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Surto de hepatite infantil não está ligado à vacina contra covid-19, dizem especialistas

Publicações que afirmam que o surto de hepatite em crianças registrado em vários países está relacionado a vacinas contra a covid-19, citando como evidência um estudo de abril de 2022, foram compartilhadas quase uma centena de vezes nas redes sociais desde 30 de abril de 2022.



No entanto, autoridades de saúde e especialistas consultados pela AFP descartaram a hipótese de que os imunizantes sejam os responsáveis pela doença, já que a maioria dos pacientes diagnosticados é nova demais para ter sido vacinada contra a covid. Além disso, o estudo se refere ao caso de um adulto com um tipo diferente de hepatite.

'Novo estudo confirmando que vacina COVID causa hepatite autoimune grave é publicado dias após a OMS emitir 'alerta global' sobre nova hepatite grave entre crianças', diz uma das publicações compartilhadas no Facebook, no Instagram e no Twitter com links para um site britânico que trata o assunto.

Esses textos na internet citam como evidência um artigo de 21 de abril de 2022 que concluiria que 'a vacinação contra a COVID-19 pode causar hepatite (inflamação do fígado) mediada pelo sistema imunológico'.



A pesquisa aborda um estudo de caso de um homem de 52 anos que desenvolveu hepatite autoimune após infecção e vacinação contra a covid-19. 'As descobertas vêm poucos dias depois que a Organização Mundial da Saúde emitiu um 'alerta global' sobre uma nova forma de hepatite grave que afeta crianças', afirmam algumas publicações.

O conteúdo, compartilhado em páginas na internet e no Telegram, também circula em espanhol e inglês.

Casos de hepatite em crianças

As publicações circulam em meio a notícias de que uma cepa de hepatite grave de origem desconhecida foi diagnosticada em quase 230 crianças em 20 países. Algumas delas morreram em decorrência da doença.



A OMS emitiu um comunicado sobre o assunto em 23 de abril de 2022, no qual destacou que as causas da hepatite em crianças ainda estão sendo investigadas e que, apesar de alguns dos pacientes registrados terem sido infectados pelo coronavírus, as hipóteses relacionadas a efeitos colaterais dos imunizantes "atualmente não se sustentam, pois a grande maioria das crianças afetadas não recebeu a vacina contra a covid-19".

A organização de saúde disse à AFP que "não há nada que sugira um vínculo'.

A Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido (UKHSA) publicou em 25 de abril de 2022 um relatório técnico de uma investigação relacionada ao aumento desses casos de hepatite.

A UKHSA descartou uma ligação entre a vacina e a hepatite aguda em crianças: 'Não se tem conhecimento de que qualquer uma das crianças menores de 10 anos com casos atualmente confirmados no Reino Unido tenha sido vacinada'.



Entre 1º de janeiro de 2022 e 29 de abril de 2022, o Ministério da Saúde espanhol detectou 22 casos de hepatite aguda infantil de origem desconhecida, 16 deles em crianças com idade igual ou inferior a 10 anos e sem vínculo epidemiológico entre eles.

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos também emitiram um alerta 'para notificar médicos e autoridades de saúde pública sobre um grupo de crianças identificadas com hepatite e infecção por adenovírus'. Nove crianças no estado do Alabama afetadas por hepatite testaram positivo para um patógeno comum chamado adenovírus 41, de acordo com um estudo da agência norte-americana de saúde pública publicado em 29 de abril.

'Neste momento, acreditamos que o adenovírus pode ser a causa desses casos relatados, mas outros potenciais fatores ambientais e situacionais ainda estão sendo investigados', explicaram os CDC em um comunicado que acompanha o estudo.



Sobre as alegações de que os casos estão relacionados à vacinação contra a covid-19, a porta-voz dos CDC, Kristen Nordlund, disse: 'As idades dos casos variaram de 11 meses a 5 anos e 9 meses, a maioria dos quais não é elegível para a vacina contra a covid-19'.

Antonio Zapatero, vice-ministro da Saúde Pública da região de Madri, também negou possíveis ligações entre os casos de hepatite aguda em crianças e a campanha de vacinação.

No Brasil, segundo a imprensa, o Ministério da Saúde monitora 16 casos suspeitos, incluindo a morte de um bebê no Rio de Janeiro. Oficialmente, o Ministério da Saúde relatou sete casos sob investigação.



Consultado pela AFP, Pepe Serrano, pediatra de atenção primária e membro do conselho de administração da Sociedade Catalã de Pediatria, assegurou em 9 de maio de 2022 que as publicações viralizadas nas redes sobre esse fenômeno são "totalmente falsas", na medida em que "a maioria dos casos detectados são em crianças menores de cinco anos, que não foram vacinadas contra a covid-19'.

Sobre a origem do surto, Serrano explicou que 'ela ainda não é conhecida. São casos muito chamativos, mas poucos para poder estabelecer uma causa com certeza'.

Tipos de hepatite

Sara Hassan, hepatologista pediátrica de transplantes do Centro Infantil da Clínica Mayo, nos Estados Unidos, disse à AFP que a doença em crianças relatada pelas agências de saúde é diferente da descrita no estudo de abril de 2022 utilizado como evidência para a alegação.

'Este estudo foi sobre o caso de um adulto com o qual se tentou associar as vacinas contra a covid-19 à hepatite autoimune, que é uma entidade diferente e separada' daquela hepatite que afeta crianças, disse Hassan.



Rima Fawaz, diretora médica de hepatologia pediátrica da Faculdade de Medicina da Universidade de Yale, disse que se acredita que a hepatite aguda grave reportada em crianças seja infecciosa, enquanto a hepatite autoimune, diagnosticada no homem do estudo viralizado nas redes, não.

A hepatite autoimune é 'uma desregulação imunológica, onde o corpo tem uma resposta anormal e ataca o fígado', e é tratada através da supressão do sistema imunológico, explicou.

Em contraste, as crianças doentes apresentam sintomas infecciosos como febre e são tratadas de forma diferente, disse Fawaz. A especialista concluiu que as evidências não sustentam a ideia de que o aumento de casos de hepatite pediátrica esteja relacionado aos imunizantes contra a covid-19.



'Afirmar que isso está relacionado à vacinação contra a covid não faz o menor sentido', ressaltou Fawaz.

Na mesma linha, o infectologista John Swartzberg assegurou que o surto de hepatite entre crianças e o único caso de hepatite autoimune encontrado em um homem que foi vacinado contra a covid-19 'não têm qualquer relação' e 'não têm nada a ver entre si'.

Swartzberg, professor emérito da Escola de Saúde Pública da UC Berkeley, disse que o caso de hepatite autoimune do estudo após a vacinação contra a covid-19 "não deve de forma alguma" desestimular as pessoas que hesitam em se vacinar.

O professor de Berkeley também afirmou que os riscos de contrair covid superam em muito os riscos das complicações que podem decorrer da vacina.

Outra alegação do surto de hepatite e sua suposta ligação com os efeitos da vacinação já foi verificada pelo AFP Checamos.



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