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Estado de Minas CHECAMOS

Decisão de Fachin sobre condenações de Lula não inocentou o ex-presidente

Outras versões repetem a alegação de que o ex-presidente foi inocentado, mas criticando a suposta decisão


10/03/2021 17:04 - atualizado 10/03/2021 20:15


 

Captura de tela feita em 9 de março de 2021 de uma publicação no Instagram
Captura de tela feita em 9 de março de 2021 de uma publicação no Instagram
Após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin ter decidido, no último dia 8 de março, anular todas as condenações do ex-presidente Lula relacionadas à Operação Lava Jato, viralizaram nas redes sociais múltiplas publicações que garantem que o petista foi “inocentado”. Isso não é verdade. As decisões da 13ª Vara Federal de Curitiba foram canceladas porque Fachin considerou que o órgão não tinha competência para julgar os casos, não porque o ministro decidiu que Lula era inocente. Agora, as ações serão avaliadas por uma nova vara, essa sim, com o poder de absolver ou condenar Lula.


“E finalmente veio a Justiça! Lula inocentado e com direitos políticos. LULA PRESIDENTE 2022 para o Brasil ser feliz de novo!”, diz uma das publicações, compartilhadas milhares de vezes no Facebook (1, 2, 3), Instagram e Twitter. Mensagens semelhantes também circulam em espanhol (1).

Outras versões repetem a alegação de que o ex-presidente foi inocentado, mas criticando a suposta decisão.

“O chefão do maior escândalo de corrupção de todos os tempos foi inocentado [...] Com as instituições corrompidas desse jeito, acreditar em eleições justas é como acreditar em Papai Noel”, escreveu um usuário. “O Brasil não é para amadores!” , comentou outro. 

No último dia 8 de março, o ministro do STF Edson Fachin efetivamente anulou todas as decisões tomadas pela 13ª Vara Federal de Curitiba - antes titularizada pelo então juiz Sergio Moro - em ações penais contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Vara considerada “incompetente”


Julgando um habeas corpus apresentado pela defesa de Lula em novembro de 2020, Fachin considerou que a 13ª Vara não tinha “juízo competente” para processar e julgar o ex-presidente nos casos envolvendo o triplex do Guarujá, o sítio de Atibaia, a sede do Instituto Lula e doações ao mesmo instituto.

Em 2017, a 13ª Vara de Curitiba declarou Lula culpado de ter recebido uma cobertura tríplex na cidade costeira de Guarujá, em São Paulo, como propina da construtora OAS e, em 2019, de aceitar a realização de reformas em um sítio que frequentava em Atibaia (SP), em troca de contratos com estatais. No total, o ex-mandatário foi condenado a 25 anos de prisão e recorria em liberdade desde novembro de 2019.

Os outros dois casos, nos quais o ex-presidente era acusado de receber repasses irregulares da construtora Odebrecht disfarçados de doações ao Instituto Lula e de aceitar propina da mesma empresa na forma de um terreno para construção da nova sede do instituto, ainda estavam em tramitação em Curitiba. 
Captura de tela feita em 9 de março de 2021 de uma publicação no Instagram
Captura de tela feita em 9 de março de 2021 de uma publicação no Instagram

Para Fachin, essas ações não deveriam ter tramitado na 13ª Vara de Curitiba porque os fatos apontados não tinham relação direta com o esquema de desvios na Petrobras, investigado pela Operação Lava Jato. Assim, foram anuladas todas as sentenças proferidas por essa vara para os casos citados.

Isso não quer dizer, contudo, que Lula foi considerado inocente dos crimes dos quais era acusado nas referidas ações.

Inocente?


“Na verdade, o ministro Fachin, julgando embargos de declaração em um habeas corpus, entendeu que a 13ª Vara Federal da Seção Judiciária do Paraná [...] não era competente, do ponto de vista territorial, para processar e julgar os casos”, explicou ao AFP Checamos Gustavo Sampaio, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF).

“Então, na realidade, ele não inocentou o Lula porque ele não julgou mérito de nada. Ele só reconheceu a incompetência do juízo. O que ocorre quando se reconhece a incompetência do juízo? Distribui-se aquele processo para outro juízo”, acrescentou.

A informação foi reiterada por Michael Mohallem, professor de Direitos Humanos e de Processo Legislativo da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

“É uma decisão processual, então ela nunca discutiu mérito. Em nenhum momento discutiu as provas, se o Lula foi corrupto ou não, essa discussão não aconteceu. Ele simplesmente disse: ‘o julgamento aconteceu onde não poderia ter acontecido, portanto, anule-se tudo até o momento anterior à decisão e transfira para Brasília’”, explicou o especialista.

Procurada pelo AFP Checamos em 9 de março, a assessoria de imprensa do STF confirmou que a decisão do ministro Fachin não absolveu o ex-presidente Lula: 

“O ministro Edson Fachin não analisou o mérito das decisões nos citados processos em face do ex-presidente Lula. Apenas reconheceu a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba”.

Apesar de não ter inocentado Lula, destacou o professor Michael Mohallem, a decisão do STF fez com que o ex-presidente passasse momentaneamente a um status de inocente perante à Lei brasileira, já que a Constituição prevê, em seu 5º artigo, que ninguém será considerado culpado “até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

“Quando a gente fala de uma decisão que inocenta alguém, é uma decisão que discute o mérito, ela discute se a pessoa tem culpa e conclui que não, que essa pessoa não cometeu esse crime”, disse Mohallem, explicando que isso não aconteceu nesse caso. Mas, “ao ser processual e anular tudo, ela [a decisão de Fachin] transforma o estado jurídico do Lula de uma pessoa condenada, para uma pessoa que é apenas investigada. Logo, ele é inocente de qualquer crime”.

Com isso, Lula recupera os seus direitos políticos e volta a ser elegível de acordo com a lei da Ficha Limpa, que determina que não poderá ser candidato a cargo político aquele que foi “condenado, em decisão transitada em julgado” - caso de Lula antes da anulação das sentenças.

O que acontece com os casos?


Na deliberação de 8 de março, Fachin ordenou que os casos sejam reiniciados na Justiça Federal do Distrito Federal. Isso quer dizer que, agora, as ações serão julgadas novamente por uma outra vara que poderá, portanto, condenar ou inocentar Lula, explicou Gustavo Sampaio.

“Quando se reconhece a incompetência do juízo, o novo juízo, agora competente, tem que refazer os atos decisórios. O juiz federal em Brasília terá que julgar se recebe, ou não, a denúncia que um dia foi oferecida contra Lula. E, lá na frente, [...], ele terá que sentenciar. Condenando, ou absolvendo Lula”, afirmou.

De acordo com a decisão de Fachin, acrescentou o professor da UFF, o novo juiz poderia escolher, no entanto, aproveitar as provas já colhidas nos processos anteriores.

“O artigo 567 do Código de Processo Penal diz que nesses casos o juiz pode aproveitar atos instrutórios do processo anterior. Como, por exemplo, provas produzidas, depoimentos colhidos, perícias feitas. Isso o juiz federal em Brasília, se assim entender, poderá aproveitar da instrução processual dos processos que tramitaram na 13ª Vara Federal do Paraná. Agora, os atos decisórios não”, explicou.

Esse aproveitamento de provas pode ser afetado, contudo, por um outro julgamento que corre atualmente no Supremo Tribunal Federal: o da suspeição do ex-juiz Sergio Moro, que julgou Lula em quase todos os processos relacionados à Lava Jato.

Retomado no último dia 9 de março, o julgamento irá decidir se Moro atuou com interesse político ao considerar o ex-presidente culpado dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro referentes ao triplex do Guarujá.

Para Gustavo Sampaio, se a suspeição for reconhecida pela corte, até mesmo as provas dos processos que tramitaram na 13ª Vara Federal de Curitiba cairiam por terra.

“Se a Segunda Turma do Supremo Tribunal acolher a arguição de suspeição - o que é totalmente diferente do que Fachin fez -, tudo o que foi feito na instrução da Operação Lava Jato cai por terra, inclusive as provas coligidas pelo juiz Sergio Moro, não apenas as decisões por ele proferidas, mas também as provas colhidas por ele, como depoimentos, perícias, documentos, tudo isso”, explicou.

Com o placar empatado em 2 x 2, o julgamento da parcialidade de Moro foi suspenso no mesmo dia em que foi retomado após o ministro Kassio Nunes Marques pedir vista, ou seja, mais tempo para analisar o processo. Votaram a favor da suspeição do ex-juiz os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski e, contra, Cármen Lúcia e Edson Fachin.

Em resumo, as publicações que afirmam que o ex-presidente Lula foi absolvido pela decisão de Edson Fachin em 8 de março distorcem a deliberação do ministro do STF. Fachin suspendeu as condenações do ex-presidente no âmbito da Lava Jato, mas não analisou se Lula cometeu ou não os crimes dos quais era acusado.


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