Publicações que mostram a fotografia de uma grande manifestação como se tivesse sido registrada em Cuba em 11 ou 17 de julho durante atos realizados por apoiadores do governo de Miguel Díaz-Canel foram compartilhadas dezenas de vezes nas redes sociais desde o último 18 de julho. Mas isso é falso. Trata-se de uma montagem feita com duas imagens de 1º de maio de 2017 em Havana, durante uma mobilização pelo Dia Internacional dos Trabalhadores.
“O omelete virou! O verdadeiro povo nacionalista Livre, digno e soberano de Cuba saiu para tomar às ruas em defesa de sua Revolução junto com seu Presidente Diaz Canel à cabeça contra o golpe estadunidense”, indicam as legendas das postagens compartilhadas no Facebook (1, 2) desde 18 de julho de 2021.
Alegação semelhante também circulou em espanhol.
Leia Mais
Atleta transgênero na Olimpíada de Tóquio: o que se sabe sobre “vantagem competitiva”A Nasa paga voluntários para que se mantenham ativos na cama, não apenas para dormirTeste sorológico não é recomendado para avaliar imunidade adquirida com vacinas contra a covid-19Estudo de 'Oxford' sobre ivermectina contra COVID-19 não é definitivoDiante dessa situação, o presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, convocou seus apoiadores para irem às ruas e enfrentar “as provocações”.
Após esse chamado, diversos grupos a favor do governo se mobilizaram em diferentes pontos de Havana. A imagem viralizada, contudo, não mostra um desses atos.
A montagem
Em português, o conteúdo compartilhado nas redes sociais mostra uma imagem vertical. Em espanhol, no entanto, há publicações que mostram duas imagens separadas, o que permitiu observar que se tratava de uma montagem.
Uma busca reversa no Google pela imagem vertical mostrou como resultado este artigo do meio de comunicação cubano “La Demajagua”, com data de 1º de maio de 2018. Nele há uma imagem em que se vê apenas a parte superior da foto viralizada, com a legenda, traduzida do espanhol: “Vista aérea do desfile pelo Primeiro de Maio, Dia Internacional dos Trabalhadores, na Praça da Revolução José Martí, em Havana, Cuba, em 1º de maio de 2017, ACN FOTO/Abel Padrón Padilla”.
Uma pesquisa pelos termos “1º de maio de 2017 %2b ACN” no Google, por sua vez, levou a este texto da Agência Cubana de Notícias (ACN), de 1º de maio de 2017, intitulado “Repercussão internacional pelo Primeiro de Maio em Cuba”, e que inclui a foto viralizada nas redes sociais. Entre os fotógrafos creditados no artigo está o nome “Abel”.
O departamento de fotografia da ACN confirmou à equipe de checagem da AFP que a imagem foi registrada por Abel Padrón Padilla naquele dia. O fotógrafo, por sua vez, também assegurou à AFP ser o autor.
Uma segunda busca reversa, dessa vez pela parte inferior da imagem viral, onde se vê uma multidão segurando um tecido com os rostos de Fidel e Raúl Castro, mostrou como resultado uma foto no banco de imagens Alamy. O registro é semelhante, embora feito de um ângulo inclinado e com um enquadramento menor. No site vê-se a foto dos agora ex-presidentes cubanos e, atrás, pessoas usando uniformes marrom.
A legenda também diz que se trata do desfile pelo Dia Internacional dos Trabalhadores em Havana, em 1º de maio de 2017.
Em outra pesquisa, foi encontrada uma matéria publicada pelo periódico Granma do mesmo dia com uma galeria de fotos que inclui duas cenas muito semelhantes ao visto na parte inferior da imagem viral. As fotos, creditadas a Juvenal Balán, têm um enquadramento mais amplo, que permite identificar as duas bandeiras, além de outros elementos.
Na transmissão oficial desse desfile é detalhado, a partir de 10 minutos e 40 segundos, que o ato foi realizado da Avenida Paseo até a Praça da Revolução.
Esta foto da AFP desse dia mostra como a avenida, ao longo da qual os manifestantes estavam caminhando, não é completamente reta como parece nas imagens que foram compartilhadas nas redes sociais, mas tem uma curva para a direita que se estende sobre um viaduto.
No canto inferior esquerdo da foto da AFP, por sua vez, pode ser visto um gradil amarelo que impede a passagem de pessoas. Na imagem superior das publicações viralizadas, este gradeamento não é visível e as pessoas se estendem além de seu limite.
No último dia 17 de julho, quando o governo cubano mobilizou novamente os seus partidários, eram ouvidas nas ruas de Havana frases como “Abaixo os Yankees!”, “Nascemos para vencer e não para sermos vencidos!” e “Para qualquer coisa, Canel, para qualquer coisa”, em referência ao presidente.