Um vídeo que supostamente revela que, antes de ser escolhido para o Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Alexandre de Moraes havia ameaçado “tocar fogo” na corte caso fosse derrubada a prisão após condenação em segunda instância circula amplamente em redes sociais desde o final de junho.
“Quanto custa atirar à queima roupa nas costas de cada ministro filho da puta do Supremo Tribunal Federal que queira acabar com a prisão na segunda instância? Se acabarem com a prisão em segunda instância só nos resta jogar combustível e tocar fogo no plenário do Supremo Tribunal Federal com ministros barbies dentro”, diz Moraes no vídeo visualizado mais de 4 mil vezes no Facebook (1, 2, 3), Twitter, Instagram e YouTube desde 20 de junho.
“Este vídeo foi gravado antes dele ser ministro do STF. Uma joia que tá tirando o sono dele…”, assegurou um usuário ao publicar a gravação, que também foi enviada ao WhatsApp do AFP Checamos para verificação. “Viva a internet, Alexandre de Moraes antes de ser Ministro do STF, compartilhem, vamos fazer esse vídeo chegar a todos brasileiros”, escreveu outro.
Não é verdade, contudo, que o vídeo viralizado mostre Moraes ameaçando o STF.
Ministro lê ofensas publicadas on-line
Uma busca no Google pela frase dita por Moraes na gravação leva a diversos artigos (1, 2, 3) que indicam que o trecho foi retirado de um julgamento realizado no último dia 17 junho, em que os ministros do STF avaliaram a legalidade do inquérito que investiga notícias fraudulentas, denunciações caluniosas e ameaças contra os membros da corte, também conhecido como inquérito das fake news.
Instaurado em 2019, com base em um artigo do regimento do STF, o inquérito tem sido alvo de críticas, acusado de violar o direito à liberdade de expressão.
O trecho compartilhado nas redes realmente pode ser identificado a partir de 1 hora, 6 minutos e 58 segundos do vídeo do julgamento, publicado no canal oficial do STF no YouTube.
Ao assistir à gravação completa fica claro que Moraes estava lendo uma ofensa feita on-line contra o STF e não ele mesmo fazendo a ameaça.
“Eu peço uma redobrada atenção para algumas frases, algumas, inclusive, duras, que vou ler de algumas agressões e ofensas feitas aos ministros do Supremo Tribunal Federal para que se pare, de uma vez por todas, de se fazer confusão de críticas, por mais ácidas que sejam, e que devem existir e continuar, com agressões, com ameaças, e com coações”, diz, antes de enumerar algumas frases, inclusive à citada no vídeo viralizado.
“Começo com a primeira [...], abre aspas: ‘Que estuprem e matem as filhas dos ordinários ministros do Supremo Tribunal Federal’, fecha aspas. Em nenhum lugar do mundo isso é liberdade de expressão. Isso é bandidagem, isso é criminalidade”, continua o ministro.
Em seguida, lê a ameaça viralizada nas redes.
Por dez votos a um, o STF decidiu pela legalidade do inquérito das fake news. Foi vencido o ministro Marco Aurélio Mello.
Prisão em segunda instância
Outro elemento que indica que a gravação viralizada não foi feita antes de Alexandre de Moraes virar ministro do STF é a referência, na frase lida por ele, ao julgamento do STF que derrubou a prisão após condenação em segunda instância.
Esta ação começou a ser votada em outubro de 2019, mais de dois anos após Moraes assumir uma vaga no STF, em março de 2017.
Na época, Moraes divergiu da decisão que abriu caminho para a libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Alexandre de Moraes tem sido alvo de desinformação nas redes após tomar decisões contrárias ao presidente Jair Bolsonaro em ao menos duas ações recentes. Em maio deste ano, como parte do inquérito das fake news, determinou o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra partidários do presidente. Em abril, deu início a um inquérito para investigar uma manifestação pró-intervenção militar que contou com a participação de Bolsonaro.
Em resumo, é falso que o vídeo viralizado mostre o ministro Alexandre de Moraes ameaçando o Supremo Tribunal Federal antes de assumir uma cadeira na corte. O vídeo foi retirado de um julgamento do STF realizado em junho deste ano em que Moraes lia ameaças feitas contra os membros do tribunal.