Jornal Estado de Minas

FACT-CHECKING

Checamos: Além do Brasil, 15 países usam urnas eletrônicas; em Cuba, votações usam cédulas de papel

Publicações compartilhadas mais de 36,3 mil vezes desde fevereiro de 2018 afirmam que, de “193 países no mundo”, as urnas eletrônicas são utilizadas apenas em duas nações além do Brasil: Cuba e Venezuela.



Essa afirmação, contudo, é falsa. Outros 15 países empregam urnas eletrônicas e, em Cuba, as votações são feitas por meio de cédulas de papel. Sobre a quantidade de países, não há um levantamento único, mas o Brasil reconhece a existência de 196 nações.
“193 países no mundo. Apenas 3 usam urnas eletrônicas. Brasil, Cuba e Venezuela”, afirmam diferentes postagens compartilhadas milhares de vezes no Facebook desde 9 de fevereiro de 2018, ano em que estavam em disputa os cargos de presidente, deputado federal, deputado estadual, senador e governador.

Com a aproximação das eleições municipais, que terão o seu primeiro turno em 15 de novembro, essa alegação voltou a ganhar repercussão tanto no Facebook (1, 2, 3) quanto no Twitter (1, 2) em setembro deste ano.




O uso de urnas eletrônicas, no entanto, não é exclusividade do Brasil e mais dois países. O Institute for Democracy and Electoral Assistance (IDEA), que realiza pesquisas sobre a democracia e aborda, entre outros temas, a digitalização de processos eleitorais, fez um levantamento com 178 países, consultado em 5 de outubro de 2020, e chegou à conclusão que, contando com o Brasil, 46 Estados utilizam algum tipo de votação eletrônica, sendo que 26 usam em eleições nacionais.

Os dados do instituto também indicam que, além do Brasil, outros 15 países usam urnas eletrônicas com gravação direta (com ou sem impressão em papel verificável pelo eleitor). Há igualmente outros modelos de votação eletrônica, como o voto pela internet, regulamentado em 10 países.

A equipe de checagem do Projeto Comprova, da qual o AFP Checamos faz parte, entrou em contato com Peter Wolf, especialista sênior em Eleições, Democracia e Tecnologia do IDEA, que explicou: “Veja que máquinas de votação são certamente utilizadas em muito mais do que três países. Se você incluir todos os tipos de máquinas de votação, achará inúmeros exemplos: Estados Unidos, Canadá, Venezuela, Bélgica, França, Índia, Filipinas, República Democrática do Congo e Namíbia”.



O especialista aponta, contudo, que há uma especificidade nas urnas eletrônicas usadas no Brasil: “Notadamente, a ausência de comprovante de papel, que é menos comum. Em alguns locais nos Estados Unidos, na Namíbia e parte da França são os únicos exemplos de sistemas sem comprovante de papel que me vêm à mente agora. Além, é claro, de sistema de votações on-line que, obviamente, não possuem uma função de registro em papel”.

Em 2009, o voto impresso foi aprovado pelo Congresso Nacional. De acordo com o artigo 5º da lei nº 12.034/2009, a urna eletrônica exibiria na tela os votos digitais e, após a confirmação, imprimiria um número único de identificação do voto associado à sua própria assinatura digital.

Anos mais tarde, em 2013, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou como inconstitucional o artigo em questão, pois este tornava vulnerável o segredo do voto, garantido no artigo 14 da Constituição Federal.



Em 2015, a minirreforma eleitoral previa a emissão de um comprovante de votação pelas urnas. Em setembro deste ano, o STF decidiu o voto impresso como inconstitucional por ameaçar a inviolabilidade do sigilo da votação e ainda favorecer fraudes eleitorais.

Eleições em Cuba


Diferentemente do que é afirmado nas publicações viralizadas, Cuba não utiliza urnas eletrônicas em suas votações. A Lei Eleitoral cubana prevê o uso de cédulas de papel em eleições, plebiscitos, ou referendos. As cédulas devem conter os nomes e sobrenomes dos candidatos, além dos cargos aos quais eles estão concorrendo, de acordo com a Lei Eleitoral vigente.

A lei determina que a marcação seja feita em um lugar reservado, em que o eleitor possa votar de forma secreta.

Os cidadãos maiores de 16 anos votam pelos candidatos do seu município para que integrem as assembleias provinciais e a Assembleia Nacional (Parlamento), em nominatas fechadas, ou seja, o número de candidatos é igual ao de cadeiras. Não se escolhe entre vários, mas aprovam ou não um candidato.



Depois, a apuração é feita pelo Conselho Eleitoral Municipal. No caso de referendos e plebiscitos, o eleitor também deve marcar um xis ao lado das palavras “SIM” ou “NÃO”.

Eleições na Venezuela


A Venezuela usa urnas eletrônicas em suas eleições desde 2004 com máquinas que imprimem o comprovante dos votos. A partir de 2012, passou a adotar a identificação biométrica para liberar o funcionamento dos equipamentos, como informa o Conselho Nacional Eleitoral (CNE). As urnas utilizadas foram desenvolvidas pela empresa Smartmatic.

A empresa, fundada nos Estados Unidos, trabalhou em 15 eleições venezuelanas entre 2004 e 2017.

Em agosto de 2017, o CEO da Smartmatic, Antonio Mugica, realizou uma coletiva de imprensa na qual informou que a taxa de comparecimento dos eleitores anunciada pela CNE nas eleições de 30 de julho daquele ano não correspondia aos números registrados pela empresa. Por isso, a companhia suspendeu suas atividades no país.
Idosa vota em Santa Clara, em Cuba, durante eleição para ratificar a nova Assembleia Nacional, em 11 de março de 2018

Quantos países existem?


Atualmente, não há uma base de dados única a respeito da quantidade de países no mundo, pois cada governo é livre para reconhecer, ou não, a existência de outras nações e estabelecer relações diplomáticas com elas.



Desde que a República do Sudão do Sul se separou do Sudão em julho de 2011, a Organização das Nações Unidas conta com 193 Estados-membros. Por não ser um Estado ou governo, tecnicamente a ONU não tem autoridade para reconhecer se um país existe.

O Brasil reconhece e, por sua vez, possui relação diplomática com 196 países, além de um representante junto à União Europeia. A lista inclui autoridades nacionais que não integram a Assembleia Geral da ONU, como a Palestina e o Vaticano. Igualmente, existem 197 embaixadas e consulados estrangeiros no Brasil (incluindo a representação da União Europeia), como é possível conferir no site do Ministério das Relações Exteriores.

Em resumo, é falso que apenas três países - Brasil, Cuba e Venezuela - utilizem urnas eletrônicas em votações. De acordo com o Institute for Democracy and Electoral Assistance, 46 Estados utilizam algum tipo de votação eletrônica. Destes, 16 usam urnas eletrônicas com gravação direta, como é o caso do Brasil. Em Cuba, por sua vez, as votações são feitas com cédulas de papel.



Este conteúdo já foi verificado pela Agência Lupa, Fato ou Fake, E-farsas e Agência Pública.

Esse texto faz parte do Projeto Comprova. Participaram jornalistas do Jornal do Commercio, O Povo e Nexo. O material foi adaptado pelo AFP Checamos.

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