Poucas horas após o acidente de avião que levou à morte da cantora de música sertaneja Marília Mendonça e de mais quatro pessoas, em Caratinga, Minas Gerais, em 5 de novembro de 2021, usuários passaram a compartilhar um áudio do que seriam as “últimas palavras” do piloto da aeronave.
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No áudio, de cerca de 1 minuto e 20 segundos, dois homens conversam sobre um episódio ocorrido no “Parque das Cataratas”, quando são interrompidos por ruídos externos. Em seguida, é possível ouvir exclamações de nervosismo e uma pessoa pedindo repetidamente por calma.
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Nem todas as publicações viralizadas mencionam Marília Mendonça, mas a gravação começou a ser compartilhada pouco após ser noticiado que um avião que transportava a cantora, de 26 anos, havia caído em Caratinga, Minas Gerais, onde a artista faria um show no último dia 5 de novembro.
Marília não sobreviveu à queda, assim como as outras quatro pessoas que a acompanhavam no bimotor modelo Beech Aircraft. “A voz da Marília”, lamentou um usuário em uma das publicações que difundem o suposto áudio do acidente.
Em outros comentários, no entanto, internautas apontaram que a gravação não seria do avião da cantora, mas da queda da aeronave que operava o voo 1907 da Gol, em 29 de setembro de 2006.
Nessa data, o Boeing 737-8E decolou do aeroporto de Manaus com destino ao Rio de Janeiro, mas colidiu no ar com um jato Legacy, que ia na direção contrária, caindo sobre a terra indígena Capoto-Jarinã, no Mato Grosso. Nenhum dos 154 passageiros da aeronave sobreviveu.
Gravação antiga
De fato, uma busca no Google pelas palavras-chave “caixa preta” e “voo 1907” leva a diversos registros antigos do áudio agora atribuído ao acidente envolvendo a cantora.
Publicações feitas no YouTube (1, 2, 3) e Facebook entre 2012 e 2018 trazem uma versão mais longa da mesma gravação, garantindo que as palavras foram retiradas da caixa-preta do avião da Gol que colidiu em setembro de 2006.
A equipe de checagem da AFP não conseguiu localizar uma transcrição oficial da caixa-preta do voo 1907, mas o relatório final do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos da Força Aérea Brasileira sobre o episódio, publicado em 2008, traz uma descrição semelhante ao áudio compartilhado nas redes sociais.
“Não foi registrado pânico por parte dos pilotos no CVR, o SIC do PR-GTD perguntou o que teria ocorrido e o PIC respondeu não saber, mas pediu calma por várias vezes. Por várias vezes o PIC pediu calma, possivelmente, por imaginar ter a aeronave entrado em atitude anormal, situação em que seria necessário atuar nos comandos para trazê-la novamente ao vôo reto, nivelado e estabilizado”, diz o documento.
Uma reportagem publicada pela revista Piauí, em junho de 2011, sobre o acidente do avião da Gol também menciona conversa parecida com a que pode ser ouvida na gravação viralizada.
“– O que aconteceu? – o CVR registrou a pergunta agoniada do comandante. – Ai, meu Deus do céu – limitou-se a gemer o copiloto.– Calma, calma – Décio Chaves fez das tripas coração para manter o autocontrole, enquanto o som dos alarmes aumentava de intensidade. – Aiii! – um último grito de desespero foi seguido, na captação dos microfones da caixa-preta, pelo ruído forte de deslocamento de ar”, relata a matéria.
O AFP Checamos entrou em contato com a Força Aérea Brasileira e com o Corpo de Bombeiros do Mato Grosso para confirmar a origem do áudio compartilhado nas redes, mas não obteve retorno até a publicação deste artigo.
No último 6 de novembro, milhares de brasileiros se reuniram do lado de fora do Ginásio Goiânia Arena, em Goiás - onde foi realizado o funeral de Marília Mendonça -, para prestar homenagem e se despedir da cantora.
O AFP Checamos também verificou um vídeo incorretamente atribuído ao acidente envolvendo a cantora.