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Chapecó não se 'livrou' da COVID-19 adotando o chamado 'tratamento precoce'

Publicações compartilhadas centenas de vezes nas redes sociais desde 26 de junho afirmam que o município de Chapecó, em Santa Catarina, está “livre” da COVID-19 ao adotar o chamado 'tratamento precoce' – que não tem eficácia comprovada cientificamente contra a doença. A afirmação é falsa.



Segundo os últimos boletins informativos da Prefeitura de Chapecó, a ocupação de leitos de UTI na rede pública da cidade se mantém em 93% ou mais desde 20 de junho e, em abril, chegou a ter 100% de ocupação de UTIs públicas e privadas.

“O Presidente Jair Bolsonaro faz sua quarta motociata na cidade de Chapecó, na sua garupa o prefeito que implantou o tratamento precoce e livrou Chapecó do COVID”, diz a postagem que circulou no Twitter (1, 2), Facebook (1, 2, 3) e Instagram.

Conteúdo semelhante já havia sido compartilhado em abril, quando a cidade desativou um hospital de campanha destinado ao combate à doença. Não é verdade, porém, que a cidade tenha zerado a ocupação de leitos destinados pacientes com COVID-19 ao adotar o kit de medicamentos conhecidos como 'tratamento precoce'.



 

Segundo o boletim epidemiológico de 28 de junho de 2021, Chapecó registrou 149 internações pela doença, sendo 61 de habitantes de Chapecó e 88 pacientes internados vindos de outros locais.


Em 26 de junho de 2021, data em que circularam as postagens, Chapecó registrou 146 internações, sendo 55 pacientes de Chapecó e 91 vindos de outros locais.

Desde o início de junho, o número de internados em UTIs tem se mantido entre 103 e 116 pacientes, de acordo com os boletins epidemiológicos oficiais

Além disso, até 27 de junho, a cidade de Santa Catarina acumulava 648 mortes em uma população total de 224 mil habitantes. Isso significa que a mortalidade por COVID-19 no município é de 289,28 para cada 100 mil habitantes, sendo, portanto, superior à média nacional de 244,3 mortes por COVID-19 para cada 100 mil pessoas conforme registrado no Painel Coronavírus do Ministério da Saúde.





Casos ativos e medidas restritivas


Em abril de 2021, Chapecó de fato registrou uma queda acentuada no número de casos ativos de COVID-19 em relação a março. Em 7 de abril, a cidade registrava 569 casos ativos do novo coronavírus na cidade, contra 4.244 no mesmo dia do mês anterior.

Não é possível afirmar, porém, que a queda no número de casos se deva ao 'tratamento precoce'.

Entre o início de março e meados de abril, o governo local realmente estimulou a rápida medicação de pessoas com COVID-19, mas não somente.

Em 5 de março, por exemplo, Chapecó acatou decretos estaduais determinando toque de recolher das 22h às 5h, limitando o horário de funcionamento de bares e proibindo o consumo de bebidas alcoólicas em áreas públicas.



Em 9 do mesmo mês foi instituída uma barreira sanitária na cidade, medindo a temperatura e testando aqueles que desejassem entrar em Chapecó.

Quando o número de casos ativos começou a cair, em meados de março, o secretário-adjunto da Saúde, Jader Danielli, atribuiu a melhora a uma série de fatores, como registrado no site da prefeitura.

“Isso é fruto de um conjunto de medidas tomadas pela Administração Municipal, como uma melhora na eficiência operacional, isolamento, tratamento mais adequado com a abertura de mais leitos, mais profissionais e equipamentos”, disse. “Pedimos que a população continue tomando cuidado para que esses números não voltem a crescer. Quem não precisar sair de casa, não saia. Se sair, vá sozinho, use máscara e mantenha o distanciamento”, assinalou.


Já em 2 de junho, o prefeito João Rodrigues publicou um decreto adotando as medidas estaduais de combate ao coronavírus estabelecidas pelo governo de Santa Catarina até 30 de junho de 2021.



Em Chapecó, o decreto municipal manteve restrições como a proibição ao fornecimento de bebidas alcoólicas em estabelecimentos entre 23h e 6h, proibição a aglomerações e de realização de festas, além de proibir o consumo de bebidas alcoólicas em áreas públicas. 


O mesmo decreto, no entanto, também permitiu a realização de eventos sociais (casamentos, aniversários, jantares, confraternizações, bodas, formaturas, batizados, festas infantis e afins), restritos a convidados sentados, observando o regramento de ocupação, das 6h às 23h.

O decreto passou a valer em 3 de junho de 2021. 


Ao final do mês de junho, a cidade ainda mantinha uma barreira sanitária no Terminal Rodoviário Raul Bartolomei e no aeroporto Serafim Enoss Bertaso. No início do mês, a prefeitura intensificou a fiscalização das medidas de enfrentamento à pandemia.





Em 2 de junho, o prefeito João Rodrigues afirmou que os números estão em estabilidade, mas que as fiscalizações seriam intensificadas e alertou para o aumento de contaminados na faixa entre os 20 e 30 anos.


No último dia 27 de junho, a cidade registrou 451 casos ativos da doença. De 3 a 15 de junho, o número de casos ativos se manteve acima de 500, quando a cidade passou a registrar, em média, 400 a 450 casos ativos diariamente (com exceção dos dias 22 e 23 de junho, quando foram registrados, respectivamente, 372 e 379 casos).

Tratamento sem comprovação


Além de o 'tratamento precoce' não ter sido a única medida implementada pela Prefeitura de Chapecó, não há evidências de que essa estratégia seja capaz de combater o novo coronavírus.


Embora o governo local não detalhe quais medicamentos estão sendo indicados para lidar com a doença, o chamado tratamento precoce costuma incluir combinações de hidroxicloroquina, ivermectina, vitamina C e zinco – substâncias que não são recomendadas por organizações de saúde para tratar a COVID-19.





Remédio comumente utilizado para tratar a malária, a hidroxicloroquina foi alvo de diversos estudos durante a pandemia de COVID-19.


Em 5 de junho de 2020, por exemplo, pesquisadores da Universidade de Oxford compararam a evolução de pacientes de COVID-19 que receberam hidroxicloroquina com aqueles que receberam o tratamento usual, concluindo que não houve diferença significativa na taxa de mortalidade ou redução no período de internação hospitalar.

Em outubro de 2020, a hidroxicloroquina também não se mostrou capaz de reduzir substancialmente a gravidade de sintomas em pacientes ambulatoriais com COVID-19 leve e inicial.


Para a Agência de Medicamentos Europeia (EMA) não somente não há evidências de efeitos benéficos do uso do medicamento contra a COVID-19, como este pode “causar alguns efeitos colaterais, incluindo problemas cardíacos”.



 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) também não recomenda o uso da hidroxicloroquina para prevenir a COVID-19. “Esta recomendação é feita com base em seis ensaios clínicos com mais de 6 mil participantes que não possuíam COVID-19 e receberam a hidroxicloroquina. Usar a hidroxicloroquina como prevenção teve pouco ou nenhum efeito em prevenir a doença, a hospitalização ou a morte por COVID-19”, diz a organização.


Um paciente usa uma nova e não-invasiva tecnologia na ala de COVID-19 no Hospital Centenário, em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, em 16 de abril de 2021 (foto: Silvio Avila / AFP)


Já a eficácia da ivermectina – medicamento utilizado para tratar algumas infecções parasitárias – ainda está em estudo. Enquanto isso, a OMS recomenda que o remédio não seja utilizado contra o novo coronavírus, a não ser em ensaios clínicos.

A organização também destaca que micronutrientes como a vitamina C e o zinco são cruciais para o funcionamento correto do sistema imunológico, mas que não há, até agora, orientação para o seu uso como tratamento contra a COVID-19.





De acordo com o Instituto Butantan, o 'tratamento precoce' é um “coquetel de remédios sem eficácia comprovada” contra o novo coronavírus. “As medidas de proteção contra a COVID-19 são o uso de máscaras e álcool em gel, o distanciamento social e a vacinação”, reforça o instituto.

Conteúdo semelhante também foi verificado pelos sites Aos Fatos e Agência Lupa.

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