Jornal Estado de Minas

CHECAMOS

Café com limão para perder peso: uma tendência ineficaz e até perigosa

Uma receita que combina café com limão para emagrecer foi compartilhada centenas de vezes nas redes sociais desde, pelo menos, 6 de julho de 2021.

Mas essa mistura, que supostamente queima a gordura “de forma rápida e eficaz”, nunca teve resultados cientificamente comprovados, disseram especialistas à AFP.



Eles alertaram ainda que receitas assim podem ser perigosas para a saúde e levar a distúrbios alimentares, especialmente em adolescentes.

“QUER EMAGRECER. ? Café com limão. A combinação poderosa que emagrece e queima gordura”, compartilhou um usuário no Facebook. A receita também foi difundida em publicações no TikTok, YouTube e em sites (1, 2).


Conteúdo semelhante também circulou em espanhol, francês e inglês.

"Roleta nutricional"


Embora estudos tenham indicado que o café e o limão têm benefícios individuais para a saúde, não há evidências científicas de que sua combinação ajude a perder peso, de acordo com especialistas médicos e nutricionistas consultados pela AFP.



"Café, quente ou frio, nunca fez você perder peso", disse à AFP o professor Pierre Dechelotte, presidente da Sociedade Francófona de Nutrição Clínica e Metabólica. “Estimula os batimentos cardíacos e faz com que você gaste um pouco mais de energia. Muito café também pode causar insônia e até mesmo problemas cardíacos. Já o limão é rico em vitamina C e é antioxidante, mas não tem o menor efeito na perda de peso”, acrescentou.

A combinação desses ingredientes em uma bebida pode ser "agressiva para as membranas mucosas" e causar "distúrbios digestivos, além de causar uma notável interrupção da fome", afirmou. “É uma roleta nutricional usar esse tipo de mistura”, alertou o especialista.

Cécile Bétry, médica e pesquisadora de nutrição, concordou quando consultada pela AFP: "Não há absolutamente nenhuma base científica para dizer que haveria um benefício para a perda de peso com uma meta significativa de emagrecimento ao misturar os dois".



“Essa combinação está se tornando cada vez mais popular nas redes sociais, por mais prejudicial que possa ser para o trato digestivo, aumentando a azia e podendo gerar ou aumentar sintomas como refluxo, diarreia e danos à flora intestinal”, também disse à AFP Micaela Remuzzi, nutricionista, e que trabalha nos centros de saúde DIM na Argentina.

Perda de peso

"Se uma dieta normal for substituída por essa mistura, se induzirá uma restrição calórica que será, de fato, responsável pela perda de peso", disse à AFP Béatrice Dubern, pediatra e nutricionista do Hospital Armand-Trousseau, em Paris.
Funcionários públicos participam de um programa governamental de atividade física e alimentação saudável na Cidade do México, em 20 de julho de 2010 ( AFP / Alfredo Estrella)

Nesse sentido, muitos usuários afirmam fazer apenas uma refeição por dia para "otimizar" seus resultados. Ao restringir a ingestão dessa forma, há "possivelmente uma perda rápida de massa magra, o que é perigoso e acarreta o risco de desnutrição", alertou a especialista.



Bétry coincide com Dubern, argumentando que, nesse caso, o corpo perde "músculo, e não gordura".

Em agosto de 2020, o Ministério da Saúde da Colômbia publicou um relatório sobre “por que as dietas pela internet são um risco à saúde”. Entidades como a Sociedade Argentina de Nutrição (SAN) e a Sociedade Francesa de Nutrição Clínica e Metabolismo (Anses, na sigla em francês) fizeram artigos semelhantes explicando que regimes alimentares para emagrecer praticados sem acompanhamento médico, como os viralizados nas redes sociais, podem ser arriscados para a saúde.

Na verdade, embora esses métodos possam parecer eficazes no início, a perda de peso que eles podem causar muitas vezes não é sustentável a longo prazo. “As pessoas, ao se depararem com o fracasso, são expostas a inúmeras práticas de risco para a saúde”, indica a SAN, e alerta: “O que as dietas da moda têm em comum? Elas são uma solução temporária para uma condição que geralmente é crônica”

A Anses adverte que os desequilíbrios causados por pelo menos 15 regimes muito populares na internet estão associados até ao ganho de peso por efeito rebote e riscos à saúde óssea, ao sistema cardiovascular e aos rins.



"Muito provavelmente o risco é o efeito ioiô com um retorno de peso maior do que a perda de peso no final dessa dieta", afirmou a pediatra e nutricionista Dubern.

Entre os perigos e efeitos colaterais “das 'dietas' disponíveis na web, que não têm aval de profissional”, o Ministério da Saúde da Colômbia cita deficiências de micronutrientes (vitaminas e minerais) e sintomas associados, como queda de cabelo, enfraquecimento das unhas, tontura, problemas gastrointestinais, aumento do risco cardiovascular e distúrbios hepáticos, ósseos ou renais e distúrbios comportamentais inclusive da conduta alimentar, entre outros.

Para emagrecer, os profissionais recomendam consultar um especialista, que estabelecerá um diagnóstico e métodos eficazes que não ofereçam perigo.

Eles também apontam que muitas vezes os jovens têm uma visão distorcida de seu corpo na puberdade e muitos optam por métodos drásticos: "Tentar perder peso por razões estéticas é a porta de entrada para distúrbios alimentares graves como bulimia, anorexia ou obesidade", alertou à AFP Claire Carette, médica nutricionista e diabetologista do Hospital Europeu Georges-Pompidou, em Paris.

“Uma única infusão não altera o que consumimos ao longo do dia. Ou seja, para reduzir o peso, devemos levar em conta os alimentos que escolhemos, priorizar os naturais, aumentar a atividade física e não esquecer de beber água”, enfatizou a especialista argentina Remuzzi.



Sobrepeso e obesidade

Em um relatório de junho de 2021 sobre obesidade e sobrepeso, considerados epidêmicos por seu alcance mundial, a Organização Mundial da Saúde (OMS) indicou que “em 2016 mais de 1,9 bilhão de adultos com 18 anos ou mais estavam com sobrepeso, dos quais mais de 650 milhões eram obesos”, o que significa que 39% das pessoas com mais de 18 anos de idade tinham sobrepeso e que 13% eram obesas.

Um relatório do Unicef de setembro de 2021 indica que na América Latina “3 em cada 10 crianças e adolescentes entre 5 e 19 anos estão acima do peso”.
( AFP / John Saeki, Aude Genet, Maria-Cecilia Rezende)

A OMS também aponta que “a maioria da população mundial vive em países onde o sobrepeso e a obesidade ceifam mais vidas do que a insuficiência ponderal”, ou seja, baixa relação peso/idade, as duas faces da desnutrição.





audima