Jornal Estado de Minas

CHECAMOS

É enganoso que as fotos de pessoas 'atendidas no chão' sejam de 2013


 

Uma combinação de três imagens de pessoas deitadas em macas e aglomeradas em corredores ou no chão de um hospital foi compartilhada mais de 39 mil vezes nas redes sociais desde maio de 2020. As postagens afirmam que as cenas são de 2013, “quando Lula era presidente”. Mas as imagens datam de 2010 e 2014, e uma delas pode ser encontrada online pelo menos desde 2019.





“MEU DEUS AS PESSOAS ESTÃO SENDO ATENDIDOS NO CHÃO!!! CALMA PESSOAL ESSA CENA É 2013 QUANDO LULA ERA PRESIDENTE E NÃO HAVIA CORONA VÍRUS”, diz o texto que acompanha as três fotografias no Facebook (1, 2, 3), no Instagram (1, 2, 3) e no Twitter (1, 2, 3).

A primeira imagem mostra pessoas deitadas em macas e aglomeradas, no que parece ser a entrada de um hospital. A segunda, à esquerda, exibe uma paciente deitada no chão, enquanto na foto da direita observa-se o corredor de um centro médico com diversas macas enfileiradas.

Em 2013, data mencionada nas postagens, quem chefiava o país era Dilma Rousseff (2011-2016), do Partido dos Trabalhadores (PT), não Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).



As publicações começaram a circular em maio de 2020, quando o Brasil já enfrentava a pandemia de covid-19 e diversos casos de lotação de leitos e hospitais (1, 2). Na época, a Fiocruz publicou um boletim da situação epidemiológica nas duas semanas anteriores, cujos números mostraram uma média diária de 59 mil casos e de 2,5 mil óbitos como consequência da doença.

Macas do lado de fora do hospital

Uma busca reversa pela imagem no Google levou a uma publicação de 7 de abril de 2010 no blog “Paulo Vasconcelos - Renovando com Ética e Fé”, à época vereador eleito por Sobral, no Ceará. Intitulado “Fogo no IJF – Instituto Doutor José Frota”, o texto é ilustrado por essa imagem de pessoas em macas, e este foi o registro mais antigo dessa foto encontrado pela equipe de checagem da AFP.

De acordo com o texto, houve um “incêndio e apagão nessa noite de terça-feira no Instituto Doutor José Frota (IJF)”

Em seu artigo, Vasconcelos cita o vereador de Fortaleza Plácido Filho, que fez críticas à gestão da então prefeita Luizianne Lins: “Nunca na história dessa cidade vimos uma situação de guerra como presenciamos no IJF. O que aconteceu foi resultado do descaso da Prefeitura com aquele hospital, que é referência no Nordeste e a maior emergência do Ceará”.



Para confirmar o contexto da fotografia, o Checamos entrou em contato com a assessoria de imprensa do Instituto Doutor José Frota, que esclareceu que a “ocorrência foi registrada em 2010”.

O caso foi noticiado por veículos de comunicação (1, 2, 3) que informaram que o incêndio começou na tarde de 6 de abril de 2010, quando um curto-circuito provocou problemas no fornecimento de energia do hospital, levando a um apagão.

No portal do governo do Ceará uma nota da Secretaria da Saúde  menciona que o incêndio ocorrido no IJF se deu por uma pane no sistema elétrico após um curto-circuito danificar dois capacitores.  

Ainda segundo registros de imprensa da época, alguns pacientes da emergência e das áreas afetadas precisaram ser levados à área externa, assim como médicos e pessoas em condições de andar.

O Instituto Doutor José Frota não é de responsabilidade do governo federal, mas do governo municipal. Em 2011, durante uma sessão na Câmara Municipal, um vereador sugeriu que a prefeitura de Fortaleza deixasse o IJF sob o comando do governo estadual, ao fazer uma série de críticas à então prefeita Luizianne Lins, do PT.



Paciente atendida no chão


Uma busca reversa no Google pela imagem de uma paciente deitada no chão de um hospital levou a uma reportagem publicada no site do jornal O Globo em fevereiro de 2014 e intitulada “Pacientes são atendidos no chão na emergência do Salgado Filho”.

Ilustrada com a mesma foto de uma mulher deitada no chão, a matéria afirma que havia casos de pessoas sendo atendidas também em bancadas de armários e que as cenas foram “registradas por profissionais de saúde do Hospital Municipal Salgado Filho” e “enviadas ao Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj)”.

O Checamos entrou em contato com o Cremerj, mas não obteve retorno até a publicação deste artigo.

Uma segunda pesquisa, dessa vez pelas palavras-chave “pacientes %2b chão %2b Salgado Filho”, levou a reportagens publicadas pelo portal R7 (1, 2, 3) que abordam o mesmo problema de superlotação enfrentado pela unidade de saúde e igualmente utilizam a fotografia de uma paciente deitada no chão.



A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) do Rio de Janeiro confirmou ao Checamos, por meio de sua assessoria de imprensa, que “a foto refere-se a um fato pontual ocorrido em 2014”, mas que “não houve atendimento de paciente no chão”.

Assim, como no caso do IJF, o Hospital Salgado Filho é de responsabilidade do governo municipal, como informado pela SMS, não do governo federal. 

Macas no corredor


Uma busca reversa no Google pela terceira foto, de pessoas deitadas em macas no que parece ser o corredor de um hospital, levou a dois registros de 2019, mas que não fornecem qualquer detalhe sobre o local, contexto ou a data em que  foram feitos.

No primeiro resultado, a imagem aparece em um portal da rádio Multisom Ubaense, que replicou uma matéria da Agência Brasil intitulada “Conselho Federal de Medicina vê irregularidades em hospitais públicos”. A foto, contudo, não consta como ilustração do texto original. Segundo o site da Multisom Ubaense, “a imagem da capa do site Multisom foi retirada de arquivos da internet/Google”.



O segundo site que utilizou a fotografia em questão, também em 2019, é o Trata Brasil, que se descreve como um “blog sobre saneamento básico”. A imagem não ilustra nenhum texto e leva como nome apenas “hospital-brasil”.

O Checamos realizou uma pesquisa por palavras-chave como “leitos %2b hospital %2b corredor” e “macas %2b hospital %2b corredor”, mas não conseguiu encontrar a origem da imagem.

 

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