Uma série de imagens foi compartilhada mais de 37 mil vezes nas redes sociais desde 1º de dezembro como se mostrasse as cenas de um grande roubo a um banco na cidade de Criciúma, em Santa Catarina, na madrugada do mesmo dia.
“‘Dezembro vai ser melhor e mais leve’ 1° de dezembro: Criciúma”, começam as publicações viralizadas no Facebook (1, 2, 3) e Instagram (1, 2, 3).
As postagens também listam uma sequência de eventos: “explodiram 3 banco; dinheiro no chão; os cara de bazuca; mais munição q a policia; vários reféns; sairam com vários carros como se tivessem em um desfile; começou a 00:00 e terminou as 2:00; Fizeram uma Live e na hora de ir embora ainda saíram escutando música. 2 horas de assalto; Armamento de exército gringo; Granadas; Uma dúzia de carros blindados; Sitiaram uma CIDADE; Tudo com calma”.
Na madrugada de 1º de dezembro, a cidade de Criciúma foi palco do que foi considerado o maior assalto em Santa Catarina. Um batalhão da Polícia Militar foi atacado com tiros e uma agência bancária foi roubada. Dois dias depois, nove suspeitos de participarem da ação foram presos.
Uma busca reversa das fotografias, contudo, mostrou que nem todas foram registradas na cidade catarinense em dezembro deste ano.
São Paulo, em 2019
A foto de um homem usando um lenço para cobrir o rosto com a estampa de uma caveira não foi registrada em Criciúma. Uma pesquisa pela origem da imagem mostrou que ela foi feita em 11 de dezembro de 2019 durante um ataque a uma agência bancária em Botucatu, no interior de São Paulo.
Em um vídeo publicado no canal do YouTube da emissora SBT é possível ver o momento em que o homem armado e com o rosto coberto passa diante da câmera de segurança. De acordo com informações publicadas pela imprensa, os assaltantes renderam moradores e trocaram tiros com a polícia.
Goiás, em 2020
Uma segunda imagem compartilhada como se fosse do assalto em Criciúma foi feita, na verdade, em Anápolis, Goiás. Trata-se de um caso ocorrido em abril deste ano, quando criminosos assaltaram uma agência bancária localizada na cidade goiana.
Meios de comunicação locais noticiaram o caso (1, 2) e, em 2 de junho, a Polícia Civil de Goiás publicou um texto em seu site anunciando que havia desarticulado a associação criminosa responsável pela ação. Nas imagens divulgadas pela polícia é possível perceber os mesmos elementos encontrados na foto viralizada, como a forma de arrombamento na porta do cofre, as ferramentas amarelas e um item de iluminação.
Vale Verde, em 2019
Outra imagem, de homens encapuzados entrando armados em um estabelecimento, foi compartilhada também por sites de notícia (1, 2, 3) que reportaram o assalto em Criciúma. Uma busca reversa no Google revelou, contudo, que a foto não poderia corresponder à ação do último dia 1º de dezembro, já que circula desde 8 de agosto de 2019.
Segundo veículos gaúchos (1, 2, 3), a imagem foi feita na cidade de Vale Verde, no Rio Grande do Sul, durante um assalto a uma agência do banco Sicredi, em agosto do ano passado.
Mato Grosso, em 2019
Outra foto atribuída nas redes a Criciúma foi feita, na verdade, em Tangará Da Serra, Mato Grosso, em 2019.
Uma busca no Google pela imagem de destroços em um ambiente fechado levou a múltiplas reportagens (1, 2, 3) que indicam que o registro foi feito em 11 de fevereiro do ano passado durante uma operação da Polícia Militar mato-grossense que frustrou uma tentativa de roubo em uma agência bancária na cidade.
Em outra imagem da tentativa de roubo publicada pela imprensa em 2019 é possível identificar o mesmo buraco visto na parede direita da foto viralizada.
Minas Gerais, em 2018
“Atenção: acabaram de derrubar esse helicóptero da Polícia Militar na entrada de Criciúma”, diz texto que acompanha uma imagem de destroços de uma aeronave, nos álbuns viralizados nas redes. Esse registro tampouco foi feito na cidade catarinense.
A mesma imagem foi localizada em múltiplas reportagens (1, 2, 3) sobre um acidente de helicóptero que ocorreu em Minas Gerais, em 16 junho de 2018, deixando duas vítimas. A imprensa creditou a foto ao Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG).
Em outras fotos publicadas na mídia dois dias depois - quando bombeiros ainda buscavam os passageiros da aeronave -, é possível identificar o mesmo componente com faixas vermelhas e amarelas visto na imagem compartilhada nas redes.
Ourinhos, em 2020
Publicado juntamente com registros do assalto ocorrido em Criciúma, essa imagem foi feita, contudo, na cidade de Ourinhos, em São Paulo, em maio de 2020, como é possível conferir em um vídeo publicado no canal do YouTube da emissora Record.
Uma pesquisa pelos termos “ourinhos + assalto” mostra como resultado matérias publicadas em meios de comunicação (1, 2) que mencionam que pelo menos 40 homens roubaram uma agência bancária com o uso de explosivos.
No site da Prefeitura de Ourinhos também é possível ver a mesma imagem dos homens armados que viralizou nas redes sociais como sendo de Criciúma.
Imagens verdadeiras de Criciúma
Por outro lado, alguns dos registros viralizados realmente correspondem à ação criminosa conduzida na cidade de Santa Catarina no início deste mês.
Esse é o caso da foto de um detonador apoiado em um poste. Uma busca avançada por tuítes publicados na noite de 1º de dezembro com a localização da cidade catarinense mostrou que a imagem foi publicada às 2h33 da madrugada com a legenda: “Tem até detonador espalhados pelo centro de Criciúma”.
Na sequência, o mesmo usuário publicou dois vídeos (1, 2) de detonadores deixados no chão e escreveu: “Não consigo acompanhar os tt gurizada, mas é isso, fiquem em casa, eu sai sem saber o tamanho da parada, realmente coisa de filme”.
Contactado pelo AFP Checamos, o usuário @Higormgarcia confirmou ter feito a imagem viralizada na Praça Nereu Ramos, no centro de Criciúma “minutos depois de os assaltantes terem terminado o assalto”. Uma busca no Google Street View por esse endereço permite localizar os mesmos elementos vistos em um dos vídeos publicados pelo usuário no Twitter.
As imagens de notas de dinheiro espalhadas em uma rua são capturas de tela de um vídeo que também corresponde ao assalto na cidade catarinense. O registro mais antigo da gravação localizado pela equipe de checagem da AFP é um tuíte publicado às 2h18 de 1º de dezembro por um usuário geolocalizado em Criciúma.
Aos seis segundos da gravação é possível ver o nome de um estabelecimento comercial: “Out Jeans”. Uma busca no Google por esse nome, mostra que a loja fica localizada na rua Lauro Müller, no centro de Criciúma, ao lado da agência do Banco do Brasil que foi alvo do roubo.
Ao fugir de Criciúma, a quadrilha deixou diversas notas de dinheiro jogadas pelas ruas, que foram coletadas por moradores da cidade. Segundo a Polícia Civil de Santa Catarina, quatro pessoas foram presas por terem recolhido mais de R$ 810 mil das cédulas abandonadas pelos criminosos.
A imagem de uma nuvem de fumaça avermelhada também foi feita em Criciúma.
O registro mais antigo da foto foi localizado em um tuíte feito às 1h15 da madrugada de 1º de dezembro, com a legenda: “Assaltantes fecham o túnel do formigão no trecho da BR101 cidade de Tubarão para o Bope não chegar em Criciúma. Que Deus nos proteja!”.
Uma imagem semelhante foi publicada em múltiplas reportagens (1, 2) sobre como os criminosos provocaram um incêndio na rodovia que liga Criciúma ao município vizinho de Tubarão para impedir a chegada de reforço policial à cidade.
O registro mais antigo das imagens de uma pessoa na cobertura de um prédio foi encontrado no Twitter, a partir da localização de Criciúma, em uma publicação feita às 2h16 do dia 1º de dezembro. O Checamos entrou em contato com o autor do tuíte, mas não teve retorno até a publicação deste artigo.
Postagens feitas nos minutos seguintes (1, 2, 3) na mesma rede social e com o filtro de localização especificado para Criciúma replicavam esta foto.
A imagem de pessoas sentadas no chão em frente a uma van também foi feita em Criciúma. Uma busca no Twitter pelo registro mais antigo da fotografia, e limitando a localização para as proximidades da cidade catarinense, leva a uma publicação feita à 0h44 do dia de assalto. “Os cara com refém em criciúma”, indica o autor do tuíte.
Um portal local de notícias que acompanhou em tempo real os eventos em Criciúma, por sua vez, usou a mesma imagem de reprodução. Além disso, no Twitter também era possível encontrar vídeos (1, 2) que mostravam a mesma van e os reféns, mas com uma distância maior.
O site de notícias de Santa Catarina NSC também publicou a imagem das pessoas sentadas no chão e a conta no Twitter da rádio CBN divulgou a gravação na qual é possível identificar a van utilizada na ação.
Segundo a imprensa (1, 2, 3), tratava-se de funcionários do Departamento de Trânsito e Transporte (DTT) de Criciúma que estavam fazendo a pintura de faixas de sinalização na via no momento em que foram abordados pelos assaltantes.
Uma busca reversa no Google pela última fotografia levou a dois sites (1, 2) de Santa Catarina que usaram a imagem de cartuchos de bala. Nestas, contudo, não há qualquer informação sobre a data em que foi tirada, ou de crédito.
O registro mais antigo localizado pela equipe de checagem da AFP foi um tuíte feito às 2h36 que dizia: “Olha o calibre que eles usaram ... Com certeza não são bandidos comuns, há quem diga que sejam profissionais bem preparados para esse tipo de ação. Parece filme!!!”. O Checamos entrou em contato com o autor para confirmar a informação, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
Em outros sites de notícias e tuítes (1, 2) também é possível ver imagens de cartuchos de bala semelhantes. Um vídeo gravado pela repórter do NSC em Santa Catarina mostra que nas ruas viam-se grandes balas no chão.
Em resumo, seis das 13 imagens viralizadas nas redes sociais não correspondem ao assalto ocorrido em Criciúma no último dia 1º de dezembro. Elas foram registradas em outros estados e, algumas, em outros anos.