Em entrevista concedida ao podcast Flow em 8 de agosto de 2022, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a repetir desinformações sobre a pandemia de covid-19 e os imunizantes criados para combater a doença. Dentre outras alegações, o mandatário disse que as vacinas são experimentais e que 'você não vê criança internada por covid'. Confira a seguir a verificação das principais falas do governante sobre o tema.
'Tiraram de mim o poder de conduzir essas medidas da pandemia': Enganoso
Na fala, o presidente se referia a decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) tomadas em 2020. Na ocasião, a corte entendeu que tanto o governo federal quanto estados, municípios e o Distrito Federal tinham responsabilidade de adotarem medidas relacionadas à pandemia de covid-19.
Em uma decisão de março de 2020, por exemplo, o então ministro Marco Aurélio Mello deixou explícita a competência concorrente de estados e municípios com relação às medidas de enfrentamento, como de isolamento e quarentena. A decisão foi posteriormente acatada em plenário pela corte.
O STF já rebateu em mais de uma ocasião a afirmação de que isso teria impedido a atuação do governo federal na pandemia (1, 2). 'Conforme as decisões, é responsabilidade de todos os entes da federação adotarem medidas em benefício da população brasileira no que se refere à pandemia', resumiu a corte.
"Essa agora é uma vacina experimental': Enganoso
Em verificações anteriores (1, 2), especialistas já explicaram à AFP que não é correto dizer que as vacinas contra covid-19 são experimentais, já que passaram por todas as fases de desenvolvimento para imunizantes, além de diversas etapas de controle.
Dada a emergência sanitária, essas fases foram desenvolvidas simultaneamente e as tecnologias utilizadas foram baseadas em estudos anteriores para o desenvolvimento de vacinas contra a SARS e a MERS, por exemplo.
Por ser um processo rigoroso, e por já haver dados confiáveis coletados sobre os imunizantes em uso no Brasil, 'colocar que as vacinas [atualmente aplicadas] são experimentais é uma grande falácia' disse o imunologista e professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, Eduardo Silveira, à AFP em julho de 2021.
'O Agnaldo Timóteo não tava vacinado? Morreu do quê? Tarcísio Meira tava vacinado? Morreu do que?': Enganoso
Embora seja verdade que indivíduos vacinados possam vir a óbito por conta da covid-19, especialistas e estudos já mostraram que os vacinados têm muito menos probabilidade de morrerem. A possibilidade de desenvolver um quadro grave também pode ser influenciada por fatores como idade e imunossupressão. Saiba mais nesta verificação da AFP.
"Agora respeitem quem não quer tomar a vacina. Se você tá vacinado, você não vai ser contaminado': Falso
Além de nenhuma vacina ser 100% eficaz para evitar a contaminação, a vacinação é uma estratégia de proteção coletiva, e não somente individual. Isso significa que a recusa à vacinação por parte de grupos de indivíduos pode levar a surtos da doença e é uma ameaça ao controle epidemiológico.
'Pode ser que uma vacina não funcione tão bem em ti. Mas o fato é que, se todo mundo ao seu redor estiver vacinado, (...) a chance do patógeno circular ao seu redor é menor', explicou Cristina Bonorino, professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), à AFP em setembro de 2020.
"Eu sempre falei que não podíamos fechar escolas. [...] Porque a criança, ela é assintomática, você não vê criança internada por covid": Falso
Embora os riscos da covid-19 sejam menores em crianças do que adultos, especialistas e organizações de saúde reforçam que a doença representa, sim, um perigo a esse grupo. Dados analisados pela Fiocruz revelaram que 1.439 crianças de até 5 anos morreram pela covid-19 em 2020 e 2021 no Brasil.
Um painel interativo da Unicef com dados de 102 países, consultado pela AFP em 9 de agosto de 2022, estima que 4.876 crianças de 0 a 4 anos de idade morreram devido à doença.
"Tem um estudo israelense que a Pfizer tem proteção de 4 semanas": Enganoso
Uma busca por palavras-chave em português e em inglês não localizou um estudo feito em Israel com a conclusão citada.
No entanto, a pesquisa trouxe como resultados notícias a respeito de um estudo israelense que concluiu que a proteção da vacina Pfizer contra infecção da variante ômicron cai após 4 semanas. A pesquisa, porém, destaca que a proteção contra casos graves não diminuiu após esse período.
'Falar sobre 'proteção' sem especificar sobre qual parâmetro pode trazer confusões. (...) A proteção contra a doença permanece por muitos meses após o recebimento da dose, por exemplo, enquanto que a proteção contra a infecção reduz de forma mais significativa', disse à AFP a biomédica Mellanie Fontes-Dutra, em 9 de agosto de 2022.
'Quem se contaminou está melhor imunizado do que quem tomou a vacina. Por que o que é a vacina? É um vírus inativo': Enganoso
'Infelizmente, isso não é uma realidade para todos os casos. Recuperados não-vacinados podem não ter uma proteção abrangente para as sub-linhagens da omicron, diferente do que se observa em recuperados que foram vacinados, que têm uma proteção mais abrangente para as variantes', explicou Fontes-Dutra, citando esta pesquisa.
A OMS destaca também que as vacinas protegem contra a doença sem oferecer os riscos de uma infecção.
Esta verificação foi realizada com base em informações científicas e oficiais sobre o novo coronavírus disponíveis na data desta publicação.