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Estado de Minas CHECAMOS

Imagem não prova que vacinas contra COVID-19 alteram células sanguíneas

Fotos de hemácias não têm relação com publicações, que não compartilham metodologia da análise nem apresentam "informação científica"


29/06/2021 19:55 - atualizado 05/07/2021 09:46

Quatro imagens que supostamente mostram, através da lente de um microscópio, a transformação de células sanguíneas após a aplicação de uma vacina contra a covid-19, foram visualizadas milhares de vezes em redes sociais ao menos desde o último dia 8 de junho.

No entanto, especialistas consultados pela AFP explicaram que as fotos de hemácias não têm relação com os imunizantes contra o coronavírus e que as publicações, que não compartilham a metodologia da análise, não apresentam “nenhuma informação científica”.
“ANÁLISE DO SANGUE DE UMA PESSOA VACINADA”, começa uma das publicações compartilhadas no Facebook (1, 2, 3) e Twitter.

O texto, que também foi visualizado mais de 24 mil vezes no Telegram, continua: “Tenho uma amiga que é Microscopista de Nutrição. Ela é uma especialista em seu campo e me ajudou imensamente. Ela tem muitos clientes que tomaram a chamada vacina e pediram que fizessem uma análise de sangue gratuita. Para seu horror absoluto, isso é o que ela viu”.

A mensagem explica, em seguida, que a imagem vista na parte superior das publicações é de “células sanguíneas completamente saudáveis %u200B%u200Bantes da injeção”, que teriam mudado “drasticamente” no dia seguinte. “A terceira imagem (centro inferior) mostra inúmeras nanopartículas estranhas (manchas brancas) que aparecem no sangue logo após a injeção”, afirma. 

O texto conclui que pessoas vacinadas contra a covid-19 nunca poderão se “desintoxicar” do efeito supostamente visto nas imagens e que “eventualmente, essas nanopartículas entrarão em todas as células do seu corpo”.

Mensagem semelhante acompanhada das mesmas imagens também circula em espanhol, inglês e francês.

Vacinas contra a covid-19


Embora as publicações não especifiquem qual vacina teria sido exposta à análise citada, atualmente existem quatro tipos principais de imunizantes contra a covid-19: as vacinas virais, as de vetores virais, as feitas com base em ácido nucleico e as proteicas.

As vacinas de RNA mensageiro (mRNA) são aquelas cuja tecnologia está sendo utilizada pela primeira vez de maneira maciça, o que potencializou o surgimento de desinformação.

Essa técnica consiste em injetar uma molécula de mRNA, que contém o código genético de uma proteína do SARS-CoV-2, para que as células do paciente a identifiquem e produzam os antígenos do vírus, desencadeando uma resposta imunológica do corpo.



A equipe de checagem da AFP já verificou afirmações falsas ou enganosas sobre as vacinas contra a covid-19, como as alegações de que elas modificariam o código genético das pessoas, gerariam doenças autoimunes, provocariam atração magnética ou levariam os imunizados à morte.

O que mostram as fotos?


As quatro imagens compartilhadas nas redes mostram um esfregaço de hemácias, um exame de laboratório que consiste em coletar uma amostra de sangue e espalhar uma gota em uma lâmina de microscópio para analisar a qualidade e quantidade de células sanguíneas do paciente.

Normalmente, “olhamos as hemácias depois do esfregaço de sangue e da coloração de MGG (May-Grünwald Giemsa)”, explicou à AFP no último dia 21 de junho, Chloé James, especialista em Hematologia e Hemostasia do Hospital Universitário de Bordeaux na França.

Uma hemácia saudável normalmente tem um formato de disco bicôncavo e um centro claro, visível em branco, que carece de núcleo. Os glóbulos vermelhos permitem transportar o oxigênio dos pulmões aos diferentes tecidos do corpo.

Para os especialistas consultados, a segunda imagem que compõe as publicações viralizadas é a que mais se assemelha a um esfregaço de hemácias saudáveis. No entanto, o texto compartilhado nas redes garante que essa imagem mostra que “as células sanguíneas mudaram drasticamente” após a vacina.

“Dependendo do ambiente em que os glóbulos vermelhos são ressuspensos, ocorrem trocas de água e os glóbulos vermelhos podem mudar de forma, se tornando muito redondos, como na primeira foto, normais como na segunda, ou desidratados como na quarta foto”, continuou Chloé James, sinalizando que essas imagens não têm “relação com a vacina”
Captura de tela feita em 30 de junho de 2021 de uma mensagem no Telegram
Captura de tela feita em 30 de junho de 2021 de uma mensagem no Telegram

Na terceira imagem, é difícil identificar com precisão o que são as manchas brancas observadas, afirmou a bióloga James. No entanto, ela explicou que “certamente não são nanopartículas”.

De fato, nestas imagens os glóbulos vermelhos são observados com a lente de um microscópio óptico, e não com um microscópio eletrônico. A resolução de um microscópio óptico é baixa demais para ver partículas lipídicas, as nanopartículas utilizadas nas vacinas de mRNA para encapsular o material genético e que não são necessariamente perigosas ou tóxicas, como detalharam especialistas neste artigo da AFP.

Na quarta imagem vê-se diferentes formas espinhosas que são, de acordo com algumas das postagens em espanhol, prova de que as células “suaves e simétricas” foram “cobertas de caroços e protuberâncias” após a aplicação da vacina contra a covid-19.

Para Véronique Vergé, especialista do departamento de Biologia e Patologias Médicas do Centro Gustave Roussy, esse aspecto lembra os equinócitos, uma forma de membrana celular anormal dos glóbulos vermelhos caracterizada por projeções espinhosas regularmente espaçadas.

“Os equinócitos são encontrados em várias doenças como insuficiência renal, úlceras hemorrágicas e câncer de estômago, certas doenças hepáticas…”, ou “quando as lâminas do microscópio estão mal preparadas”, indica o laboratório de análises médicas Biron em seu site, sem mencionar a injeção de mRNA ou qualquer outra vacina contra a covid-19.

Os especialistas entrevistados também destacaram que a mensagem que acompanha as fotos não possui nenhuma informação sobre sua origem, sobre a técnica de imagem utilizada ou sobre o contexto em que foram tiradas.

“Isso não é um artigo científico, não há indicação sobre a metodologia ou outra. Isso é suficiente para dizer que as informações não têm nenhum valor”, apontou a bióloga Véronique Vergé.

Em todo o mundo, as vacinas contra a covid-19 são objeto de uma fase de farmacovigilância reforçada para acompanhar de perto seus efeitos colaterais, como faz a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Sistema de Notificação de Eventos Adversos da Vacina nos Estados Unidos, a Agência Nacional de Segurança de Medicamentos na França e a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) em todo o continente europeu.

Até 30 de junho de 2021, mais de 2,915 bilhões de doses de vacinas contra a covid-19 já haviam sido administradas a nível global, segundo a Organização Mundial da Saúde.

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