Jornal Estado de Minas

CHECAMOS

Discurso de Lula foi tirado de contexto para parecer que chamou pobres de descartáveis

Um vídeo reproduzido mais de 480 mil vezes nas redes sociais desde 25 de junho de 2022 sugere que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria afirmado que pessoas pobres são apenas 'um número' a ser utilizado em campanhas eleitorais.



De acordo com as publicações, ele teria se referido a esse grupo como 'papel higiênico', que após ser usado para fins políticos, seria jogado fora.

Contudo, o trecho foi tirado de contexto. No discurso, ele dizia, na verdade, que a população de baixa renda é vista como um 'número' pela classe política, que, fora do período eleitoral, a deixa 'esquecida'.

'O pobre é um número. Às vezes um número bonito para se utilizar em campanha. Eu, há vinte anos atrás, dizia: 'pobre é utilizado como se fosse papel higiênico. Ah, tem uma baita de uma utilidade na época da eleição, mas depois joga ele fora e esquece'', diz Lula no vídeo, que circula no Facebook (1, 2, 3), Kwai (1, 2, 3), TikTok (1, 2), Twitter (1, 2) e YouTube (1, 2).



O conteúdo também foi enviado ao WhatsApp do AFP Checamos para verificação.

O registro foi compartilhado ainda por políticos, como o vereador Carlos Bolsonaro e a deputada federal Carla Zambelli.

Mas o trecho, de cerca de 20 segundos, foi tirado de contexto.

Buscas reversas na ferramenta Yandex levaram a um vídeo publicado no YouTube por um canal de apoio a Lula em 19 de outubro de 2021 com o título: 'Discurso Histórico De Lula Em 2021!! Dia Mundial Contra A Fome!'.

Uma nova pesquisa, dessa vez por palavras-chave e incluindo termos relativos ao Dia Mundial da Alimentação — 16 de outubro — e ao nome do ex-presidente, permitiu encontrar o discurso na íntegra, publicado em seu canal oficial.



A fala ocorreu durante o Encontro dos Movimentos Sociais do Campo, das Florestas e das Águas, em 14 de outubro de 2021.

Ao assistir ao vídeo completo, de 42 minutos, percebe-se que Lula fazia críticas ao tratamento dado pela classe política à população de baixa renda em comparação com aquele dado a pessoas ricas e instituições.

Em seguida, de forma metafórica, o ex-presidente afirmou que os pobres são usados 'como papel higiênico' — úteis somente durante as eleições e depois, descartados.

A partir dos 33 minutos do registro, ele afirma:

'Eu estava vendo no orçamento, Gleisi ...você, que é especialista no orçamento, me parece que nesse orçamento agora tem R$ 245 bilhões de subsídios para os ricos. E quanto tem para os pobres? Não, o pobre não pode ter porque o pobre é gasto. Você não pode ter o Fies porque você não pode fazer dívida para garantir que uma filha de um trabalhador possa estudar na universidade. Isto é gasto! Não, isso é investimento!', ressalta, se posicionando de forma contrária à perspectiva de que pessoas pobres são 'gastos'.

Ele continua: 'Nenhum presidente, de nenhum país do mundo, se esquece do orçamento das Forças Armadas, (...) do Itamaraty, do orçamento do Ministério Público (...). Mas se esquece de colocar o pobre no orçamento. Porque o pobre não é levado em conta. O pobre é um número. Às vezes um número bonito para se utilizar em campanha. Eu, há vinte anos atrás, dizia: 'pobre é utilizado como se fosse papel higiênico. Ah, tem uma baita de uma utilidade na época da eleição, mas depois joga ele fora e esquece'.

O conteúdo também foi checado pelo Estadão Verifica, Yahoo! Brasil e Projeto Comprova.