Jornal Estado de Minas

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Suécia zerou mortes por covid-19, mas é incorreto atribuir o dado a um só fator, segundo especialistas


 

Publicações que afirmam que a Suécia teria zerado o número de mortes por covid-19, mesmo tendo sido “ridicularizada” pela estratégia de não aplicação de lockdowns, têm circulado nas redes sociais, ao menos, desde 24 de julho de 2021. As alegações, compartilhadas mais de 3.500 vezes, são, no entanto, enganosas e omitem o fato de que o país já tem uma parcela significativa da população vacinada. Especialistas destacaram à AFP a importância da imunização para a diminuição do número de óbitos e afirmaram que, até o momento, não é possível garantir quais estratégias foram responsáveis pela queda dessa taxa. De acordo com dados oficiais, mais de 50% da população da Suécia está imunizada.





“Suécia é o contraponto de uma Europa assustada e desinformada. Mostra que é possível reduzir mortes sem lockdown e o ‘fique em casa’ indiscriminado! É a prova concreta que outro mundo é possível”, indica uma das postagens no Twitter (1, 2, 3)

“VIVA A SUE%u0301CIA: Pai%u0301s foi sa%u0301bio ao na%u0303o seguir o lockdown maluco de uma ‘cie%u0302ncia’ ainda na%u0303o comprovada. Em vez de isolamento sem critérios, a Suécia adotou o distanciamento social como alternativa, sem abrir ma%u0303o das liberdades individuais e comerciais em empresas, escolas e templos religiosos (...), afirma um usuário no Facebook (1, 2).

Desde o início da pandemia, as estratégias de controle epidemiológico adotadas pela Suécia têm sido alvo de discussões. O país não optou pela implementação de lockdowns, adotando medidas menos rígidas do que as de outros países europeus.

A Suécia enfrentou a sua pior fase da pandemia entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021. No dia 29 de dezembro, por exemplo, o país registrou 32.485 novos casos de covid-19, de acordo com os dados oficiais coletados pela AFP. Com o avanço do vírus, a Suécia aprovou em 8 de janeiro uma nova lei que deu ao governo a possibilidade de reforçar algumas regras.



Em março de 2021, a Suécia chegou a restringir o número de pessoas em lojas e academias, assim como o horário de fechamento de bares e restaurantes, que deveria ser até as 22H30. No dia 1º de julho de 2021 o governo flexibilizou as medidas.

Mortes por covid-19


Segundo a plataforma Our World in Data, até 31 de julho, a Suécia acumulava 14.655 mortes por covid-19. O número de óbitos por milhão do país se manteve inferior ao da Itália, Espanha e Portugal desde o fim de janeiro de 2021.

Já na comparação com os vizinhos Dinamarca, Finlândia e Noruega %u23BC onde foram adotadas medidas mais rígidas de combate à pandemia %u23BC, a Suécia apresenta o maior número de mortes desde, praticamente, o início da pandemia. Até 3 de agosto, a Dinamarca registrava um acumulado de 2.550 óbitos por covid-19, enquanto a Noruega registrou 799 e a Finlândia, 982 até 28 de julho.



No acumulado de mortes por milhão de habitantes, a Suécia também tem o índice mais alto entre os quatro países:

Apesar dos números superiores aos dos vizinhos, a partir de junho de 2021, a Suécia apresentou uma queda considerável no registro de mortes diárias por covid-19 e chegou a computar a não ocorrência desse tipo de óbito por alguns dias, de acordo com os coletados pelo projeto Our World in Data, da Universidade de Oxford:

Com esses resultados, em junho de 2021 o governo voltou a flexibilizar as orientações. Revogou, por exemplo, a diminuição de horário de fechamento de bares e restaurantes e possibilitou reuniões de até 50 pessoas em espaços fechados. Mas o relaxamento das medidas vem sendo acompanhado de um aumento no número de novos casos, que saiu de uma média de 210 em 30 de junho para 463 em 1 de agosto.

De acordo com dados oficiais, no último 4 de junho, 47% da população do país já tinha tomado a primeira dose da vacina e 20% estava totalmente imunizada. Até 30 de julho, a Suécia tinha mais de 78% da população vacinada com a primeira dose, e 51% havia recebido as duas doses.

O número de mortes por covid-19 caiu drasticamente a partir de 24 de junho de 2021, quando o país registrou três, segundo os dados coletados pela AFP. Desde então, a Suécia não teve ocorrência de mortes por diversos dias. Nesse momento, o país tinha 55% da população vacinada com a primeira dose, 33,2% com a segunda dose, e medidas como restrição no número de pessoas em lojas e academias, assim como limitação do horário de fechamento de bares e restaurantes às 22h30.



Ali Mirazimi, membro da Agência de Saúde Pública da Suécia e professor do Karolinska Institutet, afirmou ao Checamos que essa ocorrência “muito provavelmente se deve às estratégias de vacinação que tínhamos (começar com os idosos e aqueles com fatores de risco e seguir para outros grupos)”. O professor acrescentou que a porcentagem de pessoas já vacinadas e o fato de a maioria da população ter seguido as restrições podem ter contribuído para o resultado.

Apesar disso, Mirazimi afirma ser necessário “esperar antes de comparar diferentes estratégias”. Isso porque, para ele, cada estratégia teve suas vantagens e desvantagens, e “podem ter um efeito de longo prazo”.

Julival Ribeiro, infectologista consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e diretor geral do Hospital de Base do Distrito Federal, também pondera que a queda recente no registro de óbitos na Suécia se deve a vários fatores.



À AFP, o médico destacou a importância da vacinação em massa da população. “Vamos pegar o Reino Unido, por exemplo, que mesmo vacinando em massa a população manteve o lockdown e medidas restritivas por meses. E só após isso começou a ter impacto. Então não podemos considerar um caso isolado como o da Suécia. Além do que, a Suécia hoje tem uma grande parcela da população totalmente vacinada, e isso é muito importante. A melhor arma para evitarmos a covid-19 é através da vacinação”, disse.

que a estratégia não foi a estratégia correta. E além disso, a Suécia é um país pequeno e você pode até ter mais controle. imagine países com milhões de pessoas. (...) Naquela época em que a Suécia adotou essas medidas nós sabíamos pouco em relação à covid-19. Mas o mundo mostrou que o caminho para combater essa pandemia é aliar vacina, medidas restritivas e medidas preventivas”, acrescentou o infectologista.
Enfermeira aplica vacina contra a covid-19 em uma casa de repouso em Nicopinga, Suécia, em 27 de dezembro de 2020 ( AFP / Jonathan Nackstrand)

“Responsabilidade individual”


Diferentemente de outros países europeus que adotaram medidas mais rígidas de restrição de mobilidade, a estratégia da Suécia para conter a disseminação da covid-19 tem como base aresponsabilidade individual de seus cidadãos. Segundo a Agência de Saúde Pública do país, as pessoas são orientadas a manter o distanciamento social, evitar aglomerações e, caso apresentem sintomas, ficar em isolamento.



“Todos têm uma responsabilidade pessoal em prevenir a transmissão da doença. Você deve pensar em como evitar se infectar, em como manter distância e em como evitar infectar outras pessoas. Tenha consideração, especialmente com aqueles que são do grupo de risco”, diz o site da agência.

Em uma entrevista à revista científica Nature publicada em abril de 2020, Anders Tegnell, epidemiologista-chefe do governo sueco, detalhou a estratégia adotada pelo país:

“Como sociedade, estamos mais focados em ‘dar um incentivo’: continuamente lembrando as pessoas de colocar em prática as medidas , e melhorando-as onde vemos no dia a dia que elas precisam ser ajustadas. Não precisamos fechar tudo completamente porque seria contraproducente”, afirmou.
Uma mulher aguarda o ônibus em 7 de janeiro de 2021, em Estocolmo ( AFP / Jonathan Nackstrand)


Segundo pesquisas conduzidas pela Agência Sueca de Contingências Civis (MSB), em junho de 2020, oito em cada dez suecos afirmaram estar seguindo as recomendações contra a covid-19.



A abordagem adotada pelo país europeu, no entanto, foi criticada por integrantes da comunidade científica. Em abril de 2020, em um artigo publicado no jornal sueco Dagens Nyheter, 22 pesquisadores afirmaram que as autoridades públicas de saúde haviam falhado no combate à pandemia e que os políticos deveriam interferir.

Em dezembro de 2020, o rei da Suécia, Carlos XVI Gustavo, disse em uma entrevista: “Acredito que falhamos”, ao se referir à gestão da pandemia.

Desde o início da pandemia, a AFP já checou diversos conteúdos a respeito da adoção de lockdowns em diferentes localidades (1, 2, 3).





 

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