Publicações afirmando que o presidente Jair Bolsonaro votou contra a lei do “piso do magistério” enquanto era deputado federal foram compartilhadas mais de 7 mil vezes desde o final de janeiro de 2022, após o anúncio de que o governo reajustou o piso salarial dos professores em 33,24%.
Mas uma consulta às comissões das quais Bolsonaro participou enquanto legislador e à ficha de tramitação do projeto de lei em questão não mostraram nenhuma participação do atual mandatário.
“Só lembrando aos desavisados: Quando foi criada e aprovada a LEI DO PISO DO MAGISTÉRIO em 2008, BOLSONARO ERA DEPUTADO E VOTOU CONTRA”, indicam algumas das publicações compartilhadas no Facebook (1, 2, 3), no Instagram (1, 2) e no Twitter (1, 2), inclusive por figuras políticas (1, 2).
A mensagem começou a circular após o governo federal anunciar em 27 de janeiro de 2022 um reajuste de 33,24% no Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica (PSPN).
Segundo explicação no site do governo, “o piso nacional da categoria é o valor mínimo que deve ser pago aos professores do magistério público da educação básica, em início de carreira, para a jornada de, no máximo, 40 horas semanais”.
Esse piso foi instituído pela Lei 11.738 de 2008, sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e citada nas publicações viralizadas.
Projeto de Lei 7.431
Antes de ser transformada na Lei 11.738, o projeto de lei que instituía o piso salarial dos educadores públicos foi o PL 7.431/2006, de autoria do então senador Cristovam Buarque (PDT/DF).A primeira vez que ele foi apresentado em plenário na Câmara dos Deputados foi em 24 de agosto de 2006 para, então, ser remetido às comissões responsáveis para avaliação. Ao todo, quatro comissões permanentes avaliaram o projeto de lei na Câmara: a Comissão de Educação; de Trabalho, de Administração e Serviço Público; de Finanças e Tributação; e a de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Na página de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados, por sua vez, é possível consultar de quais comissões e votações em plenário ele participou ao longo de suas legislaturas, enquanto deputado federal.
Considerando o período de avaliação do PL pela Câmara - de 2006 a 2008 - e a presença de Bolsonaro em comissões nesses períodos, é possível observar que o atual presidente não fazia parte de nenhum dos comitês que avaliaram o projeto que levou à criação da Lei 11.738.
A primeira comissão a analisar o PL foi a de Educação, que o recebeu em 3 de outubro de 2007 e o aprovou no mesmo dia. Naquela data, Bolsonaro não fazia parte dessa comissão. Esse também foi o caso da comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, que recebeu o projeto em 4 de outubro de 2007 e o aprovou em 7 de novembro do mesmo ano.
O mesmo ocorreu nas comissões de Finanças e Tributação - onde o projeto foi recebido em 13 de novembro de 2007 e aprovado em 19 de março de 2008 - e de Constituição e Justiça e de Cidadania, cujo recebimento se deu em 27 de junho de 2008 e o envio ao Senado, após redação final, aconteceu em 1º de julho de 2008.
A presença de Bolsonaro em alguma dessas quatro comissões durante a 53ª legislatura (2007-2011) só se deu em abril de 2009, quando o projeto de lei já havia sido transformado na Lei 11.738 e sancionada pelo ex-presidente Lula.
O Checamos entrou em contato com a Coordenação de Comissões Permanentes da Câmara dos Deputados, que confirmou que na seção de “Presença em Comissões”, analisada pelo Checamos, pode-se “extrair a presença em todas as comissões em que ele [Jair Bolsonaro] registrou frequência e a ausência nas comissões em que ele integrava como titular”.
Quando o PL foi apresentado na Câmara, durante a 52ª legislatura (2003-2007), o então deputado Jair Bolsonaro compunha a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, mas o comitê só analisou o projeto cerca de dois anos depois.
Um projeto de lei é analisado pelas comissões antes de ser votado em plenário, como informa o site da Câmara dos Deputados, mas a assessoria de imprensa da Casa explicou em e-mail ao Checamos que essa “matéria tramitou em caráter conclusivo, ou seja, não precisou ser analisada/aprovada pelo Plenário da Câmara, apenas pelas comissões”.
Além disso, em relação a uma possível votação nas comissões, a assessoria da Câmara ainda indicou que “os projetos de lei são apreciados, como regra geral, pelo processo simbólico de votação – ocasião em que os deputados que forem a favor da matéria são convidados a permanecer como se encontram e os contrários devem se manifestar de alguma forma. Nestes casos, não é possível registrar como cada deputado votou nem o resultado de quantos votaram contra ou a favor”.
Ao Checamos, ainda foi indicado que “no caso do PL 7431/06, como não existia sistema eletrônico de votação nas comissões na época, o resultado das votações em cada comissão está na Ata encontrada nos respectivos links das reuniões”. Uma consulta às atas disponíveis (1, 2) na página do projeto não mostrou o nome de Jair Bolsonaro.
A assessoria complementou: “Somente nas votações nominais (...) é que há o registro individual de votos e é possível saber quantos votaram contra e a favor e como votou cada deputado”.
O AFP Checamos entrou em contato com a Secretaria de Imprensa da Presidência da República, mas não obteve retorno até a publicação deste artigo.