ano durante sua órbita, Gaia permitirá aos cientistas calcular com precisão a velocidade com que as estrelas estão se afastando do nosso próprio Sistema Solar.
Outro recurso que ajudará a responder qual é o valor da constante de Hubble é o Telescópio Espacial James Webb, que será lançado no fim de 2021
Ao estudar os comprimentos de onda infravermelhos, permitirá melhores medições que não serão obscurecidas pela poeira existente entre nós e as estrelas.
No entanto, se descobrirem que a diferença na constante de Hubble persiste, será a hora de uma nova física.
E embora muitas teorias tenham sido apresentadas para explicar a diferença, nenhuma se encaixa perfeitamente com o que vemos ao nosso redor.
Cada teoria possível tem um inconveniente.
Por exemplo, pode ser que houvesse outro tipo de radiação no início do universo, mas medimos a CMB com tal precisão que não parece provável.
Outra opção é que a energia escura pode mudar com o tempo.
"Parecia uma linha de estudo promissora a seguir, mas agora existem outras limitações sobre quanto a energia escura pode mudar em função do tempo", afirma Freedman.
"Teria que ser feito de uma forma realmente artificial e isso não parece muito promissor."
Uma alternativa é que havia energia escura presente no universo primitivo que simplesmente desapareceu, mas não há nenhuma razão óbvia para que isso acontecesse.
Tudo isso obrigou os cientistas a vislumbrar novas ideias que poderiam explicar o que está acontecendo.
"As pessoas estão trabalhando muito, é empolgante", acrescenta Freedman.
"Só porque ninguém ainda descobriu o que é, não significa que uma boa ideia não aparecerá."
Dependendo do que esses novos telescópios revelem, Beaton e Freedman podem se ver em meio a um mistério digno de um romance de Agatha Christie.
* Abigail Beall é jornalista científica independente e autora do livro "The Art of Urban Astronomy" ("A Arte da Astronomia Urbana", em tradução literal).
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Future.
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