Jornal Estado de Minas

FACT-CHECKING

Checamos: teste para COVID-19 não afeta barreira hematoencefálica, garantem especialistas

Publicações compartilhadas centenas de vezes em redes sociais desde o início de julho alegam que a coleta de secreção nasal realizada para detectar a infecção por COVID-19 pode danificar a barreira hematoencefálica, uma membrana semipermeável que separa o sangue de outros líquidos no cérebro, causando uma inflamação cerebral.


A alegação é falsa: especialistas garantem que o swab, tipo de cotonete utilizado no exame, não é inserido próximo a esta barreira e não representa um risco à saúde humana.

“Sabe esse ‘cotonetão’ que estão usando para testar covid? Então… O local em que eles estão "obtendo uma amostra" para o teste Covid-19 é chamado de Barreira Sangue-Cerebral”, começa o texto compartilhado centenas de vezes no Facebook, utilizando a tradução do nome da membrana em inglês.

“Se, de alguma forma, a sua barreira hematoencefálica estiver comprometida, ela se tornará uma ‘barreira hematoencefálica com vazamento’, que é um cérebro inflamado!  Em seguida, permite que bactérias e outras toxinas entrem no seu cérebro e infectem o tecido cerebral, o que pode levar a inflamação e, às vezes, à morte”, continua a mensagem, replicada em diversas outras postagens no Facebook (1, 2, 3) e Instagram.


O texto, que circulou também em inglês e em espanhol, termina estimulando o leitor a recusar o teste de detecção da COVID-19: “Agora, faça esse teste e caso entre qualquer contaminação aí sim você estará bem encrencado!!”.

As alegações são, contudo, falsas.

O que é o teste com swab nasal?


Como explicou ao AFP Checamos a neurologista Cristiane Nascimento, coordenadora do Departamento Científico de Neuroinfecção da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), o exame com swab nasal é feito com uma haste flexível semelhante a um cotonete.

“Uma haste é introduzida no nariz e atinge a parede posterior da nasofaringe. Tendo essa haste na nasofaringe, a gente faz uma rotação e obtém o material necessário para análise”, afirmou a médica. No caso da coleta de secreção nasal, a análise tem como objetivo detectar o PCR, “que nada mais é do que a detecção do vírus em si”.


Essa é a diferença do teste PCR para os testes rápidos, que identificam se o corpo desenvolveu anticorpos para o novo coronavírus, como explica o Ministério da Saúde brasileiro. 

O swab nasal não é utilizado exclusivamente para detectar o novo coronavírus, mas é administrado com frequência em Centros de Terapia Intensiva (CTI) para detectar bactérias hospitalares, acrescentou a médica.

O exame pode afetar a barreira hematoencefálica?


Ao contrário do que sugerem as publicações viralizadas, “o swab é feito na nasofaringe, não tem nada a ver com a barreira hematoencefálica”, garantiu Cristiane Nascimento.


A informação foi reiterada por John Dwyer, imunologista e professor emérito da Universidade de Nova Gales do Sul. “O swab não é colocado na barreira hematoencefálica e não compromete a barreira hematoencefálica e, portanto, não representa nenhum risco ao nosso sistema nervoso”, afirmou, em e-mail enviado à AFP no último dia 10 de julho.

A barreira hematoencefálica, como explicou a neurologista Cristiane Nascimento, é uma membrana composta por células endoteliais que separa o sangue do cérebro.

“Essas células têm uma maneira de ligação diferente das endoteliais do resto do corpo. Por essa ligação ser muito estreita e diferenciada, não há uma passagem de qualquer substância para dentro do cérebro”, afirmou. “Então ela é fundamental porque impede a passagem de toxinas, de substâncias de vírus, bactérias, etc”.

Embora o teste PCR possa ser “momentaneamente desagradável”, acrescentou o imunologista John Dwyer, “não há como um simples cotonete danificar a barreira hematoencefálica”.

O professor John Mathews, epidemiologista da Universidade de Melbourne, também disse à AFP que o swab “não compromete a barreira hematoencefálica de maneira nenhuma”.

“Swabs nasofaríngeos de rotina para detectar outros vírus ou para outros resultados laboratoriais têm sido coletados com segurança há muitos anos”, disse, ainda, por e-mail no último dia 10 de julho.

O comprometimento da barreira hematoencefálica realmente poderia, por sua vez, causar uma inflamação no cérebro. Mas, este não é o caso do teste com swab nasal, e sim de algumas doenças neurológicas como a meningite, encefalite e esclerose múltipla, citou a neurologista Cristiane Nascimento.

Em resumo, é falso que a coleta de secreção nasal realizada para detectar a infecção por COVID-19 possa comprometer a barreira hematoencefálica, provocando uma inflamação no cérebro. Como informaram especialistas à AFP, o exame com swab nasal não atinge essa membrana.