Quase um mês após ser criada, a Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 está sem um titular.
A última ocupante da função foi a infectologista Luana Araújo, que depôs na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid na quarta-feira (2/6). Ela ficou só dez dias no posto.
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Araújo foi anunciada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, no dia 12 de maio, e dispensada no dia 22, antes mesmo de ser formalmente nomeada.
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Ao ser questionada pelos senadores sobre o motivo de sua saída, Araújo explicou que sua nomeação não teria sido aceita internamente no governo federal.
"O ministro disse que lamentava, mas que meu nome não ia passar pela Casa Civil", disse ela, acrescentando depois que não sabia se a indicação teria sido vetada especificamente por essa pasta, mas que fazia essa referência porque imaginava ser assim que as indicações são avaliadas.
Em seu depoimento, Araújo contou que tentou formar uma equipe própria na secretaria, mas seus convidados resistiram a assumir cargos no governo federal.
"Infelizmente, por tudo o que vem acontecendo, por essa polarização esdrúxula, os maiores talentos dessas áreas não estavam exatamente à disposição para trabalhar nessa secretaria. Não queriam trabalhar (nela)."
Primeira indicada a não chegou a assumir
Marcelo Queiroga anunciou a criação de uma secretaria para lidar especialmente com o combate à pandemia em 24 de março, no dia seguinte à sua posse.
Mas o decreto que de fato a instaurou foi publicado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mais de um mês depois, em 10 de maio.
O governo federal foi bastante criticado por só ter criado essa secretaria mais de um ano depois do início do surto global de covid-19. A subpasta da Saúde ficaria encarregada de centralizar os esforços no combate à pandemia.
Queiroga chegou a anunciar que a enfermeira Francieli Fantinato, funcionária de carreira do Ministério da Saúde e atual coordenadora do Programa Nacional de Imunizações, assumiria o cargo.
"Com essa indicação, sinalizamos que o nosso objetivo principal é fortalecer nossa campanha de vacinação", disse Queiroga em 14 de abril. Mas Francinato não chegaria a assumir de fato.
Queiroga nega pressão do Planalto
Luana Araújo foi indicada em seu lugar por Queiroga. A infectologista é formada em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e pós-graduada pela Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos.
Mas ela deixou ministério depois de não ter seu nome aprovado pelo governo Bolsonaro.
O motivo da saída de Araújo não foi detalhado por Queiroga, nem pelo ministério, que informou apenas que buscaria "outro nome com perfil profissional semelhante: técnico e baseado em evidências científicas".
Na ocasião, Queiroga negou que tivesse havido pressão, por parte do Palácio do Planalto, contra a nomeação da médica.
Em audiência no Congresso, o ministro afirmou que Araújo não chegou a ser nomeada e agregou que em cargos do tipo "é necessário que exista validação técnica e também validação política, para todos os cargos".
A médica já havia se manifestado contra o uso de um suposto tratamento precoce contra a covid-19, posição oposta à do presidente, que incentivou o uso de medicamentos sem comprovação científica de sua eficácia contra essa doença.
Questionada diversas vezes pelos senadores sobre o motivo de seu desligamento, a médica disse não ter sido informada por Queiroga e que, portanto, a pergunta deveria ser feita ao ministro.
Queiroga já depôs na CPI, mas foi reconvocado, porque seu testemunho foi considerado insatisfatório. Ele será ouvido novamente no próximo dia 8.
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O que é uma CPI?
O que a CPI da COVID investiga?
Saiba como funciona uma CPI
O que a CPI pode fazer?
- chamar testemunhas para oitivas, com o compromisso de dizer a verdade
- convocar suspeitos para prestar depoimentos (há direito ao silêncio)
- executar prisões em caso de flagrante
- solicitar documentos e informações a órgãos ligados à administração pública
- convocar autoridades, como ministros de Estado — ou secretários, no caso de CPIs estaduais — para depor
- ir a qualquer ponto do país — ou do estado, no caso de CPIs criadas por assembleias legislativas — para audiências e diligências
- quebrar sigilos fiscais, bancários e de dados se houver fundamentação
- solicitar a colaboração de servidores de outros poderes
- elaborar relatório final contendo conclusões obtidas pela investigação e recomendações para evitar novas ocorrências como a apurada
- pedir buscas e apreensões (exceto a domicílios)
- solicitar o indiciamento de envolvidos nos casos apurados
O que a CPI não pode fazer?
Embora tenham poderes de Justiça, as CPIs não podem:
- julgar ou punir investigados
- autorizar grampos telefônicos
- solicitar prisões preventivas ou outras medidas cautelares
- declarar a indisponibilidade de bens
- autorizar buscas e apreensões em domicílios
- impedir que advogados de depoentes compareçam às oitivas e acessem
- documentos relativos à CPI
- determinar a apreensão de passaportes
A história das CPIs no Brasil
CPIs famosas no Brasil
1992: CPMI do Esquema PC Farias - culminou no impeachment de Fernando Collor
1993: CPI dos Anões do Orçamento (Câmara) - apurou desvios do Orçamento da União
2000: CPIs do Futebol - (Senado e Câmara, separadamente) - relações entre CBF, clubes e patrocinadores
2001: CPI do Preço do Leite (Assembleia de MG e outros Legislativos estaduais, separadamente) - apurar os valores cobrados pelo produto e as diretrizes para a formulação dos valores
2005: CPMI dos Correios - investigar denúncias de corrupção na empresa estatal
2005: CPMI do Mensalão - apurar possíveis vantagens recebidas por parlamentares para votar a favor de projetos do governo
2006: CPI dos Bingos (Câmara) - apurar o uso de casas de jogo do bicho para crimes como lavagem de dinheiro
2006: CPI dos Sanguessugas (Câmara) - apurou possível desvio de verbas destinadas à Saúde
2015: CPI da Petrobras (Senado) - apurar possível corrupção na estatal de petróleo
2015: Nova CPI do Futebol (Senado) - Investigar a CBF e o comitê organizador da Copa do Mundo de 2014
2019: CPMI das Fake News - disseminação de notícias falsas na disputa eleitoral de 2018
2019: CPI de Brumadinho (Assembleia de MG) - apurar as responsabilidades pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão