Em meio aos protestos que explodiram nos Estados Unidos após a morte de George Floyd, um homem negro que foi asfixiado por um policial branco em Minneapolis no último dia 25 de maio, começou a circular nas redes sociais um vídeo no qual agentes brancos detêm um homem negro, que rapidamente é liberado ao ter a sua identidade revelada. As publicações, compartilhadas milhares de vezes, asseguram que o detido era um agente do FBI e que, ao fim da gravação, ele apreendeu os distintivos dos policiais. Contudo, o protagonista da cena, ocorrida em 2019, não pertence ao FBI.
O vídeo, compartilhado mais de 117 mil vezes, circula no Facebook (1, 2, 3), Twitter (1, 2, 3), YouTube (1, 2, 3) e no Instagram (1, 2, 3), onde a plataforma CrowTangle registrou mais de 680 mil interações. O vídeo com esta afirmação também circulou em veículos de comunicação na América Latina e na Espanha (1, 2, 3, 4 e 5).
“Pois então.... racistas não PASSARÃO. Começamos bem a semana com esse vídeo. Policiais prendem homem negro e ele pede pra pegar a carteira no bolso dele e quando os policiais abrem a carteira descobrem que ele é um agente do FBI”, indica uma publicação, com data de 1º de junho.
Outra postagem afirma: “Já viram? 2 policiais algemam 1 negro daí ele ‘vocês tão me prendendo assumindo que sou algo que não sou’. Daí eles pegam a identificação no bolso dele e ele é um agente do FBI, chama eles de estúpidos, chama o supervisor e confisca o distintivos dos 3”.
O vídeo também foi compartilhado milhares de vezes em inglês, francês, catalão, holandês e espanhol, no qual circulou também que a gravação foi registrada nas atuais manifestações.
Embora o vídeo original tenha sido publicado no Instagram e no Facebook em 30 de maio de 2020, em meio aos protestos nos Estados Unidos, é indicado na legenda que a sequência, na verdade, foi gravada um ano antes. “Algo me dizia que eu tinha que guardar este vídeo”, escreveu o usuário que publicou-a.
A descrição também detalha que os policiais pertencem ao Departamento de Polícia da cidade de Rochester, no estado de Minnesota, a cerca de 150 quilômetros de Minneapolis, onde começaram os protestos após a morte de Floyd.
Após a viralização da sequência, a Polícia de Rochester publicou em 1º de junho um comunicado em seu site assinalando: “Um vídeo foi compartilhado nas redes sociais em 30 de maio de 2020 de um fato ocorrido em 1º de junho de 2019 à 1 AM, há um ano”.
Além disso, a Polícia acrescentou que, “ao contrário dos boatos nas redes sociais, o indivíduo não era um agente do Escritório Federal de Investigações (FBI)”, na sigla em inglês.
No vídeo pode-se ouvir o homem detido dizer a um dos policiais: “Você está enganado, está estabelecendo um perfil com base na minha raça. Está assumindo que eu sou alguém que eu não sou. Estão me importunando”. Também escuta-se os agentes responderem que há uma ordem de prisão antes de começarem a algemá-lo.
Os policiais analisam posteriormente os documentos do homem e o liberam. Em nenhum momento do vídeo o detido se identifica como agente do FBI, apenas reitera aos agentes que pegaram “o homem errado”.
No comunicado oficial, a Polícia de Rochester afirma que os agentes acreditaram que o homem do vídeo era uma pessoa contra quem tinham uma ordem de prisão por agressão. “O indivíduo era mais ou menos da mesma altura, peso e idade”, detalha o texto, assegurando que o homem “não cooperou em se identificar aos agentes” e que ele foi liberado imediatamente após os policiais verificarem que não era a pessoa que procuravam.
Na nota, a Polícia não menciona a retenção de distintivos, mas indica que o indivíduo “solicitou aos oficiais as suas identificações, que cada um forneceu voluntariamente”.
O homem do vídeo
Usuários do Twitter que se apresentam como amigos do homem visto no vídeo sendo detido desmentiram nesta rede social que ele seja um agente do FBI. Outro usuário também tuitou que o homem se chama Atter e que ele é paramédico.
A equipe de checagem da AFP entrou em contato com estes usuários e, a partir deles, chegou à conta no Facebook do suposto protagonista do vídeo viralizado, identificado como Atter Monydel, que no mesmo dia 30 de maio compartilhou a publicação original e escreveu: “Lembro disso. Essa merda está errada”.
Em 4 de junho, ele publicou a seguinte mensagem em sua conta no Facebook: “Eu sou Atter Mogndal, o indivíduo detido pela Polícia no vídeo que viralizou. Me mantive calado sobre o vídeo. Agora desejo falar sobre ele. Muitos estão criando a própria versão do que aconteceu. Há, inclusive, uma versão que diz que eu sou agente do FBI. Não sou um agente do FBI, tampouco trabalho para uma agência de Polícia”.
Além disso, sobre a situação que viveu em 2019, assinalou: “Creio que o vídeo seja uma clara indicação de como estabelecem um perfil com base na raça. Se o oficial de Polícia tivesse vindo com respeito, acho que isso poderia ter sido evitado. A falta de respeito e de bom senso é o que leva a situações como a que derivou na morte de George Floyd”.
A informação do perfil no Facebook de Monydel, ativo ao menos desde 2013 na rede social, indica que ele trabalha como paramédico, que vive em Rochester, Minnesota, e que é originário de Yuba, no Sudão do Sul.
Uma semana após a morte de George Floyd, um homem negro de 46 anos que foi asfixiado por um policial branco que o imobilizava pressionando o joelho contra o seu pescoço em Minneapolis, os protestos continuam nos Estados Unidos, onde muitos desencadearam distúrbios e saques.
Em resumo, o vídeo da detenção de um suposto agente do FBI que viralizou nas redes sociais em meio aos protestos nos Estados Unidos foi gravado, na verdade, há um ano e o protagonista da gravação não pertence ao FBI, por isso, não teria como ter apreendido os distintivos dos policiais, como foi afirmado em algumas publicações.
EDIT 05/06: Acrescenta publicação do usuário no Facebook Atter Monydel e apaga a comparação com a sua foto de perfil